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Bruno Pereira e Dom Phillips: a mensagem que fica

18.06.22 12:47

Com imenso pesar, todos acompanhamos no decorrer da última semana a confirmação das mortes do indigenista Bruno Araújo Pereira e do jornalista e correspondente britânico Dom Phillips, no Vale do Javari, no Amazonas.

O caso está sob investigação e os corpos ainda estão sendo periciados, mas os indícios de que foram assassinados em razão de fiscalizações e denúncias contra garimpeiros, madeireiros, pescadores ilegais e narcotraficantes nas terras indígenas da região amazônica são muitos. E a crueldade e brutalidade empregadas contra os dois foram tamanhas, que é necessário entendermos o que sofreram seus corpos como um atentado contra o direito a denunciar, a se expressar, um atentado contra a essência do jornalismo.

Respeitada a dor de familiares e amigos, vivenciada a indignação da sociedade e a comoção internacional em torno dos fatos, é preciso captarmos a mensagem que os assassinos deixaram: defender uma causa e exercer o jornalismo no Brasil são atividades muito frágeis. E a mensagem que as vítimas deixam: enfrentar a fragilidade é um exercício de resistência.

A fragilidade da atividade jornalística no país é incontestável: agentes públicos atacam veículos e profissionais de imprensa, a legislação cada vez mais criminaliza a atividade, o judiciário persegue sistematicamente aqueles que fiscalizam os poderes da República. A Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) aponta que os ataques a jornalistas cresceram no país mais de 200% nos últimos anos. No índice global de Liberdade de Imprensa de entidades como a RSF (Repórteres sem Fronteiras), o Brasil se encontra ao lado de países sob regimes ditatoriais e em guerra.

Há quem alegue ser o jornalismo criticado e perseguido pela sua má qualidade e por ter se corrompido. Ainda que fosse verdade, não explicaria os índices. O jornalismo de má qualidade não merece crítica, mas ser ignorado. O jornalismo corrompido não incomoda poderosos, mas os agrada.

O jornalismo não está sendo ignorado, está sendo atacado; e seus profissionais estão sendo censurados, presos e mortos. E isso em razão de incomodarem, fiscalizarem e serem lidos. É muito triste – mas verdadeiro – que mortes como estas sirvam para demonstrar que na fragilidade encontramos foco de luta e de resistência.

E os que discursam contra a credibilidade da imprensa, estimulando que você, leitor, assista à morte de jornalistas como quem assiste à morte de pernilongos inconvenientes, são justamente os poderosos que a imprensa fiscaliza, os que a atacam, os que sequer possuem credibilidade para ser questionada.

 

André Marsiglia é advogado. Escreve sobre Direito e Poder

andremarsiglia.com.br

@marsiglia_andre

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  1. André, me permito adicionar um comentário de leiga: a pobreza visível do lugar me chamou a atenção! E me faz pensar que, sem abordar essa questão, ambientalistas e os poucos jornalistas honestos e heróis não vão conseguir vencer a barbárie na defesa da Amazônia.

  2. Muito triste tudo isso, mas tenho que concordar com vários comentários anteriores, até parece que eles queriam se suicidar ou estavam muito mal informados sobre o perigo que havia naquela região. E em relação à jornalistas, muitos precisam fazer uma reflexão e verem se estão fazendo jornalismo, ou se são apenas cabos eleitorais de políticos. E aqui estou falando de políticos, independente da ideologia.

  3. A mensagem que fica é que não entre numa selva sem treinamento e sem autorização. Ainda mais onde existe a bandidagem à solta Só sei que a culpa com certeza não é do presidente.

  4. Essa perseguição sistemática do judiciário aos que investigam os poderes, citado no artigo, mostra o quanto o país é atrasado. Muitos juízes não toleram críticas e adoram entrar com pedidos de danos morais sabendo que um colega seu vai julgar. Atrasam processos por anos a fio, deixando muitos crimes prescrevem, mas dão prazos de 24 h ou 5 dias quando fazem demandas aos outros poderes. Fazem censura a jornais ou TVs, quando cidadãos desonestos como Flávio Bolsonaro, fazem este tipo de demanda.

  5. Se 2 pessoas se embrenharam na selva para investigar maus tratos a índios, garimpo ilegal, extração de madeira ilegal e narcotráfico sem treinamento militar, desarmados e sem apoio do estado só posso crer em suicídio. Ou só idiotice, mesmo lamentando a morte deles. Faz lembrar o padre que voou amarrado em balões sem bússola e gps

  6. Não sei se dá pra usar esse termo, mas parabéns, André! Parabéns pelo discernimento, pela clareza e pela humanidade no trato de um assunto tão sensível.

  7. A imprensa 'canhota', inclusive este folheto, já colococaram na conta do PR Bolsonaro a morte de Dom e Bruno. Acho que semana que vem ELE também será responsabilizado pelas morte do Chico Mendes, da Dorothy Stang e Tim Lopes, já que os presidentes da época passaram longe de ser responsabilizados. __ Pra mim, vai ser no 1ºturno, understand?

    1. O Presidente, em quem votei contra o Luloptismo- infelizmente- (votarei contra os 2 ou não votarei) travestiu-se de malvado (ou esconderam que era) a partir a partir do momento em que combateu os doentes com covid19 (isso mesmo!), Tal qual seu "herói" Tramp passou a ser levado ladeira abaixo estimulados por fanatismo adúltero que traiu esta Nação. Pode até ser reeleito, neste país tudo é possível (hoje, na enganação, ele não é presidente?) Mas e daí? A história o registra o pior do país.

  8. Parabéns pelo seu artigo, conseguiu em poucas palavras expressar o sentimento da perda de civilidade que nos atinge com frequência cada vez maior.

  9. Parabéns pelo excelente artigo, André! Espero que o trabalho de qualidade de vocês mantenha o jornalismo investigativo em continuidade. Muito obrigada pela persistência!

  10. A MENSAGEM QUE FICA É QUE NO BRASIL O CRIME COMPENSA. VÃO PASSAR DOIS ANOS NA CADEIA E DEPOIS SERÃO SOLTOS. EXEMPLO: O LULA.

  11. Triste realidade. Nada nesse país vale a pena. Duas vidas descartadas como se nada fossem, em terra de ninguém, onde o estado inexiste, os agentes do executivo culpam as vítimas e o judiciário se mete sem ter razão nem ofício. O choque na sociedade, atônita e anestesiada com tanto absurdo, passará como outro qualquer, as famílias ficarão sem seus queridos e nada vai mudar.

  12. Vai piorar com a chegada de Lula, defensor ferrenho da regulação da imprensa. Nem Lula nem Bolsonaro

    1. Dá licença, prezada Eloisa? O PT vai, sim acabar de piorar se o povo brasileiro cometer esse desatino (na verdade os partidos não deixam quem presta se candidatar, né? e o povo está acostumado com tranqueiras). O que o luloptismo não piorou neste país? É o autor do Bolsonaro- pois não é??- que me conduziu a um dos maiores erros de minha vida: votar nesta encrenca ambulante de hoje. No luloptismo jamais votarei (conheço esses picaretas desde a origem).

  13. Muito triste constatar esse retrocesso. O jornalismo investigativo é parte integrante de qualquer democracia. Aqui no Rio, depois da morte do Tim, constatamos ao longo dos anos, o crescimento do crime organizado, inclusive na política.

  14. Na verdade, caro e inteligente Marsiglia o jornalismo deste país é frágil, perseguido e criticado por nós povo por não se dar o respeito. Com raríssimas excessões de vocês, antagonistas (espero que continuem sendo e contaminem algum). A voz do dono que esta’ ajojado com o dono do poder (qualquer que seja este). Centrão puro sangue, também.

  15. espero que esse lamentável assassinato não saia da Primeira Página dos jornais !! Não vamos deixar !!Justiça !!e sim acredito que tenham mandantes !!Investiguem por favor !

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