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Os rolos da sra. Witzel

A descoberta de novos negócios suspeitos do escritório da primeira-dama agrava ainda mais a situação do governador do Rio de Janeiro
19.06.20

Em 20 de maio, seis dias após a Polícia Federal prender o empresário Mário Peixoto por desvios na área de saúde e encontrar um contrato de uma das empresas de seu grupo com o escritório de advocacia da primeira-dama do Rio de Janeiro, Helena Witzel, o governador Wilson Witzel exonerou o subsecretário executivo de Educação, João Marcos Borges Mattos. A decisão chamou atenção por um fato curioso: a pasta não era alvo principal da Operação Favorito.

A resposta começou a aparecer quando o contrato da mulher de Witzel levou o Superior Tribunal de Justiça, o STJ, a autorizar buscas na residência oficial do governador e em endereços de seus principais aliados, como o advogado Lucas Tristão, ex-secretário de Desenvolvimento Econômico. Batizada de Operação Placebo, a ação encontrou na impressora de Tristão uma minuta de rescisão de um contrato entre a primeira-dama e outra empresa, a Quali Clínica, cujo sócio é ninguém menos que Borges Mattos, o subsecretário demitido — sim, ele era subsecretário de Educação, mas tinha uma empresa na área de saúde.

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Um relatório da Polícia Civil do Rio de Janeiro, produzido no âmbito da Operação Catarata e ao qual Crusoé teve acesso, mostra como a relação contratual da primeira-dama com o ex-subsecretário de Educação ainda pode causar muitas dores de cabeça ao casal Witzel. Deflagrada em julho de 2019, a Catarata avançou sobre fraudes em licitações de ao menos 66 milhões da Fundação Leão XIII, ligada ao governo do Rio, cometidas por um grupo de empresas que se ajustavam previamente para ganhar licitações.

Assim como nos desvios da saúde, essas empresas prestam serviços para o governo desde a época de Sérgio Cabral e Luiz Fernando Pezão e fecharam novos contratos na gestão Witzel. Embora os negócios investigados sejam todos do governo de Pezão, segundo a polícia, o governo Witzel já assinou ao menos dois contratos, sem licitação, com uma das entidades suspeitas, o Instituto Brasileiro de Ações, Pesquisas e Estudos Sociais, o Ibrapes. O objeto das contratações é a prestação de serviços relacionados ao atendimento de estudantes com algum tipo de deficiência na rede pública. Os dois contratos, no valor de 16 milhões de reais, segundo o relatório da polícia, foram firmados, justamente, com a Secretaria de Educação de Borges Mattos no mesmo ano de 2019, quando a primeira-dama fez negócio com a Quali Clínica.

Reprodução/FacebookReprodução/FacebookImpressora de Tristão tinha minuta de um contrato com a primeira-dama
Embora não aborde a atuação de Borges Mattos em contratos da gestão Witzel, o relatório analisa conversas e anotações encontradas com um dos empresários envolvidos no esquema: Marcus Vinicius Azevedo da Silva. Além de ser sócio da Riomix, que participou das licitações investigadas, Silva foi assessor do vice-governador, Cláudio Castro, do PSC, na Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro. Esteve no gabinete entre março e agosto de 2017. Nessa época, diálogos encontrados em seu WhatsApp sugerem a entrega de valores a agentes públicos por meio de outro integrante do grupo. Já nas anotações, em parte replicadas no relatório da polícia, são vistos valores atrelados a siglas e empresas. Em algumas delas, destacadas no documento, há repasses para JM, que seria João Marcos Borges Mattos. Antes de ser subsecretário no governo Witzel, ele foi diretor de Administração e Finanças da Leão XIII e integrou os quadros da pasta de Assistência Social.

Helena Witzel acumula com mais esse contrato, cujo valor ainda é desconhecido, ao menos três relações profissionais no mínimo estranhas. O primeiro contratante é o PSC, partido do governador e do vice. O outro contrato, com a empresa ligada a Mario Peixoto, rendeu a busca e apreensão na residência oficial. Desconhecida de todos os principais advogados do Rio, a advogada foi contratada por 540 mil reais, mas nunca atuou nos processos. Os valores são considerados muito acima da média para uma neófita. A ex-aluna do governador, que virou sua mulher e se tornou uma promissora dona de banca advocatícia, fazia apenas consultoria por telefone, as chamadas “consultorias verbais”. No caso do contrato com a empresa do ex-subsecretário de Educação, a previsão era também de atuação “extrajudicial”, sem que haja processos específicos.

O terceiro contrato, para investigadores ouvidos por Crusoé, reforça a tese que aponta para a utilização do escritório de advocacia de Helena Witzel como ponto de recebimento de valores indevidos relacionados a negócios com o governo do Rio. O mesmo estratagema foi adotado em outros tempos por outra primeira-dama do Rio, Adriana Ancelmo, ex-mulher de Sérgio Cabral. Com um detalhe: embora sejam casados desde 2004, o atual governador e Helena Witzel passaram para o regime de comunhão universal de bens somente no dia 3 de setembro de 2019. A data é próxima à do início de um contrato suspeito encontrado pela Polícia Federal, entre o escritório de advocacia da primeira-dama e uma empresa investigada. Na prática, isso permitiu que todos os bens do casal  passassem a ser parte de um patrimônio só. Em nota enviada a Crusoé, os advogados da primeira-dama informaram que o escritório dela “não presta mais serviços para a referida empresa” e que “demais informações a esse respeito serão prestadas em juízo”.

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