Adriano Machado/CrusoéRicardo Lewandowski: o ministro aposentado trabalha para indicar o sucessor

Lewandowski, o agradecido

Mostramos como o ministro do Supremo mais fiel a seus padrinhos petistas não desaponta nunca aqueles a quem deve a cadeira
23.04.21

Nesta quinta-feira, 22, o plenário do Supremo Tribunal Federal, sem contrariar os prognósticos, formou maioria para manter a decisão da Segunda Turma que declarou a parcialidade do ex-juiz Sergio Moro e anulou as condenações do ex-presidente Lula na Lava Jato. Mais uma vez, o julgamento, transmitido pela TV Justiça, serviu de palco para que ministros acostumados a recorrer a jurisprudências de oportunidade destinadas a afrouxar os mecanismos de investigação contra poderosos atacassem a principal operação de combate à corrupção da história recente do país. Argumentos de toda a ordem foram esgrimidos, incluindo questões que nem sequer estavam em pauta. Um dos mais exaltados, para a surpresa de mais ninguém, foi Ricardo Lewandowski.

Mesmo com a sessão suspensa, o ministro pediu para adiantar seu voto. Defendeu, por exemplo, que a Lava Jato trouxe mais prejuízos para o país do que o dinheiro recuperado dos cofres ocultos de empresários e políticos envolvidos com a corrupção na Petrobras. “A Operação produziu pelo menos três vezes mais prejuízos econômicos do que aquele que ela avalia ter dito que foi desviado com a corrupção. Isso fora milhões de desempregados que essa operação causou”, disse Lewandowski, sem corar a face. Coube a Luís Roberto Barroso intervir: “Vossa excelência acha que o problema então foi o enfrentamento da corrupção, e não a corrupção?”. Não satisfeito em deixar registrada nos anais no Supremo a pérola anterior, Lewandowski subiu o tom e passou a usar as mensagens roubadas da Lava Jato para acusar os procuradores de agirem em conluio. Referindo-se aos diálogos interceptados que consolidaram a estratégia da elite política para destruir a operação, ele chegou a cometer uma outra frase digna de lugar entre as mais surreais da história da corte. “Pode ser prova ilícita, mas foi amplamente veiculada e não foi contestada”. A propósito da cantilena sobre os prejuízos das investigações à economia, Barroso matou a questão: “Mas, então, o crime compensa para vossa excelência”.

Ministro do STF há 15 anos, Lewandowski nunca teve pudores em demonstrar que tem lado. É o voto mais óbvio do Supremo. Reza um adágio popular que de cabeça de juiz e de barriga de mulher grávida nunca se sabe o que sairá. O provérbio não se aplica a Lewandowski. Em qualquer circunstância, o magistrado pende sempre para o lado daqueles a quem deve a cadeira. É quase como uma devoção. O que aconteceu na sessão desta quinta, na qual o ministro julgou, mais uma vez, em favor do presidente que o nomeou ministro, não foi nada incoerente com seu histórico no tribunal.

Pedro Ladeira/FolhapressPedro Ladeira/FolhapressO plenário do STF no julgamento do mensalão: o ministro não desapontou o PT
Lewandowski foi escolhido por Lula em 2006, quando era desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo. Por trás da opção por seu nome havia uma relação desenhada havia décadas com a família do petista. Sua mãe, Karolina, era amiga da então primeira-dama, Marisa Letícia. Apesar de ter nascido no Rio, o ministro foi criado em São Bernardo do Campo, berço político do PT. A família era próxima do clã do vice-prefeito Walter Demarchi, que, na década de 1980 indicou Lewandowski à Secretaria de Justiça do município. O irmão de Walter, Laerte Demarchi, dono de um restaurante em que Lula batia ponto, foi quem sugeriu pela primeira vez o nome de Ricardo Lewandowski ao então presidente, durante um almoço, para ocupar uma vaga no STF. A indicação acabou chancelada por Márcio Thomaz Bastos, amigo pessoal de Lula e então ministro da Justiça. Já investido da toga, Lewandowski não decepcionou. Em 2009, quando sua fidelidade foi testada pela primeira vez durante o julgamento do ex-ministro Antonio Palocci, denunciado em razão da suposta participação na quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa, o voto do ministro foi decisivo para livrar o petista da punição.  Para Lewandowski, as provas eram“débeis, frágeis e tênues, meras presunções e especulações”.

Três anos mais tarde, em 2012, ao assumir no STF o protagonismo no processo do mensalão como revisor do voto do relator e então ministro Joaquim Barbosa, Lewandowski se posicionou no sentido de absolver José Dirceu e José Genoino, cabeças coroadas do PT. Mesmo derrotado, voltou a tentar beneficiá-los um ano depois quando proferiu um dos cinco votos a favor dos chamados embargos infringentes – recurso movido pelos acusados para que tivessem suas condenações reavaliadas. Como presidente do STF, entre 2014 e 2016, Lewandowski comandou a sessão do Senado que decidiu pela cassação de Dilma Rousseff. Para o ministro, a atuação seria apenas protocolar, mas ele resolveu criar uma jabuticaba jurídica para beneficiar a petista: fatiou o julgamento e a livrou da perda dos direitos políticos.

De 2018 para cá, com o paulatino, mas organizado e estratégico enfraquecimento da Lava Jato no tribunal, Lewandowski sempre se enfileirou ao lado da turma que, desde então, tem atuado para impor travas ao combate à corrupção, implodir a operação, desqualificar os procuradores da força-tarefa, o ex-juiz Sergio Moro e, claro, livrar Lula da cadeia – para, depois, torná-lo elegível, reabilitando-o politicamente. Em seu lance mais recente e decisivo, o ministro foi o responsável direto pelo compartilhamento das mensagens roubadas ao acolher um pedido da defesa de Lula. O tribunal nunca se debruçou sobre a legalidade da utilização das mensagens, mas uma parcela dos ministros passou a utilizá-las, lateralmente, para sustentar sua cruzada contra a operação. Como ficou evidente na sessão desta quinta, o intento de Lewandowski deu certo. O ministro que sempre foi fiel ao petismo segue fiel. E mais útil do que nunca.

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