Em busca de um culpado
Um incêndio no porto de Beirute, no Líbano, alastrou-se na terça, 4, e atingiu uma carga de 2.750 toneladas de nitrato de amônio que estava guardada no armazém 12. A explosão que ocorreu logo em seguida foi equivalente à de 1.155 toneladas de dinamite — mais avassaladora que qualquer bomba convencional que possa ser lançada de um avião. A maior parte dos edifícios em um raio de 250 metros foi destruída. Vitrines da principal rua comercial, a 30 quarteirões de distância, foram estilhaçadas. Mais de 150 pessoas morreram. No espaço onde havia o armazém, uma cratera com 120 metros de diâmetro se formou e foi preenchida com a água do mar. Há 250 mil desabrigados na capital do país.
Na quinta, 6, o governo do Líbano deu a uma comissão de investigação o prazo de quatro dias para que os culpados sejam apontados. Dezesseis funcionários do porto foram colocados em prisão domiciliar. As informações obtidas até agora não deixam dúvidas quanto à negligência das autoridades, que por mais de seis anos mantiveram uma carga extremamente perigosa estocada em uma cidade com 2 milhões de habitantes. A catástrofe também levanta perguntas sobre a razão de o material não ter sido conduzido a seu destino, em Moçambique, ou a qualquer outro lugar seguro. A resposta pode estar justamente no interesse que a carga despertava pelo seu incrível potencial letal. O nitrato de amônio é uma das substâncias preferidas do grupo terrorista libanês Hezbollah, que usava o porto como um entreposto de contrabando e é hoje o pilar que sustenta a coalizão de governo do Líbano.
Especialistas em terrorismo têm alertado há anos para o controle que o Hezbollah mantinha sobre o porto de Beirute. A organização o usava para contrabandear remédios falsos, cocaína e ópio. Também utilizava o porto como entreposto para receber mísseis do Irã e enviá-los a outros territórios, como a Faixa de Gaza ou a Síria. O nitrato de amônio, por sua vez, pode ter ficado por ali pelo seu enorme valor para grupos terroristas — e o Hezbollah tem uma longa e comprovada experiência no assunto. A substância foi usada nos dois atentados perpetrados em Buenos Aires, em 1992 e 1994 (na explosão que destruiu o prédio da Amia, a Associação Mutual Israelita Argentina, foi utilizada uma caminhonete com 275 quilos de nitrato de amônio). “Apesar de ainda não se conhecer o dono da carga que explodiu, sabemos que o Hezbollah controla grande parte do Líbano, incluindo aeroportos e portos, e que teria interesse em desviar o nitrato de amônio para suas atividades terroristas”, diz Jim Phillips, especialista em Oriente Médio da Heritage Foundation, em Washington.
Em janeiro deste ano, o Hezbollah tornou-se uma peça central da coalizão de partidos que governa o Líbano. Há sérias dúvidas, portanto, se uma investigação imparcial sobre a explosão será possível. Para o Hezbollah, manter um estoque de explosivos próximo a uma área densamente povoada nunca foi motivo de preocupação. Ao longo dos anos, o grupo terrorista, financiado pelo Irã, transformou o Líbano em base para uma guerra contra Israel. Estima-se que 150 mil foguetes, 28 bases de lançamentos, fábricas de mísseis e depósitos tenham sido espalhados perto de escolas, aeroportos, hospitais e campos de futebol. “O Hezbollah usa a população como escudo humano para proteger suas armas, o que deveria ser considerado um crime de guerra”, diz o pesquisador Jonathan Schanzer, da Fundação para a Defesa das Democracias, em Washington. “A explosão no porto de Beirute foi uma amostra do que pode vir acontecer, se a ameaça do Hezbollah não for neutralizada.”
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