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‘Não temos como punir Daniel Ortega com o voto’, diz padre da Nicarágua

17.10.22 13:26

Desde janeiro deste ano, a ditadura de Daniel Ortega (foto), na Nicarágua, prendeu nove padres. Para entender a realidade dos religiosos que vivem nesse país, Crusoé conversou com um sacerdote por telefone. Com medo de se tornar o décimo na prisão, ele pediu para que seu nome e o de sua paróquia não fossem divulgados. Segue a conversa.

 

Lula disse em um debate na televisão neste domingo, 16, que “se o Daniel Ortega está errando, que o povo da Nicarágua puna o Daniel Ortega“. Isso pode acontecer?
Não temos como punir Daniel Ortega com o voto. As eleições estão totalmente controladas. Tudo foi alterado para que ele ganhe sempre. Não acho que o povo poderá tirá-lo do poder. Em 2018, o povo nicaraguense fez o que lhe cabia, ao realizar protestos massivos. Mas a ditadura reprimiu as manifestações com violência, com tiros, com mortes. Por isso, precisamos da ajuda de outros países da América Latina, inclusive do Brasil. A democracia só vai voltar para a Nicarágua se a comunidade internacional assumir uma posição mais enérgica.

O sr. sofreu pessoalmente com a repressão da ditadura?
Todos sentimos a repressão na pele. Quando tem início uma operação policial, pessoas são presas, templos e casas são saqueados. Muitos já tiveram seus telefones celulares confiscados, para depois serem usados como evidências de crimes. Na minha igreja, sofremos constantemente com o assédio da polícia. Se eles descobrem que um fiel é contra o governo, ele pode ser preso ou morto. Se o fiel está a favor de Ortega, então eles o obrigam a denunciar amigos e parentes. Querem que todos contribuam na vigilância. Diariamente, os policiais patrulham as ruas da igreja e dos arredores perguntando o que as pessoas fizeram ao longo do dia, onde estiveram, com quem se reuniram. 

Como esse assédio afetou a população?
Nós distribuímos alimentos e remédios que recebemos do exterior para os mais pobres e necessitados. Os oficiais de Ortega então começaram a perguntar por que estávamos ajudando pessoas que eram contra o governo. Nós respondemos que não conhecíamos a posição política delas. Não fazemos essa distinção. Mas eles fizeram questão de identificar esses indivíduos, que eles consideram seus inimigos. Depois, nos pediram para que não entregássemos mais comidas e medicamentos para os que eles consideravam ser de oposição. É assim que a ditadura pretende impor sua ideologia aos nicaraguenses. 

E os opositores ficaram sem receber ajuda?
Nossos contatos com o exterior diminuíram bastante, e infelizmente não temos mais recebido alimentos e medicamentos para distribuir na comunidade. 

Essa pressão governamental está mudando a cabeça das pessoas?
O povo é inteligente e não vai mudar de opinião. As pessoas só não falam nada porque estão atemorizadas. Elas temem a prisão. Está todo mundo quieto. Nas redes sociais, evita-se ao máximo publicar qualquer mensagem contra o governo, porque isso pode ser considerado crime cibernético. Há muita autocensura. Só quem está fora do país pode se manifestar livremente. Mas ninguém na Nicarágua está conformado. As pessoas estão só esperando um momento de abertura para voltar a clamar por liberdade.

A repressão contra os religiosos vai piorar?
Sim. O governo prometeu se vingar de todos os que o desafiaram. Há uma revanche em curso. E muitos sacerdotes realizaram discursos políticos pedindo liberdade e respeito à vida. Então acho que muitos outros padres poderão ser presos no futuro.

O papa Francisco não criticou os ataques aos padres. Como o sr. vê o descaso do Vaticano?
Todo líder deve proteger as pessoas que estão sob sua direção. Acho que o papa Francisco não está à altura dos acontecimentos. O sentimento generalizado aqui dentro da Nicarágua é que o pontífice deu as costas para o seu rebanho. É claro que é importante orar. As preces podem ajudar. Mas o papa poderia fazer mais, porque tem poder. Ele poderia ter maior influência para que as coisas fossem diferentes, mas preferiu não fazer nada. 

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  1. No debate da Globo o Bolsonaro deveria usar essa entrevista. Na hora que o Lula falar que o povo de lá pode retirar o ditador no voto, ele cita um trecho dessa entrevista.

  2. É só trocar Noriega por Maduro e Nicaragua por Venezuela e pronto: os dois usam a mesma fórmula patentada na Cuba para, em nome de uma suposta revolução, instaurar ditaduras feroces. Enquanto isso acontece e os nossos povos são mortos ou vão à prisão só por pensar diferente, no Brasil a esquerda olha para outro lado, canta musiquinhas e faz o L em sinal de cega adoração. Que medo.

  3. Muita covardia do Lula e do papa. Que mundo é esse, em que poderosos se dizem tão bonzinhos e não são capazes de CRITICAR gente tão má?

  4. Espero que o povo encontre uma maneira de "desfazer" de Ortega e seu grupo mais fanático. Não acho que o Papa possa fazer muita coisa. Quem precisa agir são as autoridades políticas e econômicas dos países ricos e democratas.

  5. E dizer que o sapo fica de quatro para esses ditadores assassinos. Ontem no debate ele ainda defendeu o seu coleguinha Ortega, perseguidor da igreja católica.

    1. Paulo palhaço, a ditadura brasileira foi tão avassaladora que aquela mesma turminha de adoradores do Stalin, estão todos aí ao melhor estilo ratazanas lustrosas: Sapo, dilmANTA, Sonia Lafoz, FHC, José Serra, Aloísio Nunes (motora do Marighella), José Genoíno, Mirian Leitão, Fernando Gabeira, Chico Buarque, Caetano, Gil, Bethânia, Franklin Martins, Carlos Minc, e mais umas trocentas vítimas da ditadura que aí, vivem desfrutando dos seus gordos contra-cheques, nenhum inferior a 30 contos mensais.

    2. Osny, Lula não defendeu o Ortega. Mas Bolsonaro defende a ditadura que houve no Brasil. Quantos brasileiros foram perseguidos e mortos na ditadura? A onda tribal bolsonarista vai acabar com a Igreja Católica. Na verdade, ela tende a por fim no cristianismo no Brasil. Ver a horda bolsonarista invadir a basílica de Aparecida, desrespeitar líderes eclesiástico, tem que ser encarado por todos os cristãos, como um despertar desse processo.

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