José Serra: um ex-ministro da Saúde de quem se pode pronunciar o nome

O eleitor preferiu o ministro do vírus ao ministro da Saúde

09.10.22 10:34

O general que foi ministro da Saúde no auge da pandemia ganhou um gabinete na Congresso. Trata-se do sujeito que chegou ao ministério com fama de especialista em logística mas esqueceu milhões de testes para covid em depósitos até expirarem. Mais grave, deixou faltar oxigênio no Amazonas. Também promoveu remédios ineficientes e negligenciou a busca de vacinas (“para que essa ansiedade, essa angústia?”, perguntou candidamente aos que lhe cobravam celeridade na imunização dos brasileiros). Sob sua guarda, o ministério envolveu-se no esquisito escândalo em torno do superfaturamento de uma vacina indiana.

Quando esse homem deixou o ministério, as mortes por covid no país – que hoje somam 680 mil – estavam em torno de 280 mil. Seu nome ficou associado, de forma inapelável, a essa cifra sinistra. Agora, surgiram números mais auspiciosos em sua carreira: 205 mil eleitores fluminenses o escolheram como representante na Câmara. Foi o segundo deputado federal mais votado do Rio de Janeiro.

Não declinei o tal nome que está associado a montanhas de cadáveres e de votos. Ocorre comigo um misterioso problema mnemônico: embora já tenha escrito vários textos sobre o general-ministro (meu preferido é aquele em que o comparei a dois personagens milicos de Os Sertões), sempre tive dificuldade em fixar seu nome. A cada novo artigo sobre o então ministro, eu me via constrangido a recorrer ao Google para conferir se há letras dobradas no seu sobrenome. Mais estranho ainda, não consigo guardar seu prenome.

Minha memória deve ter suas razões para travar. O que é desprezível não merece ser lembrado. E é por isso que decidi não registrar o nome dos futuro deputado neste artigo. Com sorte, ele afundará na indistinção do baixo clero, e eu nunca mais precisarei verificar se seu sobrenome tem um ou dois Ls.

Como regra, não estendo o desprezo que cultivo por políticos a seus eleitores. Na hora de apertar o botão verde da urna eletrônica, cada cidadão é movido por uma complicada rede de convicções individuais, razões circunstanciais e necessidades materiais, e não se deve julgar essas escolhas de forma apressada. Tampouco dou crédito a generalizações selvagens sobre as escolhas políticas de cada cidade, estado ou região. Ao contrário do que dizem petistas inconformados com o resultado do primeiro turno, nem o Sul é irremediavelmente fascista, nem o Nordeste é irredutivelmente progressista.

No entanto, eu me permito descartar essas cautelas quando considero os 205 mil eleitores do ex-ministro. Pois não consigo discernir motivações decentes para esse voto. Aliás, nem as motivações indecentes se sustentam. O general sabotou até o fetiche militarista do atual governo, ao se humilhar publicamente diante de um capitão com a frase pela qual será sempre lembrado: “uns mandam, outros obedecem”.

Nem o mais extremo glaucoma ideológico deixaria de ver a incompetência e a desídia que marcaram a gestão do general na Saúde. Só posso concluir que esse foi um voto radicalmente negacionista: negou a ciência, o respeito à vida humana, a empatia pelos que perderam pessoas queridas na pandemia.

***

As urnas descartaram um ex-ministro da Saúde incomparavelmente mais qualificado. “Pronto, lá vem ele falar do Mandetta”, dirá algum leitor bolsoafetivo, sempre obcecado com os “traidores” da causa (o bolsonarismo revelou-se implacável com os dissidentes: Luiz Henrique Mandetta, Joice Hasselmann, Alexandre Frota, Abraham Weintraub – nenhum deles se elegeu).

Não, não me importo com Mandetta. Estou falando de José Serra, cujo mandato de senador por São Paulo se encerra no fim do ano. Pleiteando uma vaga na Câmara, o tucano de 80 anos alcançou pouco menos de 89 mil votos e ficou de fora. Em 2014, foi conduzido ao senado por 11 milhões de eleitores.

Eu não sei se a qualidade média do Congresso – que, convenhamos, nunca foi essas coisas – baixou tanto quanto se diz, mas esse paralelo é expressivo: o ex-ministro em cuja gestão se efetivaram programas importantes (medicamentos genéricos, tratamento gratuito para Aids pelo SUS) foi rejeitado pelo eleitor paulista; o ex-ministro que nos ofereceu cloroquina e “tratamento precoce” é um campeão de votos no Rio de Janeiro.

Serra não cai sozinho. Sua derrota é parte do triste ocaso do PSDB, partido que deixou de ser protagonista da política nacional para se tornar linha de apoio de candidatos medíocres. O próprio Serra declarou voto em Lula para presidente e no bolsonarista Tarcísio de Freitas para o governo de São Paulo – e isso em um único tuíte! Saiu-se melhor no que deve ter sido o último ato memorável de seu mandato, se não de sua carreira política. Serra foi o único senador a votar contra a PEC que liberou o governo para conceder novos benefícios sociais neste ano de eleições.

Armado com a PEC, o governo agora prepara-se para turbinar suas medidas eleitoreiras, antecipando parcelas do Auxílio Brasil para antes do segundo turno. A julgar pela consagração do ex-ministro nas urnas, a catástrofe que foi a gestão da pandemia está esquecida. Jair Bolsonaro agora tem pressa em produzir boas razões para ter seu nome lembrado.

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  1. A opinião sobre a ciência, falada em versos e prosas em tempos pandêmicos, lembra o dito que "de médico e louco todos temos um pouco". Sugiro veementemente que o articulista pesquise à moda antiga, sem intermediários, os fatos sobre a falta de O2 em Manaus. Estou seguro que mudará sua opinião sobre os responsáveis. Quanto ao reposicionamento de drogas para o necessário enfrentamento aos sintomas do covid19, faço a mesma sugestão. Também se surpreenderá o quão cruel consegue ser a bigfarma.

    1. Depois de 2 anos e meio de pandemia, quase 700mil mortos por COVID-19 ainda há pessoas defendendo o indefensável!!! A alienação é tamanha que, além de raiva, dá pena. O trágico ocorrido em Manaus tem nome e sobrenome: Jair Messias Pazuello! O ministério da saúde acéfalo! Na boa: o Brasil está doente e não tem salvação !

  2. Jerônimo Teixeira. Coloquei teu nome para não esquecer. Todo teu texto parte de uma narrativa que os eleitores é que estão errados. Não. Os eleitores não aceitam corruptos como o Lula e como tu és engajado usa toda uma narrativa mentirosa. Decides o que é científico e o que não é, inventas corrupção mas aquela provada e condenada em 4 tribunais ( primeira, segunda e terceira instância) fechas os olhos. Espere e verás que os leitores fecharão os olhos pra ti. És muito ruim e engajado

  3. Quando o "povo" não vota como os "espertos" como você acham que tem que votar vem esse MiMiMi todo. Votei no PSDB minha vida inteira para ver esses FDP apoiando um Ladrão para presidente.

  4. A história é escrita todos os dias e tanto o Serra como o PSDB se perderam ao longo do caminho e destruíram o seu passado renegando-o e se aliando a antigos adversários criminosos, quem destruiu seu legado foram eles mesmos e por nada.

  5. Que podre! O pior virus que enfrentamos é o que ataca os jornalistas e que os fazem esquecer do compromisso de divulgar a noticia sem parcialidade. Acho merecido o ostracismo, que o voto dos paulistas, colocaram este politico em que sua vaidade pessoal destoava do seu real interesse em promover o desenvolvimento do nosso país.

  6. O General foi o pior Ministro da Saúde da história. Só não enxerga isso quem está robotizado e só cumpre ordens do seu mito. É o espírito tipico dos nazistas que foi muito usado como desculpa em Nuremberg.

  7. Pazzuelo ignorou os avisos da White Martins de que haveria falta de oxigênio. Por causa da imbecilidade deste milico, outros estados e até a Venezuela enviaram cilindros de oxigênio, porém em quantidade insuficiente.Será que este cretino, subserviente às loucuras de Bostanaro, seria eleito por Amazonas?

  8. Caro Colunista, você citou culpa do Pazuello no caso do oxigênio de Manaus. Em entrevista, o General explicou a ocorrência e desafiou a imprensa a provar o contrário. Vai lá e prove. A culpa foi omissão, ou má fé, da cúpula corrupta federal e municipal de Manaus. Só isso.

    1. Gente: como é possível a esta altura do campeonato defender esse sujeito despreparado para um momento tão critico como o da pandemia de COVID-19? O quê acontece com o brasileiro? Crise aguda de amnesia? José Serra teve uma atuação brilhante no Min da Saúde, ponto pacífico! Competência anos-luz à frente do general especialista em logística, mas os brasileiros estão preferindo eleger imbecis, incultos e despreparados! Legado do inominável imbrochavel! 😡🤮😡🤢

  9. Governador do Amazonas vira réu no STJ por fraude na compra de respiradores. Superfaturados de 17 para 100 mil a unidade e, não serviam para pacientes de Covid.

  10. A esposa de Aziz, a deputada Nejmi Aziz (PSD), e os irmãos do senador já foram presos, em 2019, por acusação de desvio de verbas públicas da saúde na maior operação da história da Polícia Federal (PF) no estado amazonense. Organizações da sociedade civil avaliam que ter o senador Aziz na presidência da CPI é, no mínimo, amoral.

  11. Sobre a sua comparação entre os ministros Pazuelo e Serra, você compara contextos diferentes, um numa pandemia, lidando com a pior cepa do vírus- a gama (P1), de transmissão e virulência altas, com o trabalho do outro em situação de normalidade.

  12. Mandetta estabeleceu como regra na sua gestão que os que adoecessem pelo COVID19 ficassem em casa e procurassem o Serviço de Saúde somente quando piorassem. Muita gente morreu, sem sequer receber a indicação de uso de um simples corticoide . Inaceitável.

  13. O Jerônimo vai ter que engolir o General Pazuello, eleito democraticamente pelo povo carioca. É que ele está com dor de corno, queria porque queria que o José Serra, vulgo "Vizinho" na planilha da Odebrecht fosse eleito., ... kkkk!., ... Sifú!

    1. Não tem graça alguma assistir imbecis sendo eleitos por alienados que acham que estão fazendo "o certo " e não enxergam o tamanho do estrago que estão fazendo ao futuro do país!! Defender Pazuello eleito é o atestado da alienação e despreparo no entendimento do momento histórico crítico que o Brasil vive.

  14. Que texto esplêndido!!!! 👏👏👏👏👏Majoritariamente, salvo honradíssimas exceções, os eleitores do Rio sempre trataram as eleições com molecagem patológica. Elevam às funções mais sérias os palhaços mais criminosos possíveis, o que acaba sendo especial e fielmente representativo. Em tempo: é incompreensível esse adjetivo """progressistas""" para a petralhada ladralha!!!! Desde quando ROUBAR DESCARADA E COMPULSIVAMENTE, MANDAR ASSASSINAR, TRIPUDIAR E MENTIR, significa """PROGRESSO"""????????????

  15. O nome dele é PAZUELO e eleito com tão expressiva votação é a síntese do espírito galhofeiro e descompromissado de grande parte do eleitorado do RJ, ao fazer suas escolhas nas urnas… são tantas bolas fora…

  16. 1/2 Sobre esquerda, direita e a hipocrisia que gera votos. A esquerda segue a moralidade de Jesus. A direita é adepta da moralidade de Nietzsche. Todos os eleitos da direita que usaram o nome de Jesus, são hipócritas. Eles se curvaram ao capitão, outro hipócrita, que desencadeou um darwinismo social na pandemia com sua visão nietzscheriana: "o mais forte sobrevive, o mais fraco morre."

    1. 2/2 Já a esquerda segue Jesus: "bondade para com os fracos". Lula implementou no Brasil, os mais exitosos programas sociais. Lula é um homem bom. Lula não usa o nome de Jesus com hipocrisia. Em nome de... obviamente, sendo um cristão sensato, não uso o nome de Deus em vão. Eu apenas voto Lula 13. Isso é política. Política é humana, imperfeita. DEUS É PERFEITO.

  17. Fala sério! Deixa de nhen nhen nehn! Não se trata de escolha entre o da vacina e o da saúde! Trata-se de sepultar os grãos mestres da política maldita. De colocar no ralo aqueles que sempre foram os metidos a saber tudo e roubar, de deixar o interesse pelo poder puro e egoista para suplantar as mesmices que só foram negociadas entre o pt esquerdopata e o psdb falsamente de centro mas que sempre foi de esquerda! Nunca tivemos político realmente interessado nas questões sociais, ao contrário.

    1. E o vassalo da Capetão é diferente? Quanta abobrinha esquizofrênica!...

  18. Sem entrar no demérito do eleito, o PSDB está colhendo o que plantou. A verdade tende a se impor, cedo ou tarde. Penso que, quando eleitos, torna-se uma obrigação o bem que fazem ao país. O mal, deve ter resposta severa das Instituições que representam a sociedade. Independentemente do ministro da Saúde que foi, seu fim de carreira está sendo patético, como o é o do PSDB: mais uma decepção. As escolhas que fazemos têm consequências.

  19. Tem sujeito que escreve e nem se preocupa em "esconder" sua revolta pessoal ", esquecendo -se do óbvio: serra não foi eleito e sabe a razão. É só consultar as páginas policiais!!! Aliás, se raciocinar um pouco mais adiante, verá que seu dinheiro tbm consta/va em uma certa conta em outro país. Burro quem não "enxerga".

    1. Não tenho político de estimação! Dito isso, se as páginas policiais, com suas excelentes e inestimáveis reportagens fossem notas de corte para a eleição, 80% dos políticos não deveriam ser eleitos, quiçá, estarem aptos a participarem da eleição, considerando a lei da ficha limpa. A verdade é que o brasileiro tem memória seletiva, e pelo jeito, curtíssima, afinal ter dinheiro roubado lá fora ou ter dinheiro roubado disfarçado aqui dentro não conta muito na hora de votar..

  20. Calma lá, calma lá... Serra não foi eleito porque simplesmente não fez campanha (nem sequer apareceu no horário eleitoral "gratuito"), deu a impressão de abandono do mandato, está em condições muito ruins de saúde (não quis largar o osso nem dobrando o Cabo da Boa Esperança) e, principalmente, levou o carimbo de inequívoco corrupto quando se descobriram os seus R$ 40 milhões na Suíça.

    1. Tudo bem xará, você não deixa de chancelar verdades. O poder é tão inebriante que esses caras esquecem de morrer. Uma injustiça o tal deus não chamar esses caras. Vide Sarnei e cia (incluo o luloptista, sim). O artigo, que elogio pela análise comparativa, não tocou no quesito corrupção ao meu ver. Até porque parece que o nosso povo é fissurado numa corrupção eleitoral. Um foi competente no amparo aa saude, aa vida, o outro foi isso que nós vimos. Lixo des humano. Como muitos eleitos e a eleger.

  21. Realmente é uma notícia terrivelmente marcante de injustiça e de falta de vergonha transmitida pelo tal eleitorado brasileiro. Explica-se a desesperança do segundo turno para o qual os donos deste pais trabalharam e impuseram para ser isso daí. Acompanhando,teremos a continuidade da injustiça no judiciário e da construção de leis sempre desiguais, favoráveis aos poderosos. Artigo muito bem posto e justo para com o melhor Ministro da Saude que tivemos e pelo depósito desta derrota nacional para

  22. Eduardo Pazzuelo foi contemplado pela praxe dos bolsonaristas: votar quem é pró Bolsonaro, independentemente do que tenham feito. Como critério, os de maior exposição. Veja-se que até o inelegível Daniel Silveira recebeu 1,5 milhão de votos para o senado. Evidentemente rejeitaram os considerados traidores de seu ídolo. Há de se considerar também as características de RJ.Reafirmaram no cargo um governador ladrão. E não é livre o eleitor das áreas controladas pela milícia e/ou traficantes.

  23. Esperar que o eleitor saiba quem é Serra, quantos Senadores e Deputados compõem o Congresso, qual é o tempo de um mandato, é muito otimismo ....Nosso país é a cara de nosso eleitor...passa o pano para um ex-presidiário, comprovadamente corrupto, ignora um incompetente, que debochou de uma epidemia e das vacinas. Somos um povinho! Nós criamos esses bandidos..

  24. De todos os lados há eleitores idiotas que negam os fatos e se prendem às narrativas mentirosas. Doutro modo não teríamos esse tenebroso segundo turno. O General do Virus é mais um nessa longa lista de absurdos.

  25. A Crusoé está perdendo sua essência da imparcialidade com a saída de Diogo Mainard e Mário Sabino, só me resta uma alternativa depois de 4 anos como assinante, não renovar, chega de esquerdopatas fantasiados de jornalistas.

  26. Monstros não merecem serem lembrados pelos seus nomes, mas sim pelos seus atos sinistros. Infelizmente, mesmo com o advento da Lava Jato, continuamos vendo a nossa classe política ficando cada vez mais rasteira, currupta e desumana. É a lavagem cerebral bozolulista transformando a nação em zumbis ideológicos sadomasoquistas.

  27. Penso q as pessoas ouviram tanto certos nomes, embora não tenham prestado atenção no q se noticiava sobre elas, q escolheram um nome pela "familiaridade"... É difícil explicar o resultado desastroso dessa última eleição... Compra de votos... Não tem resposta "boa" pro desastre q aconteceu! Qto ao Serra, ele sumiu! Cuidou da sua defesa, da sua saúde (certíssimo), mas não "cuidou" do seu mandato...

  28. articulista medíocre. deixe de balela e fale o nome do deputado eleito com grande margem de votos. Respeite a vontade soberana dos eleitores. essa revistinha mais uma vez demonstra sua parcialidade em favor do ex presidente. O que é inconcebível.

  29. Corrija o seu glaucoma ideológico: da próxima vez pesquise o nome do ministro e deixe o seu texto completo. É o mínimo da função de um jornalista.

    1. Jornalista, a menos que esteja enganada o senhor Gerônimo como jornalista deveria e não o fez ater-se ao fato . Quem comenta e opina aqui neste espaço somos nós .

    2. Crusoé se tornou dispensável ao deixar de lado a imparcialidade. Um assinante a menos.

    3. Será que vocês não tem respeito pelos votos dos outros só vocês que sabem das coisas, vergonha

    4. Estou encerrando minha assinatura por conta dessa parcialidade 🤬

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