RuyGoiaba

Os pejotinhas do PSOL

18.06.21

É do ser humano, demasiado humano, ficar contente quando alguém que se arroga o papel de palmatória do mundo desaba do pedestal: o pregador que é flagrado com a boca na (por assim dizer) botija, o político probo que esconde dinheiro vivo em cavidades pouco ortodoxas, o campeão da moralidade cujo consumo de cocaína supera o do personagem de Al Pacino em Scarface. É um lugar-comum porque é tediosamente verdadeiro: o grande pecador que sobe no caixotinho e aponta o dedo para todos os outros pecados da humanidade. Nada de novo — o que, claro, não é obstáculo ao prazer de testemunhar a queda.

No mundo da política, ninguém se atribui mais a função de palmatória do mundo do que a esquerda (tarefa que é facilitada, no Bananão destes tempos, pela extraordinária estupidez da direita no poder). Por isso foi tão divertido ver o PSOL — esse porta-estandarte da pureza esquerdista, essa turma que saiu do PT por não achá-lo suficientemente radical — ceder à tentação dos demônios neoliberais e divulgar nas redes uma vaga de emprego na comunicação do partido, no Rio de Janeiro, com contratação por PJ (pessoa jurídica) ou MEI (microempreendedor individual). Em português claro: sem carteira assinada.

O caso foi publicado por O Antagonista nesta quarta, 16. Flagrado com a boca na botija neoliberal, que nesta revista de família eu nem posso dizer com o que rima, o partido se corrigiu: a vaga agora é por regime CLT e tempo determinado. Quem acompanhou os debates da reforma trabalhista no Congresso sabe que o PSOL deve ter batido algum recorde de “faça o que digo, não faça o que faço”: Deus nos livre de estimular contrato por PJ, é precarização do trabalho, só interessa aos patrões etc. Mas a gente também sabe que coerência não é o forte da patota: há oito anos, uma dessas revistas que leitores de esquerda amavam demitiu a redação INTEIRA porque os jornalistas ousaram fazer greve — isso depois de anunciar um corte de 50% na folha salarial. (Sim, greve, aquilo mesmo que fez Lula famoso nos anos 1970. Fica estabelecido que quando é contra a esquerda, assim como acontece com o impeachment, o nome certo é “golpe”.)

Nisso o leitor ingênuo, garotinho inocente, garotinho juvenil, pode se perguntar: não seria mais honesto o PSOL admitir que talvez, só talvez, em algumas circunstâncias eventuais, a contratação por PJ poderia ser interessante para os trabalhadores que a sigla diz representar? No mínimo, discutir o assunto sem caracterizar como Cramulhão do capitalismo, pelego, capitão do mato etc. os adversários que defendem essa possibilidade? É óbvio que não, nunca. Princípios são inegociáveis, muito embora a gente dê aquela negociadinha marota se ninguém estiver olhando: foi um caso de possessão demoníaca pelo espírito zombeteiro de Adam Smith, velho canalha que passou a mão invisível do mercado na nossa bunda, mas os responsáveis foram devidamente exorcizados.

Tudo somado, se ainda houvesse Carnaval, Pejotinhas do Pessol talvez rendesse um bom nome de bloco, na linha de Simpatia É Quase Amor, Me Beija que Eu Sou Cineasta e similares. O que também não vai acontecer nunca, porque no Rio os foliões desses blocos são quase todos psolistas ou simpatizantes — e ainda são a alternativa saudável, vegan, que a cidade oferece a quem não curte uma milícia. Na síntese precisa formulada por Gil do Big Brother: o Brasil tá lascado.

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A GOIABICE DA SEMANA

Não bastou Jair Bolsonaro e seus amiguinhos motoqueiros saírem brincando de vrum-vrum na semana passada, já que o país não tem mesmo nenhum problema sério: o pior foi os bolsominions falarem em “1,3 milhão de motos” (o número ficou entre os 6,6 mil registrados pelo sistema da rodovia dos Bandeirantes e os 12 mil estimados pela PM paulista) e em “registro no Guinness Book” (o que o próprio Guinness desmentiu). Pena que o ridículo absoluto não seja mensurável: aí, sim, o rebanho do Mito figuraria com destaque em qualquer livro de recordes.

Alan Santos/PRAlan Santos/PROlha o presidentezinho fazendo vrum-vrum com seus amiguinhos, que bonitinho

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