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‘A polarização é uma coisa estúpida’

O apresentador José Luiz Datena, que deve disputar uma vaga no Senado no ano que vem, diz acreditar nas chances da terceira via e conta como o PSL o escanteou da corrida presidencial
05.11.21

Depois de vários ensaios, o apresentador de TV José Luiz Datena pode, enfim, estrear na política em 2022. Recém-filiado ao PSD, depois de uma passagem relâmpago pelo PSL, Datena aceitou o convite de Gilberto Kassab para concorrer ao Senado por São Paulo. Seu plano era bem mais ambicioso. A almejada candidatura à Presidência foi implodida tão logo o seu antigo partido anunciou a fusão com o DEM, que resultou na criação do União Brasil. Só fiquei sabendo da fusão do PSL com o DEM pela mídia. Pediram para eu me lançar candidato à Presidência e dar entrevistas como candidato.  Depois, me disseram que a coisa tinha zerado”, afirmou Datena, que chegou a anunciar o ingresso na política em 2018, mas acabou recuando.

Conhecido por sua eloquência, Datena procura poupar pessoalmente o presidente do União Brasil, Luciano Bivar, de quem diz não guardar mágoa, mas afirma rejeitar as práticas da velha política, baseada nas “barganhas” feitas pelos partidos. Quem não escapa da língua afiada do apresentador é o presidente Jair Bolsonaro. Para o apresentador, se não tivesse distribuído emendas ao Centrão, “para frear o impeachment”, o governo não precisaria “furar o teto de gastos”, para bancar o Auxílio Brasil, substituto do Bolsa Família. Ele diz que é preciso encontrar um nome capaz de pôr fim à “estúpida” polarização entre Bolsonaro e Lula. Eis a entrevista:

Por que o sr. decidiu sair do PSL e se filiar ao PSD?
Só fiquei sabendo da fusão do PSL com o DEM pela mídia, quando já estava praticamente fechada. Fui pego de surpresa. Eu tinha um acordo com o PSL, mas a atitude do PSL comigo mudou. Primeiro, pediram para eu me lançar candidato à Presidência e dar entrevistas como candidato. Depois, quando houve a fusão, (Luciano) Bivar e (Antonio) Rueda me disseram que a coisa tinha “zerado”. Ficou tudo incerto. Partido político faz muita barganha, e não quero fazer parte de barganha. Essa é a velha política da qual não quero participar.

Pelo relato, o sr. se sentiu usado pelo PSL como moeda de negociação.
Aprendi uma coisa na política: é relativo você dizer que está sendo usado. A diferença é que a minha vontade de entrar na política vem de um dever cívico e público, e não de fazer barganha. Não é culpa das pessoas, mas do conceito no qual a política está inserida. Não posso chegar à leviandade de dizer que fui usado. Só que decidiram seguir um caminho que não é mais o meu. Se Bivar disse que “zerou“, zerou mesmo. Não ficou mágoa.

O sr. usou o termo “velha política” ao falar de sua saída do PSL. Bolsonaro também usou essa expressão na eleição de 2018. Ele faz parte da velha ou da nova política?
Bolsonaro falou que não queria usar a velha política e usou. Deu 30 bilhões de reais em emendas ao Centrão e, agora, reclama que não tem dinheiro para bancar o auxílio emergencial. Se não tivesse dado esse dinheiro para o Centrão, não precisaria furar o teto de gastos ou coisa parecida. A história mostra que Bolsonaro distribuiu emendas para frear o impeachment.

O Brasil está fadado a conviver com essa relação promíscua entre Executivo e Legislativo?
Não. O Brasil precisa justamente renovar a classe política, para mudar esse estado de coisas que sempre viveu. Por isso, gente nova precisa entrar para a política. O Brasil necessita mudar. E vai mudar.

André Lessa/Estadão ConteúdoAndré Lessa/Estadão Conteúdo“Tem que aparecer uma terceira via, seja ela qual for. Temos que dar alternativa para o povo escolher alguém que não tenha contribuído para mergulhar o Brasil nessa situação em que está”
Como avalia a condução do combate à pandemia pelo governo Bolsonaro?
Bolsonaro também entrará para a história por ter tido uma postura negacionista na pandemia. Ele não usa máscara. Está na cara dele o negacionismo. Além de outros fatores, como a negação da vacina.

Com a saída do PSL, o sr. será mesmo candidato ao Senado por São Paulo pelo PSD?
Tenho total apoio do partido e do (Gilberto) Kassab para ser candidato ao Senado por São Paulo. As tratativas se iniciaram antes mesmo de eu ter contato com o PSL. Portanto, volto à condição de antes. Só não serei candidato ao Senado caso Kassab queira que eu seja candidato a outra coisa, mas duvido, já que ele já lançou Rodrigo Pacheco (à Presidência) e Geraldo Alckmin deve ser candidato ao governo do estado. Acho o Senado uma boa forma de ter o primeiro contato com a política, aprendendo pelo Legislativo. Quem sabe mais para frente vou para outro cargo no Executivo.

Com a sua candidatura ao Senado pelo PSD, o sr. passa a fazer parte de uma frente anti-Doria em São Paulo?
Deixo essa história de “frente” para presidentes de partidos. O que me interessa é seguir meu caminho como senador e prestar serviço ao povo. Só espero que, desta vez, se forem fazer frente, verso, trás ou fusão, me avisem antes. (Max) Weber dizia: se for entrar na política, esteja preparado para se aliar ao diabo. Posso entrar na política, mas não quero me aliar com gente que pense diferente do que seja pensar no povo.

Antes de anunciar a filiação ao PSD, partido predominantemente de centro-direita, o sr. estava em tratativas com o PDT, de centro-esquerda. Não é um contrassenso?
Dirigentes dessas duas legendas é que estão conversando sobre a possibilidade de aliança. Eles propuseram isso. Se propuseram, é porque estão conversando. Ciro Gomes (até esta semana presidenciável do PDT) já falou publicamente sobre a possibilidade de aliança PDT-PSD. O contrassenso não é meu. Eles estão se adaptando. Dizem também, e eu não sei de nada concreto, que o Kassab poderia se aliar ao Lula no segundo turno ou coisa parecida. Só vou saber desses detalhes quando estiver dentro do partido.

Em caso de segundo turno entre Lula e Bolsonaro, quem o sr. apoiaria?
Não tenho preferência nenhuma por Bolsonaro ou Lula. Essa polarização é uma coisa estúpida demais. Tem que aparecer uma terceira via, seja ela qual for. Temos que dar alternativa para o povo escolher alguém que não tenha contribuído para mergulhar o Brasil nessa situação em que está. E Lula e Bolsonaro têm participação nisso. Ainda acredito que alguém da terceira via vai aparecer para dar mais opção ao povo brasileiro.

André Lessa/Estadão ConteúdoAndré Lessa/Estadão Conteúdo“Partido político faz muita barganha. Essa é a velha política da qual não quero participar”
O ex-juiz Sergio Moro anunciou nesta semana que vai ingressar na política e se filiar ao Podemos. Como avalia a candidatura dele?
O Moro não é a freira que entrou na boate. Para mim, ele acabou ajudando a destruir a Lava Jato. Com a bandeira de anticorrupção, meteu-se, pelo menos por definição jurídica e decisão do Supremo, em relação incestuosa com procuradores da Lava Jato. Uma relação que não deveria ter. Por isso, propiciou que o presidente Lula obtivesse uma vitória atrás da outra nos processos nos quais já havia sido condenado. Moro é uma série de contrassensos: ajudou a defender a bandeira anticorrupção, mas também a acabar com a Lava Jato. Independentemente de qualquer coisa, que Moro seja julgado pelas urnas, não por mim.

Como avalia a possível candidatura de Rodrigo Pacheco, atual presidente do Senado e agora seu colega de partido?
Conheço muito pouco o Pacheco. Estive com ele apenas uma única vez pessoalmente. Mas, pelo que me consta, é bem-sucedido politicamente. É um político jovem que venceu todas as eleições que disputou. Nenhum ingênuo chega a presidente do Senado à toa. Kassab, que é político experiente, vê no Pacheco credenciais para ser presidente da República. Espero que esteja certo. Em relação a Pacheco e em relação a mim.

Ao ingressar na política, o sr. pretende abandonar a TV?
Em princípio, pretendo conciliar as duas atividades. Se não houver condição de conciliar, vou traçar meu caminho na política mesmo.

Caso seja eleito senador, como pretende fazer para não se contaminar com os velhos hábitos do Congresso?
É só permanecer com o velho hábito que meu pai me ensinou: o mais malandro é o honesto.

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