Pressão verde
A reunião de cúpula marcada por Joe Biden para a próxima semana é vista pela Europa e pelos Estados Unidos como uma oportunidade de ouro — para não dizer ultimato — para fazer com que o governo brasileiro contenha o desmatamento ilegal na Amazônia. Pressionado, Jair Bolsonaro pretende levar ao encontro, virtual em razão da pandemia, a mensagem de que os compromissos com o clima terão, nos próximos anos, ações concretas. A comunidade internacional, porém, quer mais – e exigirá garantias de que, de fato, as promessas serão cumpridas pelo Brasil.
A pressão para que o governo reduza sensivelmente os índices de desmatamento e adote uma postura clara em favor da agenda climática não se limita ao campo da diplomacia. A elite empresarial dos Estados Unidos, juntamente com associações que fazem a gestão de fundos de investimento na área ambiental, colocaram o pé na porta para pressionar Brasília a reembicar o discurso e as ações na área ambiental.
A preocupação dos empresários, que representam uma gorda fatia do PIB mundial, está registrada em um lote de telegramas encaminhados ao Itamaraty pelo embaixador do Brasil em Washington, Nestor Forster, ao longo dos primeiros meses deste ano. As mensagens, obtidas por Crusoé, demonstram que Forster, um diplomata declaradamente olavista, precisou calibrar seu lado mais ideológico e passou a participar de extensas agendas com os investidores estrangeiros que cobram providências do governo brasileiro.
Cada compromisso do representante brasileiro nos Estados Unidos sobre a área ambiental tem gerado um relatório. O encontro mais duro foi com fundos de investimento e organizações ambientais, em 22 de janeiro. As organizações listaram medidas que o Brasil deveria adotar, inclusive para “melhorar sua imagem em mercados externos”. Entre os tópicos elencados, estavam a necessidade de o setor agrícola brasileiro se preparar para oferecer ao mercado internacional commodities agrícolas com emissão zero de gases de efeito estufa e a criação de programas de reflorestamento e recuperação de áreas degradadas. Forster resumiu assim sua participação: “Avalio que a reunião foi particularmente útil em função do grau de representatividade e credibilidade dos interlocutores presentes”.
A preocupação das grandes companhias americanas se deve ao fato de a Amazônia estar no centro das discussões mundiais sobre o clima. O Brasil, visto cada vez mais como um pária na área ambiental, ainda não deu sinais efetivos, aos olhos de investidores e governos estrangeiros, de que conseguirá reduzir as queimadas e o desmatamento ilegal a índices minimamente aceitáveis. A avaliação é de que, em 2019, primeiro ano de governo de Bolsonaro, ainda não era possível fazer uma cobrança mais dura porque o presidente havia acabado de assumir. Mas com ele já no terceiro ano de governo, é possível fazer as cobranças de maneira mais incisiva.
Em carta enviada a Biden nesta semana, Bolsonaro reconheceu o aumento das taxas de desmatamento e a necessidade de aperfeiçoar o combate aos crimes ambientes no país. Para o embaixador Roberto Abdenur, do Centro Brasileiro de Relações Internacionais, o Cebri, a postura na carta do presidente, apesar de positiva, não se sustenta porque está em franca contradição com o que tem acontecido na prática. Um dos quadros mais experientes da diplomacia brasileira, Abdenur critica a ênfase dada por Bolsonaro e pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, na necessidade de obter recursos do exterior antes de partir para as ações concretas.
“Quase que se condiciona a tomada de ações mais efetivas, com metas e ações, a recursos externos”, diz Abdenur. “Não se esqueça de uma frase do presidente da República, de que as ONGS são um ‘câncer que ele não consegue extirpar’. O governo Bolsonaro fez questão de ser hostil ao meio ambiente. Agora, ele dá uma guinada e se dispõe a dialogar até com os índios”, prossegue. “Condicionar a entrada de recursos à redução do desmatamento vai ser considerado pouco”, faz coro o também embaixador Rubens Barbosa, que preside o Conselho Superior de Comércio Exterior da Federação das Indústrias de São Paulo, a Fiesp. Para ele, o que americanos e europeus estão pedindo é que o Brasil apenas cumpra a legislação. “Nada mais que isso”, diz.
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