Lewandowski, o agradecido
Nesta quinta-feira, 22, o plenário do Supremo Tribunal Federal, sem contrariar os prognósticos, formou maioria para manter a decisão da Segunda Turma que declarou a parcialidade do ex-juiz Sergio Moro e anulou as condenações do ex-presidente Lula na Lava Jato. Mais uma vez, o julgamento, transmitido pela TV Justiça, serviu de palco para que ministros acostumados a recorrer a jurisprudências de oportunidade destinadas a afrouxar os mecanismos de investigação contra poderosos atacassem a principal operação de combate à corrupção da história recente do país. Argumentos de toda a ordem foram esgrimidos, incluindo questões que nem sequer estavam em pauta. Um dos mais exaltados, para a surpresa de mais ninguém, foi Ricardo Lewandowski.
Mesmo com a sessão suspensa, o ministro pediu para adiantar seu voto. Defendeu, por exemplo, que a Lava Jato trouxe mais prejuízos para o país do que o dinheiro recuperado dos cofres ocultos de empresários e políticos envolvidos com a corrupção na Petrobras. “A Operação produziu pelo menos três vezes mais prejuízos econômicos do que aquele que ela avalia ter dito que foi desviado com a corrupção. Isso fora milhões de desempregados que essa operação causou”, disse Lewandowski, sem corar a face. Coube a Luís Roberto Barroso intervir: “Vossa excelência acha que o problema então foi o enfrentamento da corrupção, e não a corrupção?”. Não satisfeito em deixar registrada nos anais no Supremo a pérola anterior, Lewandowski subiu o tom e passou a usar as mensagens roubadas da Lava Jato para acusar os procuradores de agirem em conluio. Referindo-se aos diálogos interceptados que consolidaram a estratégia da elite política para destruir a operação, ele chegou a cometer uma outra frase digna de lugar entre as mais surreais da história da corte. “Pode ser prova ilícita, mas foi amplamente veiculada e não foi contestada”. A propósito da cantilena sobre os prejuízos das investigações à economia, Barroso matou a questão: “Mas, então, o crime compensa para vossa excelência”.
Ministro do STF há 15 anos, Lewandowski nunca teve pudores em demonstrar que tem lado. É o voto mais óbvio do Supremo. Reza um adágio popular que de cabeça de juiz e de barriga de mulher grávida nunca se sabe o que sairá. O provérbio não se aplica a Lewandowski. Em qualquer circunstância, o magistrado pende sempre para o lado daqueles a quem deve a cadeira. É quase como uma devoção. O que aconteceu na sessão desta quinta, na qual o ministro julgou, mais uma vez, em favor do presidente que o nomeou ministro, não foi nada incoerente com seu histórico no tribunal.
Três anos mais tarde, em 2012, ao assumir no STF o protagonismo no processo do mensalão como revisor do voto do relator e então ministro Joaquim Barbosa, Lewandowski se posicionou no sentido de absolver José Dirceu e José Genoino, cabeças coroadas do PT. Mesmo derrotado, voltou a tentar beneficiá-los um ano depois quando proferiu um dos cinco votos a favor dos chamados embargos infringentes – recurso movido pelos acusados para que tivessem suas condenações reavaliadas. Como presidente do STF, entre 2014 e 2016, Lewandowski comandou a sessão do Senado que decidiu pela cassação de Dilma Rousseff. Para o ministro, a atuação seria apenas protocolar, mas ele resolveu criar uma jabuticaba jurídica para beneficiar a petista: fatiou o julgamento e a livrou da perda dos direitos políticos.
De 2018 para cá, com o paulatino, mas organizado e estratégico enfraquecimento da Lava Jato no tribunal, Lewandowski sempre se enfileirou ao lado da turma que, desde então, tem atuado para impor travas ao combate à corrupção, implodir a operação, desqualificar os procuradores da força-tarefa, o ex-juiz Sergio Moro e, claro, livrar Lula da cadeia – para, depois, torná-lo elegível, reabilitando-o politicamente. Em seu lance mais recente e decisivo, o ministro foi o responsável direto pelo compartilhamento das mensagens roubadas ao acolher um pedido da defesa de Lula. O tribunal nunca se debruçou sobre a legalidade da utilização das mensagens, mas uma parcela dos ministros passou a utilizá-las, lateralmente, para sustentar sua cruzada contra a operação. Como ficou evidente na sessão desta quinta, o intento de Lewandowski deu certo. O ministro que sempre foi fiel ao petismo segue fiel. E mais útil do que nunca.
Os comentários não representam a opinião do site. A responsabilidade é do autor da mensagem. Em respeito a todos os leitores, não são publicados comentários que contenham palavras ou conteúdos ofensivos.