Aloisio Mauricio /Fotoarena/Folhapress

Sob o risco de perder relevância nacional, PSDB aposta suas fichas em Rodrigo Garcia

07.04.22 09:02

Em seu manifesto de fundação em 1988, o PSDB gabava-se de ter nascido “longe das benesses oficiais e perto do pulsar das ruas”. Com apenas seis anos de existência, o partido conquistou um feito antes restrito apenas ao então PMDB: conseguiu eleger, de uma tacada só, o presidente da República e o governador de São Paulo, principal colégio eleitoral do país — Fernando Henrique Cardoso e Mário Covas, respectivamente. Depois que FHC deixou o poder, a sigla começou a perder o pulso das ruas. Foram cinco derrotas consecutivas nas eleições presidenciais, sendo a última a mais acachapante da história do PSDB, quando o então candidato tucano ao Planalto, Geraldo Alckmin, amargou menos de 5% dos votos. O divórcio com o eleitorado já ficava claro ali, mas é nas eleições de outubro deste ano que a legenda corre o risco de perder, de vez, a relevância.

Os próprios tucanos admitem nos bastidores que, senão o futuro do partido, ao menos a condição desfrutada hoje de uma das principais legendas do país, está ameaçada. Vem daí, em grande parte, a irritação de algumas lideranças com o teatro protagonizado pelo ex-governador de São Paulo João Doria na última semana, quando ele blefou ao indicar que poderia desistir da disputa presidencial e permanecer no governo local, o que minaria os planos de Rodrigo Garcia (foto), candidato do PSDB ao Palácio dos Bandeirantes. Doria desistiu de desistir e Garcia manteve-se como o nome tucano na corrida estadual, mas sua campanha sofreu baixas significativas – um de seus aliados, o apresentador José Luiz Datena, que era candidato ao Senado na chapa, anunciou sua filiação ao PSC e declarou apoio a Tarcísio de Freitas, do Republicanos, candidato de Jair Bolsonaro e principal adversário no estado por disputar a mesma faixa do eleitorado. Como a eleição de um tucano à Presidência é uma possibilidade remota hoje, para os integrantes do PSDB a sobrevivência do partido como sigla de grande porte está diretamente ligada ao desempenho de Garcia nas urnas em outubro.

Há uma clareza de que a manutenção do próprio partido no estado e, talvez, no Brasil depende da eleição de Rodrigo Garcia em São Paulo”, admitiu um prefeito do PSDB paulista, sob reserva. “Não à toa, o próprio grupo do Doria, em conversas mais tensas, o chamou de ‘moleque’ e ‘inconsequente’. Para o partido, seria um desastre (perder em São Paulo)”, completou.

O tucanato está há quase três décadas no comando do governo de São Paulo e perder no seu próprio reduto terá efeito arrasador para uma agremiação que quer se manter como uma das forças da política nacional. Por isso, o partido aposta todas suas fichas na eleição do ex-vice-governador. Embora apresente um resultado tímido nas recentes pesquisas – entre 3% e 5%, contra 30% do petista Fernando Haddad e 12% de Tarcísio de Freitas –, Garcia espera crescer no próximo mês, depois de peregrinar pelas onze regiões de São Paulo.

A ideia nessa largada da pré-campanha é se apresentar à população, já que uma grande parcela ainda não o conhece, participar de entrega de obras e dar entrevistas a rádios locais, com grande capilaridade entre o eleitorado. O tom dos discursos será o mesmo da primeira peça publicitária divulgada por Garcia, da lavra do marqueteiro Chico Mendez, na qual ele se vende como um “gestor”, tal como como João Doria, que integra o governo há mais de 26 anos, e responsável por programas sociais como o Bom Prato, Creche Escola e São Paulo Amigo do Idoso.

Para se distinguir do candidato de Bolsonaro, com quem disputa os votos do eleitor anti-PT, de centro-direita e mais conservador, Rodrigo Garcia vai insistir no argumento de que o ex-ministro da Infraestrutura é um forasteiro e que, portanto, não conheceria a fundo os problemas de São Paulo.  “Garcia é paulista raiz, o outro (Tarcísio de Freitas) é carioca. Rodrigo tem atuação na política paulista há 26 anos, já Tarcísio nunca se dedicou ao povo de São Paulo. Um come pastel e outro come ‘paxtel’, entendeu?”, diz o prefeito tucano de São Bernardo do Campo, Orlando Morando, antecipando as linhas gerais da narrativa da campanha.

Para além do catastrófico significado político de uma eventual derrota na própria trincheira do PSDB, um possível infortúnio de Rodrigo Garcia nas urnas tem potencial de impactar o desempenho do partido também nas eleições municipais de 2024. Se, em 2020, quando tinha Doria à frente do governo, a legenda viu cair de 785 para 512 o número de prefeituras que comandava, o placar pode ser ainda mais amargo caso a sigla perca a disputa pelo Palácio dos Bandeirantes neste ano. Pode frustrar, inclusive, o sonho da retomada do controle da prefeitura de São Paulo — depois da morte de Bruno Covas, a cidade passou às mãos do emedebista Ricardo Nunes.

Olhando para 2022, além da falta de perspectiva de vencer a disputa pela Presidência – os tucanos que se apresentam como candidatos ao Planalto, como Doria e o ex-governador do Rio Grande do Sul Eduardo Leite, têm hoje entre 1% e 2% das intenções de voto –, o partido está pessimista quanto à possibilidade de até mesmo repetir o resultado da eleição de 2018 para a Câmara, quando conquistou 29 assentos num desempenho já aquém das expectativas na ocasião.

Na janela partidária que se encerrou na sexta-feira, 1º, a agremiação saiu com menos dois deputados: caiu de 29 para 27. Um dos dois é o mineiro Domingos Sávio, que estava na legenda havia 34 anos e era vice-presidente na Executiva Nacional. Em relação às disputas estaduais, afora Garcia, a principal chance de vitória seria em Alagoas, mas Rodrigo Cunha, incentivado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira, trocou o PSDB pela União Brasil na última semana. Com um cenário tão desfavorável, segundo os próprios tucanos, perder em São Paulo “não é uma opção”.

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