Foto: DivulgaçãoO humorista Léo Lins: proíbe o humorista de manter, transmitir, publicar, divulgar, distribuir ou encaminhar suas piadas em qualquer plataforma

O humor não tem limite por uma razão muito simples

09.07.22 15:30

A polêmica da semana ficou por conta do humorista Leo Lins (foto) ter feito uma piada extremamente cruel envolvendo crianças com hidrocefalia e, ao que consta, por esta razão ter sido demitido. Como é comum em situações assim, surge a pergunta: qual o limite do humor?

Advogados e juízes costumam responder que o limite é quando se torna um crime e debatem se a ofensa contida na fala de um humorista e se a lesão à honra do ofendido são suficientes para a configuração de um tipo penal. Como a avaliação depende de interpretação, ninguém chega a consenso algum e, na próxima polêmica, a pergunta hamletiana retorna: qual o limite do humor? Eis a questão.

Não concordo com essa abordagem. Para mim, e para Aristófanes – o que me coloca em muito boa companhia – o humor é, sem sombra de dúvida, uma arte. Aliás, das mais sérias, pois dotada necessariamente de elementos críticos. Mesmo o humor mais tosco sempre teve na história uma dupla função: servir como instrumento de crítica social, como nos ensina o provérbio latino ridendo castigat mores, e aliviar a tragédia com o riso.

Se o leitor admitir nossa premissa – minha e de Aristófanes – de que o humor é arte, a pergunta correta deverá ser: qual o limite da arte? E, nesse caso, o Direito não poderá dar sua resposta padrão – “quando for crime” –, afinal, um ator que faz no teatro o papel de um pedófilo não comete o crime de pedofilia, um assassino num livro não comete assassinato, o personagem de uma piada, seu autor e intérprete não são capazes de cometer crimes.

O humor sendo arte, a piada é ficção. Desde que no humorista se manifeste a intenção artística – o animus jocandi, não há crime contra a honra possível de lhe ser imputado, não há dolo. O limite à arte pode ser dado pela plateia, pelo repúdio social, pela demissão do artista, pela eventual perda de patrocínios de marcas que não se queiram ver alinhadas com esse discurso, mas não pelo Direito.

E isso porque mesmo o humor cruel e preconceituoso de Leo Lins, capaz de causar mais repulsa do que risos, possui intenção artística, questiona criticamente os valores morais de uma sociedade que, com acerto, caminha em direção do estabelecimento de uma visão de mundo mais inclusiva e igualitária. O que Leo Lins faz na maior parte de seus textos é debochar disso, ridicularizar quem pensa assim. Gostemos ou não, é humor, é arte.

E arte, repito, não pode ser limitada pelo Direito, pois o dia em que o Direito for o responsável por dar limite ao humor será porque não mais o aceitamos como arte, ou que a arte é passível de ser criminalizada. Em ambos os casos, será muito ruim.

 

André Marsiglia é advogado. Escreve sobre Direito e Mídias.

andremarsiglia.com.br / @marsiglia_andre

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  1. O humor de qualidade precisa de mais de dois neurônios! Sejamos objetivos: quantos grandes humoristas esse Brasil produziu? Só me ocorrem pouquíssimos nomes: Chico Anisio, José Vasconcellos, Ronald Golias - todos falecidos! Na nova geração ninguém chega aos pés de nenhum desses três! Fazer rir é muito mais difícil do que fazer chorar. Fazer rir com elegância e inteligência é coisa pra gênio!

  2. Não credito em crença, religião, Deuses, mas bem que poderia nascer um filho dele com essa doença, para ele pensar um pouco mais na arte de não machucar outras pessoas.

    1. Kkkkkkkkkkkk ele não pode fazer piada, mas você pode desejar o mal. Celsinha lixo!

  3. Interessante, sujeito carregou na tinta pra tentar justificar o injustificável. O que leva a pensar: Será que faria esse preâmbulo todo se houvesse em sua família alguém com o mesmo tipo de problema?? Ferro dói quando é na própria pele. São modinhas e "teses" como essa que nos colocaram na situação atual, onde prevalece a total falta de respeito entre aqueles que se denominam seres humanos. Tese (se é que dá pra ser chamada assim) no mínimo infeliz.

  4. Eu não concordo com os argumentos do artigo mas o ponto central é que o comediante não cometeu crime algum. As piadas de mau gosto devem ser repudiadas pelo público e consequentemente pelos patrocinadores para não perderem clientes. Do contrário estaremos inaugurando as piores práticas de censura e "programas de reeducação " típicos das ditaduras de esquerda.

  5. Independentemente da tese do artigo, lembro que a "piada" tbm zombou do flagelo da seca sobre os nordestinos. Com muita boa vontade, poderia ser um viés de crítica social. Mas a enorme crueldade alusiva à criança encobre qualquer mérito possível - e mesmo duvido que o 'artista' tenha tido a intenção dessa crítica.

  6. A sociedade ainda não tem consciência de seu poder de veto. Parecemos anestesiados. Não comprar, não consumir e mudar de canal são as formas mais simples e efetivas de acabar com o que nos ofende ou desagrada. Gosto e senso são subjetivos. Patrocinadores sentem o baque e tomam providências por nós. O resto é espuma.

  7. Zombar de portadores de enfermidades SÓ não é crime por falta de lobby, a falta de pressão desse grupo e de seus familiares sobre os p@r@sitas de Bsb para que apresentem e aprovem lei nesse sentido. Mas o humor não pode tudo não… arrisque-se a brincar com termos do tipo n3guinh0 (q se usava como já foram usados cara, velho, bicho…), denegrir (🙄), boiola, a coisa tá preta, etc para ver se sua “arte” não amanhece vendo o sol nascer quadrado…

  8. Zombar de portadores de enfermidade(s) SÓ não é crime porque não há lobby desse grupo - ou de seus representantes - exigindo que os parasitas de Bsb apresentem e aprovem lei nesse sentido… mas humor “não pode tudo não”, não se arrisque a usar palavras como “neguinho” (que era usado como já se usou “cara”, “velho”, “bicho”, etc), “denegrir” (🙄) “a coisa tá preta”, boiola e correlatos porque sua arte verá o sol nascer quadrado…

    1. Desistiu de censurar este comentário, “moderador”? Ou o aviso de que “comentário não adicionado” é proposital a fim de que o “comentarista” pareça um idiota repetindo frases?

  9. Penso que a censura deve ser das pessoas e patrocinadores, quando aceitam que o humor é livre mas a sensibilidade de quem o assiste,deve ser o limite. Quem não gostou que o "cancele".

  10. Tem um trecho do artigo que diz que um ator que faz um papel de pedófilo não comete crime de pedofilia. Isso é claro como a luz solar. Mas foi exatamente essa acusação que sofreu o Fábio Porchat no filme do Danilo Gentili, só porque ... ele é contra o Bolsonaro. Incrível como as coisas se misturam.

  11. Mas ele é PTista, Bolsonarista, ou critica ambos? Só para entender quem é que está recriminando a piada dele, pois é assim que funciona nesse país agora.

  12. Você, advogado (?), está muito bem acompanhado por Aristófanes e Sheakspeare. Dois magistrais angustiados. "O sapiens só cria em angústia". E a angústia só é um pouco menos dolorosa que a dor do parto pela Mulher-Mãe que ao parir, também, pode vir a sentir outras dores com o tamanho desta da criança hidrocéfala deste humor esquizofrênico. O único "remédio" com que posso afagá-la é a da solidariedade.

  13. Reconhecidamente, pelos poucos e brilhantes textos que li de você nos Antagonistas, considero-o muito (e bota admiração nisto!) um artista pelas análises que você constrói. Por cacoete, puramente lógico, o Direito (reconheçamos: raros são seus profissionais dotados da qualidade racional da análise de você). Por isso a resposta pronta: "qdo for crime!". Estou com você. Só um senão: só será crime se o artista colocar a carapuça explicitamente em alguém (personalizando o sarcasmo doloroso).

  14. Discordo totalmente em número, gênero e grau. Há diferença muito clara - no âmbito artístico - entre o humor, a sátira e a ironia com conotação de pura e honesta comédia real e, o DEBOCHE GRATUITO, num ato de mau gosto e covardia sádicos, que apenas ridiculariza o próximo com crueldade, inferiorizando as pessoas inocentes de uma maneira ou de outra por suas características, incorrendo mesmo como injúria contra um grupo social.

    1. TODOS NÓS temos que nos submeter justificadamente às limitações dos espaços físicos, morais, éticos e legais de organização social. Porque não os comediantes???? Há sim, limites para comportamentos injustificáveis, indesejáveis, grotescos, covardes, estúpidos, aleatórios, ilógicos e gratuitos: são no mínimo os do bom senso e da civilidade.

    2. Qual é a graça no deboche - com maldade explícita, injustificada, gratuita - contra outro ser humano inocente em relação ao fato da sua real deficiência? NUM PALCO - PROPONDO SER CÔMICO - NENHUMA. E OFENDE A TODOS NÓS. Isso não é "arte interpretativa", é perversidade pura e simples.

    3. O que o sujeito (sem talento para comédia e sempre ridiculamente sem graça) cometeu, é muito pior do que o que caracteriza o crime de preconceito étnico por exemplo que, caso tivesse sido feito contra uma pessoa ou grupo de uma das etnias, teria sido enquadrado em 'injúria racial' (que aliás  deveria se chamar 'injúria étnica', já que na Espécie Humana não há ""raças"", há apenas 'etnias').

  15. Certíssimo, André. Basta ver os comentários para perceber que brasileiro pensa com o estômago. Uma coisa é se sentir ofendido com uma piada - que diz mais a respeito do ouvinte do que do comediante -, outra coisa é punir criminalmente quem fez a tal piada. Você não achou engraçado e, logo, ofensivo? Ok, direito seu. Mas objetivamente ele não pode ser punido por isso. É como um ringue de boxe: você não chama a polícia por haver duas pessoas se batendo. Fora dele sim, faz todo sentido.

  16. Dr. André Marsiglia Santos, que tem comentado e se posicionado de forma esclarecedora sobre alguns temas momentosos, pisou na bola sobre o assunto e perdeu excelente oportunidade de ficar calado…

  17. Só mesmo a falta de criativifade deste que se diz humorista pra fazer piada de mal gosto de uma pessoa deficiente. A falta de Deus e um vazio enorme neste sujeito pra ter sido tão cruel e ofensivo. Devia ter aprendido com o mestre Chico Anisio como fazer humor sem ser ofensivo. Mereceu a demissão.

    1. Kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk tradução: nunca fez nada em prol do próximo. Nilsinha hipócrita.

    2. Não perco meu tempo em debater com figuras inexpressivas que nem conheço, vai fazer algo de útil seu imbecil e deixe de se meter na vida dos outros.

    3. Nossa, que carola chata e mal-humorada. Em vez de julgá-lo pela piada, que tal olhar os atos dele em prol de pessoas com deficiência? O problema é que vai ser difícil achar, não porque não existam, mas porque ele não os alardeia por aí. E você, o que já fez de concreto?

  18. Qdo surge alguma polêmica como essa, normal/te, não fico me questionando se há limites p/ o humor, fico me perguntando sobre a pessoa q faz uma "piada" como essa, o q faz c q ela ache graça, e pior, q outros tb verão motivo p/ riso! Fico imaginando se vive em alguma bolha rodeado p pessoas "padronizadas", se praticava bullying na escola (não acho q tenha sofrido, do contrário não faria gracejo no q vê, aparente/te, como defeito...). Acho q td o cancela/to é + educativo do q uma medida judicial..

    1. Eu sofri bullying e ri da piada. E agora, carola zangada? Por que você não vai pesquisar tudo o que Léo Lins fez e faz em prol da AACD? O que conta são os atos. E você, o que já fez a favor das crianças com deficiência?

  19. ...e o cara que escreve o artigo é um advogado. Que esperar do RESTO?? Pergunto a esse defensor do "humor artístico": existe uma academia para formação de humoristas? Não. "Arte" dispensa formações acadêmicas. Então, se eu quiser exteriozar minha animosidade, basta dizer que sou humorista e a coisa tá resolvida? Posso tratar, jocosamente, de qualquer tema sem me procupar com os braços da Lei? Diz aí, "doutor", existe outras profissões não acadêmicas, que permitam tais liberalidades? É bom saber.

    1. Jaiminho, pare de evitar a fadiga e vá estudar um pouquinho que seja.

  20. Zombar de uma deficiência física, não tem nada de humor, muito menos de arte. Você e seu mentor Aristófanes, estão errados. A arte, para ser verdadeira, precisa ser realizada de forma consciente, controlada e racional. O humor, diferente de arte, é um gracejo, uma expressão irônica da realidade. E quanto fere, viola e ofende, por uma ação ética e socialmente condenável, é crime, sim!

    1. Não concordo LUIZ. Se fizerem uma piada sobre um político, ele vai se sentir ofendido mas 99,99999% da população vai achar graça e afirmar que não foi crime. O limite é muito complexo.

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