Adriano Machado/Crusoé

“Lula é um preso injustiçado”

Réu por improbidade, o ex-ministro Carlos Lupi, presidente do PDT e fiador da campanha de Ciro Gomes, ataca a Lava Jato e admite a possibilidade de dar indulto ao chefe petista caso o partido vença as eleições
31.08.18

Um dos assuntos mais incômodos para o candidato do PDT à Presidência, Ciro Gomes, atende pelo nome de Carlos Lupi. Aos 61 anos, o presidente do partido integra o extenso rol de políticos enrolados com a Justiça. Foi citado nas delações da Lava Jato como intermediário de caixa dois da Odebrecht e, quando era ministro no governo Dilma Rousseff, acabou enxotado do cargo após acusações de receber favores de um lobista dono de uma ONG. Por essa última razão, é réu em um processo que corre na Justiça de Brasília. Ciro tenta dar de ombros quando confrontado com os embaraços pretéritos de Lupi. Garante ter “confiança cega” no cacique do seu partido e, cinicamente, diz desconhecer os seus percalços jurídicos. O candidato vai mais além: promete, e repete, que se eleito dará a Lupi o cargo que quiser no governo. A Crusoé, o presidente do PDT afirma ser grato a Ciro pela lealdade, se define como perseguido e elabora sobre os motivos pelos quais o ex-presidente Lula, da cadeia, articulou para minar a candidatura presidencial do partido, um velho aliado do PT (o petista operou para que o PSB não apoiasse Ciro Gomes). Apesar da rasteira, Lupi se mostra fiel a Lula. Indagado se o candidato do PDT concederá um indulto ao ex-presidente caso chegue ao Planalto, ele não nega. Pelo contrário. Sai, festivamente, em defesa de Lula, que para ele é um injustiçado. Eis a entrevista:

Ciro Gomes disse nesta semana desconhecer que o senhor é réu em um processo em Brasília. Nunca falou com ele sobre isso?
Tenho uma mania herdada de Leonel Brizola: todo ano tiro certidões negativas de todos os órgãos. Tem muita gente que não gosta da gente na política. Eu já fui depor, acompanhei, já vi. Sei que não tem prova, estou lhe afirmando isso. Nenhuma, nenhuma, nenhuma. Inclusive uma delação diz que o benefício seria para o partido, e não para mim. Essa história que o “Jornal Nacional” mencionou é uma questão de semântica e de interpretação jurídica. Em 2009, eu era ministro e estava no Maranhão, com o governador, meu amigo Jackson Lago (morto em 2011). Fomos eu e um grupo de companheiros para fazer alguns convênios na área de qualificação profissional. Fui num avião de carreira da Gol até São Luís e, de lá, fui de carona com o governador e mais três ou quatro companheiros num avião de um cidadão que já trabalhava numa ONG respeitada. Em 2011, denunciaram isso. Eu, ministro, pedi para o Ministério da Justiça apurar. Ali não há crime, não há dolo. O que há é a possibilidade, se o juiz aceitar, de ter uma improbidade.

Mas o senhor é réu nessa ação. A terminologia está correta.
Aí é semântica. Há vários pareceres de juristas, inclusive do Supremo, que não consideram réu uma pessoa requerida por improbidade. Qual é a minha grande maldade nisso tudo? Sou burro, né? Poderia ter ido de avião de carreira.

Repito a pergunta: afinal, o senhor conversou ou não com Ciro sobre esse processo?
Para falar a verdade, nem eu sabia que a ação estava em andamento. Como isso aconteceu há tanto tempo, e como tinha sido arquivado o processo criminal, eu não sabia que tinha outro, por improbidade. Não sabia mesmo. Estou sendo absolutamente sincero.

Ele declarou que tem confiança cega no senhor. O senhor merece?
Fico muito feliz com esse conceito que o Ciro tem de mim, porque acho que ele me conhece bem. E quem vai provar a inocência não sou eu, é o tempo. A verdade é filha do tempo. Um dia, ela nasce.

Outra coisa que o Ciro disse é que o senhor poderá ocupar o ministério que quiser. Qual pasta escolheria?
Eu já tenho uma tarefa grandiosa demais que é ser presidente de um partido. Sou fundador do PDT. Eu era jornaleiro quando conheci Leonel Brizola em Ipanema, em 1980, e jamais imaginei que iria substituir o Brizola, uma referência, um mito. Já tenho mais do que mereço. Depois disso fui secretário de estado, ministro, deputado federal. Minha vida está realizada. Eu vejo no que o Ciro fala uma generosidade, uma gentileza de um amigo.

Mas o senhor recusaria um ministério?
Recusar não depende de mim. Depende do momento, depende de que governo será esse. Primeiro temos que ganhar a eleição. Eu sou como São Tomé: quero ganhar para ver. Vamos ganhar para depois ver o que acontece.

Que cargo gostaria de ocupar?
Ministério é escolha do presidente da República. Não depende de nenhum de nós.

O senhor se considera um fardo para Ciro nesta campanha?
Eu não acho, não. É que eu sou gordinho. É o peso físico. Mas não acho. Trabalho que nem um condenado, e a minha vida é de muita luta. Como a gente tem um projeto nacional, a gente desagrada ao outro lado. E como eu acho que o Ciro está do mesmo lado que eu, não vejo peso. Ao contrário, ele gosta, precisa e necessita da minha presença.

Por que está escondido na campanha?
Caraca! Eu vou a todos os eventos. Se aparecer mais, vou acabar aparecendo mais do que o candidato.

Nesta semana, por exemplo, o senhor não estava em um evento de campanha no Rio.
É que agora eu estou numa tarefa árdua, que é cuidar da divisão do fundo de financiamento de campanha, com o cobertor pequeno. Cobre o pé, descobre a cabeça. Cobre a cabeça, descobre o pé. O PDT tem em torno de 61 milhões de reais. Você tem um terço obrigatório das mulheres, cerca de 20 milhões. O resto, por uma decisão do diretório nacional, dividimos em outras três partes iguais: candidatura presidencial, candidatos a governador e Senado, além de deputados federais, deputados estaduais. Como é que eu faço? É uma loucura. Estou aqui tentando administrar crise. Não é fácil.

Adriano Machado/CrusoéAdriano Machado/CrusoéA régua de Ciro: o candidato promete combater a corrupção, mas faz vista grossa para a vida pregressa do presidente de seu partido
E o caixa dois, acabou mesmo? O petista Vicente Cândido nos disse que será uma eleição suja, apesar de tudo.
Olha, quem ousar fazer isso tem grandes riscos ou de ser preso como receptor ou ser preso como doador. Acho que caiu a ficha na cabeça das pessoas que fazem isso. Tanta gente presa, quase que 80% dos grandes empreiteiros indiciados ou presos, os tesoureiros todos presos. Presidentes de partidos indiciados. Tem que cair a ficha, né?

O que há de novo nesta eleição?
Estou há 38 anos nisso e nunca vi uma eleição tão diferente. Primeiro, há os fenômenos Lava Jato, mensalão, petrolão. Isso tudo gerou um descrédito maior do que já haviam em relação à classe política. Segundo, é uma eleição sem financiamento privado. Uma eleição fria, sem gente na rua, sem os tradicionais cabos eleitorais que pedem voto. Só vai esquentar no final. A população só vai começar a pensar na sua escolha mais próximo do prazo final.

O PDT defende indulto para o ex-presidente Lula?
Indulto só existe depois de o crime ser comprovado e julgado em todas as instâncias. Então, tem que primeiro esperar se os recursos dele vão ser atendidos ou não. E depois examinar à luz da legislação.

O senhor está deixando em aberto essa possibilidade.
Eu defendo que seja examinada a legislação em igualdade de condições com todos os presos do Brasil. E vou dizer mais: se prisão curasse, nós seríamos o país da solução. Prisão não cura ninguém, não resolve o problema de ninguém. Ao contrário. Na prisão, você só aprende a perder sua vida.

Lula não é culpado?
Este processo que foi colocado contra o Lula é falho, fraco e profundamente injusto. Não se pode condenar alguém pelo conjunto da obra.

Está repetindo o discurso do PT de que Lula é preso político?
Lula é um preso injustiçado.

O PDT, que por muitos anos foi aliado de primeira hora do PT, foi traído por Lula quando ele articulou para evitar que o PSB apoiasse Ciro?
Não considero essa palavra, “traído”, porque nunca disseram que iriam estar com a gente. Eles usaram um instrumento de hegemonia de tempo de televisão, da força eleitoral que o Lula tem para nos esvaziar politicamente. O PT agiu com medo de se isolar e de o Ciro ter uma candidatura mais viável ainda. É tão maldoso o negócio que, mesmo sabendo que o PSB não iria junto com eles, preferiram que o PSB ficasse neutro do que com a gente. A cultura hegemônica do PT não permite que ninguém lhes faça sombra.

A exemplo de Ciro, o senhor também defende reparos na Lava Jato?
O grande problema é que não se pode primeiro criar a publicidade do fato para depois apurar o fato. Isso é um crime. Você pode ferir reputações injustamente e prejudicar o próprio andamento do processo pela divulgação. No Brasil, é uma coisa sui generis. Eles jogam o nome da pessoa na lama e, depois, não têm provas. A delação precisa de prova. E aí? Já está destruída a imagem da pessoa? Esse é o grave erro da Lava Jato.

E o PDT, se ganhar, pretende mudar isso? Está repetindo o discurso de Ciro Gomes de que vai colocar o Ministério Público na caixinha?
O Judiciário tem que julgar dentro dos parâmetros legais. É que nem futebol. Sabe quando você tem um bom juiz? Quando ninguém lembra o nome dele. Se você começa a decorar nome de juiz, é porque tem alguma coisa errada. Ele (Sergio Moro) está querendo muito mais ser famoso, um artista reconhecido, do que um juiz.

Adriano Machado/CrusoéAdriano Machado/CrusoéA lealdade de Ciro a Lupi inclui uma promessa: se eleito, dará a ele o direito de escolher o ministério que quiser
O senhor não diz isso porque também foi delatado?
Meu amigo, eu estou à disposição para tudo. Eu não tenho uma investigação contra mim. O que existe são delações sem nenhuma prova, apesar de toda hora explorarem isso. Tanto é verdade que não tem inquérito. Desculpe, inquérito, tem. Não tem processo. Porque para existir processo tem que ter prova. Não tenho preocupação. Minha preocupação é zero.

Fernando Haddad emplaca como poste de Lula?
Muito difícil. Mesmo com um bom tempo de televisão, acho que Haddad não é uma figura carismática, não é nordestino para atrair o eleitorado mais cativo do Lula.

O PDT vai ser aliar ao PT num eventual segundo turno?
Getúlio Vargas, na década de 1940, disse uma frase que eu nunca vou esquecer na vida: “Apoio não se rejeita. Se aceita”. Todos os brasileiros e brasileiras que quiserem apoiar o Ciro no segundo turno serão bem-vindos.

Ciro é criticado pela truculência com que age e fala. Isso não é um problema?
É, já foi no passado. Agora está todo mundo achando Ciro paz e amor.

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