RuyGoiaba

Disque M para Salim Mattar

14.08.20

Parem as máquinas: descobriram que o governo de Jair Bolsonaro não é liberal! E isso anteontem, depois que Salim Mattar e Paulo Uebel pediram os respectivos bonés. Quem poderia imaginar que um milico sindicalista —ou seja, o pior de dois mundos—, que passou a vida defendendo pautas corporativas no Congresso e votando contra reformas, que ama aquele regime superliberal implantado pelos generais em 1964, faria uma coisa dessas? E agora? Quem vai contar a verdade pra esse pessoal sobre Papai Noel e o coelhinho da Páscoa?

Ah, ele se converteu em 2018: foi Paulo Guedes que operou o milagre e fez Bolsonaro ver a luz do Deus liberal na estrada para Damasco. Então vocês acreditaram no Guedes, esse misto de Eike Batista com vendedor de carro usado que chefia o Ministério da Economia? Aquele que, em fevereiro deste ano, prometeu enviar a reforma tributária ao Congresso “daqui a duas semanas” e mandou só a proposta de unificação de PIS e Cofins —em julho? Aquele para quem tudo “rende trilhão”? (Meu palpite é que o ministro só digita “1 trilhão de reais em…” e deixa o teclado concluir a frase.) Não há NENHUMA diferença significativa entre o Guedes pessoa física e o “Paulo Guedes bot” do Twitter emitindo sentenças aleatórias como “a adoção do feng shui pelo Ministério da Economia pode gerar um impacto adicional de 7 trilhões em cinco anos”.

Diga-se que Salim Disque M para Mattar (matar aquela vontade louca de vender uma estatalzinha, certamente) aprendeu com o chefe: jurou que na sua gestão “desinvestimentos e privatizações” alcançaram 150 bilhões de reais, cifra que ninguém sabe exatamente de onde saiu, e ainda afirmou a O Globo que Bolsonaro “é privatista, mas elegante; não se envolve”. Se não foi ironia, é a primeiríssima vez que as palavras “Bolsonaro” e “elegante” são usadas a sério na mesma frase. Afinal, assim como prudência e sofisticação, “elegância” é coisa de veado, talquei?

Sei que corro o risco de ser acusado de usar, em favor do liberalismo, a “falácia do verdadeiro escocês”, à qual alguns fanboys de Stálin e companhia vivem recorrendo —você diz que os regimes comunistas não deram certo e eles respondem que aquilo ainda não era o VERDADEIRO comunismo. Mas o fato é que “liberalismo brasileiro” já pode entrar para a lista dos mitos e lendas do nosso folclore: é o cara de camisa polo, gel no cabelo e sapatênis, ali ao lado do Boto, do Curupira e da Mula sem Cabeça, dizendo “deixa que o mercado cuida”. Não custa lembrar que Roberto Campos e Octavio Gouvêa de Bulhões serviram ao general Castello Branco e Mário Henrique Simonsen foi ministro de Ernesto Geisel, alma gêmea de Dilma Rousseff naquele amor pelo “Estado indutor”.

A parceria entre Guedes e Bolsonaro é apenas mais um capítulo da sempre renovada facilidade com que essa turma autoproclamada liberal adere gostosamente a governos autoritários. Deve ser para ficar mais fácil passar a mão invisível do mercado na bunda de todo mundo. Sou mais o único liberalismo que dá certo no país, aquele da frase “casal liberal topa tudo” —inclusive porque a passada de mão é visível e consentida, diferentemente do liberal brasileiro típico, que só curte liberalismo se for no canal de aplicação de ozônio dos outros.

*

O Globo noticia que, em apenas quatro dias, o Brasileirão —que, se vivêssemos em um país sério, nem teria começado— já registrou 40 casos de Covid-19 entre jogadores. Como disse um amigo, é a volta do mata-mata. Literal.

***

A GOIABICE DA SEMANA

A prefeitura de Florianópolis lançou nas redes uma campanha em que defende evitar expressões que denotem preconceito: por exemplo, usar “autista” como se fosse um termo pejorativo. Até aí, tudo muito bem. Só que o tuíte da prefeitura, depois apagado, também condenava o uso de frases como “estou meio down”.

Por Deus, quem foi o gênio que enxergou nesse “meio down” —cujo significado óbvio é “para baixo” ou “deprimido”— alguma relação com os portadores da síndrome? Seremos obrigados a reinterpretar radicalmente aquela música de Rita Lee em que o ser humano “está cada vez mais down no high society”. Ou Kleiton & Kledir cantando “quando eu ando assim, meio down, vou pra Porto e bah, trilegal”. É ofensivo à dupla e a Porto Alegre, que vira uma espécie de destino ideal de gente como os personagens de “Debi e Loide”. Mas bah!

Reprodução/redes sociaisReprodução/redes sociaisKleiton e Kledir quando ficam ‘meio down’, segundo a prefeitura de Florianópolis

Os comentários não representam a opinião do site. A responsabilidade é do autor da mensagem. Em respeito a todos os leitores, não são publicados comentários que contenham palavras ou conteúdos ofensivos.

500
Mais notícias
Assine agora
TOPO