Gilson Teixeira/Governo do MaranhãoO governador do Maranhão, Flávio Dino, do PCdoB, é candidato à reeleição

Os patrocínios estatais de Gilmar

Há dois meses, Crusoé revelou os patrocínios ocultos do IDP, o instituto do ministro do Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal. As receitas públicas da entidade, provenientes de contratos com governos estaduais, não são menos interessantes: em quatro anos, foram 12 milhões de reais
06.07.18

O Instituto Brasiliense de Direito Público, o IDP, é conhecido em Brasília por sua intensa produção acadêmica e pela grande influência que exerce no mundo jurídico. Fundado pelo ministro Gilmar Mendes, o instituto mantém uma faculdade de direito e cursos de pós-graduação, além de realizar eventos que já lhe renderam milhões em patrocínios, alguns deles ocultos, de empresas interessadas em processos em curso no Supremo Tribunal Federal, como revelou Crusoé. Mas, discretamente, a empresa de Gilmar Mendes também vem faturando milhões nos últimos anos, graças a governos estaduais. Eles contratam o IDP sem licitação, para capacitar funcionários numa área que não tem muito a ver com o direito: gestão pública.

Os governos de Goiás, Maranhão e Alagoas injetaram quase 12 milhões de reais  nas contas do instituto desde 2014, em troca de cursos planejados para serem oferecidos a servidores públicos. Nesta semana, o IDP prorrogou até o fim de 2019 um contrato de um 1 milhão de reais com o governo goiano, comandado de 2011 até abril deste ano pelo tucano Marconi Perillo, atual coordenador da campanha do presidenciável Geraldo Alckmin. Perillo e Gilmar são velhos conhecidos. Em 2012, por exemplo, o então governador se formou em direito numa faculdade de Goiânia e, na cerimônia, recebeu o diploma das mãos de Gilmar, convidado especial do evento.

Sempre sem licitação, a parceria entre o IDP e o governo de Goiás é longeva e lucrativa. Foram cinco contratos, totalizando 10 milhões de reais. Ou seja, por cinco vezes, o governo de Goiás decidiu contratar cursos de capacitação e, em todos casos, ignorou instituições similares de Goiânia e entendeu que havia “inviabilidade de competição” em razão da “notória especialização” do IDP. Havia previsão de que até 2.640 alunos fossem contemplados pelas aulas oferecidas pelo instituto de Gilmar.

Ao final da temporada de um dos cursos, Marconi Perillo organizou uma cerimônia especial para entregar os diplomas aos alunos. Também nessa oportunidade Gilmar Mendes estava lá, como convidado ilustre. Trata-se de uma graça oferecida a todos os que fecham contratos com o IDP, seja para patrocínios, seja para cursos: contratou, ganhou a possibilidade de ter o ministro por perto, em eventos públicos ou encontros privados. Uma das parcerias firmadas pelo governo Perillo com o IDP chama ainda mais a atenção: por 630 mil reais, os contribuintes goianos pagaram para que 40 servidores fizessem pós-graduação em comunicação, marketing e mídias sociais no instituto de Gilmar, especializado em direito público. As aulas do IDP, sediado em Brasília, foram ministradas em Goiânia.

Reprodução/YoutubeReprodução/YoutubeEm Goiás, Gilmar Mendes participou da formatura do tucano Marconi Perillo
Os demais cursos tinham como tema principal a gestão pública. Em um deles, havia até um módulo sobre os desafios para a economia de Goiás. No começo deste ano, o Tribunal de Contas do estado analisou o maior contrato do IDP, no valor de 6 milhões de reais. Aprovação sem ressalvas. O relator foi o conselheiro Edson Ferrari. Ele entendeu que não havia impedimento para a dispensa de licitação. Ferrari, por sinal, entende bem do assunto. Ele era o presidente do tribunal quando o IDP foi contratado para dar cursos a seus servidores. Ao todo, de 2014 até hoje, o tribunal goiano transferiu 1,7 milhão para as contas do instituto.

No fim do ano passado, o mesmo TCE recebeu um questionamento feito pelo Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público do Estado de Goiás. A entidade queria explicações para o fato de o IDP ser um instituto de direito e ter oferecido um curso de comunicação. Os conselheiros não viram qualquer problema. A explicação foi a seguinte: “Para ofertar curso na área de Comunicação, Marketing e Mídias é preciso possuir professores com formação acadêmica que os habilite a ministrar disciplinas que componham a grade do curso”. Ah, bom.

Em situação similar à de Goiás, os governos do Maranhão e de Alagoas também fizeram parcerias com o IDP para capacitar funcionários. Nos dois casos, o curso foi online. O contrato do Maranhão é de novembro de 2015, primeiro ano de Flávio Dino, do PCdoB, como governador do estado. Antes de se eleger, Dino, que já foi juiz, deputado e presidente da Embratur, passou algum tempo na iniciativa privada. E foi funcionário do IDP de Gilmar Mendes. Como coordenador do curso de direito, ele respondia a Dalide Corrêa, ex-faz-tudo do ministro. É Dalide, por sinal, quem assina pelo instituto o contrato com o governo do Maranhão.

Assim como ocorreu em Goiás, a entrega dos diplomas também contou com a presença ilustre de Gilmar. Na cerimônia, o governador Dino não poupou elogios ao que ele chamou de “gentileza” do IDP. “Nós agradecemos muito a parceria do Instituto Brasiliense de Direito Público, uma instituição muito credenciada e respeitada no nosso país e que gentilmente conveniou conosco e fez o provimento do curso, do conteúdo e professores”, disse. A gentileza, contudo, não saiu de graça: custou 1,8 milhão de reais.

Procurado por Crusoé, o IDP afirmou que seus cursos na área de administração têm nota máxima do Ministério do Educação e que os contratos foram firmados “de acordo com a legislação aplicável e no formato estipulado pelos órgãos responsáveis”. Em nota, o governo de Alagoas informou que a contratação sem licitação foi feita de acordo com a lei. Maranhão e Goiás não responderam até o fechamento desta edição. O ministro Gilmar Mendes não se pronunciou.

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