RuyGoiaba

O governo mais burro da história do Brasil

02.07.21

Poucas vezes um texto meu ameaçou tanto ficar velho minutos depois de ter sido escrito: batuco as teclas enquanto depõe à CPI da Covid, nesta quinta (1º/7), aquele sujeito que é PM em Alfenas, disse representar uma empresa que vende pisos e pias nos EUA, tentou negociar “400 milhões de doses da vacina da AstraZeneca” (as doses dariam para vacinar quase o Brasil inteiro duas vezes, e a AstraZeneca nega trabalhar com intermediários) e, apesar de praticamente ter OLHA O GOLPE AÍ, GENTE piscando em neon na testa, afirmou ter se indignado com uma proposta de pagar propina ao governo — mas, mesmo sendo PM, não prendeu ninguém. E teve jornal comprando essa história pelo valor de face.

Ainda não se sabe qual é o papel do tal Luiz Paulo Dominguetti no caso das vacinas: se é um cavalo de Troia usado pelo bolsonarismo para queimar Roberto Dias, exonerado do cargo de diretor de logística da Saúde, e tentar desacreditar as acusações de Luis Miranda em entrevista a O Antagonista — nos dois casos, visando evitar que o escândalo chegue a Jair Bolsonaro — ou se o governo de fato negociou com o PM que alegou ter 400 milhões de doses de vacina para oferecer, como indicam e-mails entre as partes. Ou se é tudo outra coisa: estou curioso para ver o que sairá desse inception de picaretagem, dessa rinha de 171.

Em qualquer das hipóteses, acho que já dá para cravar com absoluta segurança: trata-se do governo mais burro em toda a história do Brasil, este país em que a burrice, como dizia Roberto Campos, tem um passado glorioso e um futuro promissor. Quem achava que seria difícil superar Dilma Rousseff nesse quesito tem que dar a mão à palmatória: nada é mais idiocracy, o exercício da burrice em todo o seu esplendor fulgurante, do que o governo Bolsonaro. Nem é preciso citar a insistência do burro chucro em “tratamento precoce”, batendo na mesmíssima tecla quase um ano e meio e 520 mil mortos depois. Nem o fato de que seu governo não quis comprar a Coronavac nem a vacina da Pfizer, mas se enredou em negociações no mínimo suspeitas nos casos da Covaxin e do PM — coisa que talvez se explique mais pela malícia do que pela incompetência.

Não, esse é um governo que acredita no hoax do príncipe nigeriano, como mostrou reportagem publicada por esta Crusoé no ano passado: uma proposta de “doação de US$ 500 bilhões” que teria origem em “heranças esquecidas nos Estados Unidos” foi enviada a Jair Bolsonaro e circulou entre o gabinete do presidente e o Ministério da Economia por um mês até os técnicos da pasta explicarem a fraude, óbvia para qualquer moleque de 12 anos com acesso à internet. Esse é o nível do Tiozão do Zap Primordial que alega governar o país — e que já acreditava em remedinhos milagrosos como a fosfoetanolamina, a “pílula do câncer”, muito antes de se tornar garoto-propaganda da cloroquina.

Jair Bolsonaro, é claro, não veio do espaço para presidir o Bananão: ele foi escolhido por muitos brasileiros que gostam de votar em gente “autêntica” e “carismática”, incluindo ladrões, postes de ladrões, mentirosos patológicos e sociopatas, em vez de servidores que ponham o Estado para funcionar e mal se façam notar, como um bom árbitro numa partida de futebol. Aqui uma Angela Merkel, grande política com menos carisma do que um nabo, não se elegeria nem vereadora em Conceição do Mato Dentro, mas um jumento AUTÊNTICO como Bolsonaro — incluindo os coices, sobretudo quando vê pela frente uma jornalista mulher lhe fazendo perguntas — recebe 57 milhões de votos.

Sejamos francos: “autenticidade” não serve para nada nem na vida pessoal, com a provável exceção de constranger os convidados em jantares (“olha só, ele come a catota do nariz antes da sobremesa! Que autêntico!”). Na política, então, urge que ela seja morta a pauladas, assim como o “carisma”: como dizia Tom Jobim, autênticos são a avenca e o jequitibá, e você provavelmente não colocaria nem uma nem outro na Presidência, embora as duas plantas talvez dessem menos prejuízo ao país do que os últimos ladrões e limítrofes que pusemos lá. No mais, como diz um amigo meu, as pessoas precisam voltar a ter vergonha de ser burras. Já que burrice não dói, só nos resta tentar contê-la pelo bullying.

***

A GOIABICE DA SEMANA

Poderia estar em qualquer um dos parágrafos acima, mas separei para a goiabice da semana porque achei que merecia destaque: em entrevista à Jovem Pan na semana passada, a brilhante Bia Kicis, atual presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, descreveu deste modo a apuração dos votos feita pelo TSE nas eleições de 2020: “É um computador chamado Nuvem, o nome do computador da Oracle se chama Nuvem, é lá que é feita a soma [dos votos]”.

Torço para que o Bananão sobreviva à eleição de representantes com QI numericamente igual à temperatura ambiente. Mas não boto muita fé.

Cleia Viana/Câmara dos DeputadosCleia Viana/Câmara dos DeputadosBia Kicis, cuja inteligência privilegiada não cabe nem no ‘computador Nuvem’

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