Carolina Antunes/PRRamagem e Heleno, até agora, estão livres da obrigação de se explicar à comissão que deveria fiscalizá-los

Inteligência sem controle

À diferença do que ocorre em países desenvolvidos, a atividade oficial de inteligência no Brasil corre solta sem a devida fiscalização do Congresso. Augusto Heleno e Alexandre Ramagem agradecem
04.06.21

Após a chegada de Jair Bolsonaro ao poder, a Agência Brasileira de Inteligência, a Abin, voltou a assumir papel central na vida política nacional – e não pelos seus méritos, evidentemente. Para chefiar o órgão, o presidente da República nomeou, em maio de 2019, um nome de sua mais absoluta confiança: Alexandre Ramagem, policial federal de carreira, que, por ter comandado sua equipe de segurança na campanha de 2018, conquistou rapidamente a amizade e o coração da família. Prestigiado, Ramagem virou habitué de encontros fora da agenda com o presidente e seus filhos nos palácios do Planalto e da Alvorada.

Foi exatamente a confusão entre interesse público e privado que transformou o chefe do serviço secreto brasileiro num dos protagonistas de confusões do governo. Um dos episódios mais rumorosos foi o que envolveu a produção de relatórios para ajudar a defesa de Flávio Bolsonaro nas tentativas de anular o inquérito que investiga o filho 01 do presidente pela prática de “rachid” em seu antigo gabinete na Assembleia Legislativa do Rio, a Alerj.

No início de maio, Ramagem voltou a frequentar o noticiário, a partir da revelação de Crusoé de que, um dia após o depoimento do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta à CPI da Covid, a Abin distribuiu uma “demanda urgente” às 26 superintendências da agência, determinando uma  “compilação de dados” sobre “irregularidades relacionadas à pandemia em âmbito estadual e municipal”. Restou claro neste caso o uso político da Abin por Bolsonaro, com o objetivo de tentar mudar os rumos da CPI, totalmente desfavoráveis ao governo até agora.

Adriano Machado/CrusoéAdriano Machado/CrusoéA sede da Abin: agentes produziram relatório para Flávio Bolsonaro e investigaram governadores a pedido do Planalto
Desde que Ramagem assumiu a Abin, mesmo diante de evidentes irregularidades na gestão da agência, o Congresso tem mantido ao relento uma comissão cuja atribuição é justamente fiscalizar a atuação dos arapongas oficiais, até para evitar que eles sejam usados ao bel-prazer dos governos de plantão. A Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência, a CCAI, é presidida atualmente pelo deputado federal Aécio Neves. O colegiado conta com doze integrantes – seis deputados e seis senadores.

Nem Ramagem nem o general Augusto Heleno Ribeiro, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, ao qual a Abin está subordinada, deram explicações convincentes até hoje sobre os rolos em que a agência está metida.

Quando era comandada pelo senador governista Nelsinho Trad, do PSD, entre 2019 e 2020, a CCAI realizou apenas uma reunião pública: em outubro de 2019, com duração de 9 minutos e 48 segundos. A audiência foi destinada à aprovação de emendas ao Orçamento de 2020, que incluiu um generoso aporte de 100 milhões de reais à Abin proposto pelo próprio Trad. Da cifra total aprovada pela CCAI, a Abin recebeu e gastou 10 milhões de reais. Parte do dinheiro – 1,1 milhão de reais – foi usada em um contrato sigiloso da agência, assinado no final do ano, para contratação de serviços de computação.

Marcelo Camargo/Agência BrasilMarcelo Camargo/Agência BrasilAécio Neves é o presidente da comissão fantasma
Não há, no horizonte, previsão de a comissão voltar a funcionar, embora não faltem assuntos sobre os quais ela deveria se debruçar. Aécio Neves já fez três pedidos ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, para retormar os trabalhos, mas até agora eles não surtiram efeitos práticos. Pacheco até disse ao tucano que iria autorizar a retomada dos trabalhos nesta semana, mas a promessa ainda não foi cumprida.

A criação da CCAI remonta a 1999, ano em que a Abin foi instituída pelo governo FHC para suceder o extinto Serviço Nacional de Informações, o braço de espionagem do regime militar. A comissão foi inspirada no modelo americano, onde o Congresso tem  colegiados dessa natureza desde a década de 1970. Foi a Comissão de Inteligência do Senado dos Estados Unidos, por exemplo, que descobriu e expôs em 2012 a prática institucionalizada de torturas durante interrogatórios da CIA, na guerra ao terror – a história é contada no filme O Relatório, de 2019.

Em Washington, ao contrário do que ocorre em Brasília, a fiscalização do trabalho dos espiões funciona de fato. Só neste ano, os parlamentares americanos já realizaram 21 audiências para receber informações sobre segurança nacional e ouvir explicações de autoridades da área que atuam no Poder Executivo. Cinco desses encontros foram públicos, incluindo as sabatinas para confirmar as indicações de William Burns para chefe da CIA e Avril Haines como diretora de Segurança Nacional.

U.S. CapitolSala de audiências do Comitê de Inteligência do Senado americano: lá funciona
“Nos Estados Unidos existe o que eles chamam de ‘comunidade de inteligência’, composta pela CIA e por uma série de agências. Há uma lista enorme de agências que os comitês da Câmara e do Senado têm que supervisionar. É algo tradicional. No Brasil, estamos muito menos evoluídos nessa questão”, diz Carlos Poggio, professor de Relações Internacionais da FAAP. Para Poggio, o abandono da Comissão de Inteligência pelo Congresso brasileiro reflete a baixa importância dispensada ao assunto pelos nossos parlamentares. “É um indicativo de que essa é uma questão que não é tratada de forma sistemática pelo Congresso.”

Quando os trabalhos da CCAI forem finalmente retomados, os integrantes da comissão encontrarão uma pauta extensa. Ao todo, há 25 requerimentos de informação, investigações e convocações de autoridades pendentes. Quase metade dos pedidos guarda relação com a atuação da Abin para ajudar na defesa de Flávio Bolsonaro. A comissão também pretende apurar a mobilização de oficiais da Abin, revelada por Crusoé, para levantar suspeitas contra governadores e prefeitos, a fim de desviar o foco da CPI da Covid.

Atualmente, dos doze integrantes da CCAI, apenas quatro são da base do governo. Nos bastidores, essa é uma das razões apontadas para a paralisia do colegiado. O governo sabe que, se a comissão funcionar a contento, o Palácio do Planalto pode ganhar mais uma fonte de problemas.

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  1. Cara ler um reportagem ridícula dessas que sempre falou amém para os desmandos da esquerda beira vigarice intelectual e falta de ética….. Isso é atribuição do presidente seus jornalistas dementes cerebrais…. Bando de comunista

  2. Ao contrário do Brasil, nos EUA TODAS as comissões funcionam! Aliás, é exatamente no porquê que as coisas não funcionam aqui que a imprensa deveria priorizar suas “energias” e “diligências” (ao invés da ultra super importância que é dada à “fofoca miúda” de irregularidades/corrupção que é praticamente o único “prato” que tem no cardápio da imprensa desde q me conheço por gente - e que nunca “matou a fome” ou, em outras palavras, nunca foi ou fomentou solução). Voto distrital puro já + recall!

  3. O que não pode é deixar a ABIN ser "fiscalizada" pelo Congresso. Pelo Congresso?! Daqui a pouco Crusoé vai começar campanha pra eleger o Renan presidente da CCAI. Ou seria o Aziz? Quem sabe algum deputado ou senador petista envolvido na Lava Jato: tem aos montes. Vocês estão de brincadeira.

  4. Pobre Brasil 🇧🇷 Pobre gente brasileira! Somos um povo mantido na escuridão da falta de conhecimentos e educação que nos habilitassem a saber votar, julgar e escolher os melhores para nos representar nos postos de governo. Os rebotalhos, profissionais políticos ávidos pelo dinheiro fácil, são os que continuamos escolhendo, sem entender o quanto são perniciosos e despreparados

  5. Porque será que Bolsolixo elegeu o Pacheco e o Lira? Para garantir conforto de que seus anos de malandragem e corrupção continuem.

  6. O congresso brasileiro, numa de suas piores formações da história da república, assiste calado e impávido a todo esse desmonte e aparelhamento das instituições brasileiras. Acham que estão salvos, que são intocáveis. A primeira coisa, quando e se o plano do esquizofrênico der certo, será o fechamento do congresso. Aí vão se arrepender mas será tarde demais. O que mais incomoda e dói é constatar que todo esse movimento está sendo liderado por uma pessoa totalmente desqualificada.

  7. Tenha dó porra, alguém acha que com o congresso que temos pode-se fiscalizar alguma coisa séria nesse pais ? Lá ,está cheio de gente com a capivara mais suja do que pau de galinheiro.

    1. Paulo, a começar pelo seu presidente, Aécio Neves.Agora, qual o chefe de uma nação que iria nomear para chefiar seu serviço de inteligência alguém que não fosse de sua confiança? Esse repórter deve estar de sacanagem ou não tem o que fazer.

  8. Cada vez mais o Planalto se afunda na lama que ele mesmo criou. Vamos acordar? Bolsonaro não quer O país igual aos EUA ele quer uma nova Alemanha Nazista, para chamar de sua.

  9. Achar que o serviço secreto dos EUA realmente é “investigado” e “controlado” pelo Senado é acreditar na história da chapeuzinho vermelho.

  10. A Abin várias vers teve seus agentes flagrados pela Pf cometendo atos reprováveis,mas o que aconteceu?Os salários da Abin são superiores aos de agentes especiais da pf,que demoram 13 anos pra ter sees cargo e passam por vários esrudos e provas,e um oficial de inteligência da Abin já começa ganhando mais que um policial federal com 13 anos de carreira e que se preparou muito e se arrisca e tem muito mais atribuições,além de ter que reprimir ilícitos da Abin

    1. O que importa o salário de uma carreira com outra e a matéria?

  11. Devida fiscalização do Congresso. Parei de ler ai. Esse congresso de bandidos, vermes, ladroes da pior especie, serve pra fiscalizar alguma coisa.

  12. Só mesmo Antas acreditam que em países como EEUU, Reino Unido, Israel, entre outros, os serviços de inteligência são totalmente controlados pelo legislativos de seus países!!!! Na verdade isso não acontece em nenhum país, democrático ou não!!! Quando um assunto sai do serviço secreto, deixa de ser secreto!!!

  13. O nosso presidente da República, Jair Bolsonaro, já deu o golpe de Estado depois de colocar o Exército Brasileiro de joelhos, cuja cor oficial sai do verde-oliva e passa a ser o marrom-cocô. Não sei o porquê de se gasta ainda tanta tinta sobre as pretensões do Bozo. Ele já aplicou o seu golpe em 03/06/2021. O stf e o congresso é que fingem que não, para não dar muito na vista e ficar feio eles colocando o rabo entre as patas.😡

    1. Para quem duvida do golpe já acontecido, Bolsonaro: • Afronta de forma contumaz e direta o Judiciário e o Legislativo; • Desrespeita frontalmente a regra de ouro N° 1 do Exército: indisciplina de um oficial de alta patente; • Permite e estimula apoiadores a pedirem o fechamento dos poderes da República; • Não perde nenhuma oportunidade de avacalhar as instituições e a própria CFB; • Domina a Polícia Federal e a Abin; • Condução criminosa em relação à Covid, e continua praticando crimes.

    2. De palhaços (sem graça), contra a vontade e sem emprego já somos feitos, há muito tempo. O que falta ao circo que é este país, agora? Apenas uma coisa...um gesto, de alguém riscar um fósforo e jogar na lona podre. Se ninguém o fizer, o Bozo é um jumento com iniciativa: ele mesmo fará!

    1. Como os bovinos são ardilosos e dissimulados...

  14. os EXEMPLOS EXCECRÁVEIS que uma SOCIEDADE tão CORRUPTA é capaz de produzir! São DEGENERADOS MORAIS que IMPEDEM o BRASIL de AVANÇAR! Em 2022 SÉRGIO MORO “PRESIDENTE LAVA JATO PURO SANGUE!” Triunfaremos! Sir Claiton

  15. "À diferença do que ocorre em países desenvolvidos", só na cabeça de jornaleiros que só leem o NYT e WashPo e nunca ficaram sabendo das mutretas de James Comey, Peter Strzok e sua amante Lisa Page, agentes de alto escalão do FBI que conspiraram contra o então presidente Trump. Meros retuiteiros da escória da imprensa americana nunca noticiariam algo prejudicial ao Partido Democrata, de quem a imprensa é mero braço de relações públicas.

  16. Querer comparar a atuacao do congresso americano ao nosso e' brincadeira. Jamais teremos a seriedade e o patriotismo que por la impera,infelizmente.Dentro de nossa mediocridade e' isto que temos para hoje...

    1. Em tempos de guerra híbrida, de desinformado generalizada e sistemática, automação e controle remoto da infraestrutura crítica, sistemas críticos como o eleitoral e dos cadastros das pessoas, da segurança bancária, o trabalho de inteligência cibernética e qualquer instância regulatória é vital.Todos esqueceram do roubo de 250 milhões de CPF, das fraudes diárias, dos sequestros de dados e a CCAI só se reúne uma vez? AÉCIO: VERGONHA SUA!

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