Carlos Fernandodos santos lima

Moro e Dallagnol, ou a Lava Jato vai às urnas

12.11.21

A recente filiação de Sergio Moro ao Podemos, celebrada em uma mega cerimônia neste último dia 10 no auditório do Centro de Convenções Ulysses Guimarães em Brasília, e a exoneração a pedido de Deltan Dallagnol dos quadros do Ministério Público Federal, são o início da criação de uma frente de centro legítima para o combate à corrupção dentro da política, e não aquela fraudulenta e mentirosa encabeçada por Jair Bolsonaro e sua trupe em 2018.

A ida para a política, com a submissão de seus nomes ao referendo popular, desses dois ex-funcionários públicos desperta as mais diversas reações, desde o ódio puro e simples, passando pela hipocrisia da crítica simplista, da desconfiança natural daqueles que não conhecem ambos, até o entusiasmo dos admiradores da operação Lava Jato. Esses sentimentos contraditórios, elevados à potência máxima em um país polarizado, são sequelas de um processo político dissociado dos anseios da sociedade brasileira e da apropriação criminosa dos interesses públicos por um pequeno grupo de caciques políticos.

O ódio de determinados grupos e pessoas é perfeitamente compreensível. Afinal, onde ladrões simpatizam com a lei e a ordem? Em um país onde a política se resume na defesa de interesses pessoais inconfessáveis e que a composição se dá em um sistema de conchavos em quartos de hotéis de luxo, na beira de piscinas e convescotes regados a muito whisky, a ideia de destruição desse sistema de privilégios e a sua substituição por uma forma diferente de se fazer política, baseada na busca do interesse público, certamente gera medo, e o medo gera o ódio.

Entretanto, se o ódio à Lava Jato e ao que ela representa é compreensível, especialmente por parte daqueles que perderam noites de sono por receio de que seus crimes fossem descobertos, a hipocrisia de parte significativa da imprensa é inacreditável. Talvez amortecidos por anos de convivência com essa classe política e com sua forma imoral e criminosa de se apropriar do dinheiro público, muitos formadores de opinião simplesmente aceitam a política como está posta, acreditando que não há outra opção, mesmo que esse sistema deformado signifique e subversão da nossa democracia e a prevalência do poder econômico sobre a vontade popular.

A falta de critério e razoabilidade de anos de “corredores do Congresso”, com o amortecimento da percepção de que mesmo a política deve se submeter às leis e à Constituição, faz com que se aceite de forma fácil e leviana, por exemplo, a punição irrazoável e desproporcional de um membro da operação Lava Jato com a pena de demissão por ter pago de seu próprio bolso um outdoor de apoio à investigação, enquanto não se cobra o resultado dos inquéritos do foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal por crimes graves de corrupção pública.

Assim tem sido a reação à eventual candidatura de Sergio Moro à Presidência da República e a de Deltan Dallagnol a deputado federal. Aceita-se facilmente que os corruptos de sempre sejam candidatos, mas olham torto para ex-funcionários públicos que corajosamente tentam se candidatar. Parece prevalecer a ideia de que a política é terreno dos profissionais e não esfera de legitimação popular de pessoas e ideias. Se Sergio Moro e Dallagnol fizeram um bom trabalho na operação Lava Jato e tiveram a coragem de sair de suas carreiras para enfrentar o escrutínio da sociedade brasileira, por que tamanha rejeição de boa parte da imprensa aos dois?

Assim, é possível compreender quando Arthur Lira, o primeiro-ministro informal do governo Bolsonaro, neomensaleiro que se apropria ilegitimamente de parcela significativa do orçamento público, fala em mudanças no Conselho Nacional do Ministério Público – CNMP, pois ele está simplesmente defendendo o seu interesse em não ser incomodado por investigações sobre seus atos ilegais, mas não é admissível que esse assunto seja abordado pela imprensa apenas como um conflito de versões, quando a Câmara do Deputados desde a gestão de Rodrigo Maia vem se recusando a abrir procedimentos éticos contra parlamentares envolvidos na investigação, mas insiste em punir investigadores.

O importante de tudo isso é que o encurralamento de ambos pela vingança bolsopetista somente poderia levar ao caminho da busca por legitimação democrática dos anseios de Moro e Dallagnol por um país melhor. Assim também foi na Itália, onde o magistrado Antonio Di Pietro levou anos se defendendo de inúmeros processos e foi obrigado a se encaminhar para a política, para também fazer valer seus ideais. A crítica a ambos é direito democrático, gostar ou não deles é questão pessoal, mas o uso do aparelho estatal para impedir ilegalmente essas candidaturas fere frontalmente a democracia.

Sergio Moro, no evento de filiação ao Podemos, colocou-se como pré-candidato à Presidência da República, delimitando claramente um programa de centro baseado na estabilidade econômica, na defesa da família, mas também no respeito às diferenças, no combate à desigualdade social de nosso país e em apoio a um capitalismo sadio. A ênfase na ideia da refundação da República, com seu resgate das mãos desse agrupamento de pessoas e interesses que impedem o desenvolvimento pleno de nossa sociedade, seja pela corrupção pura e simples, seja pela constante prevalência de interesses particulares e menores sobre o interesse público, é essencial e lembra minha fala quando na 7ª fase da operação Lava Jato de que aquele era um dia republicano. República significa a prevalência do interesse público, inclusive de colocar corruptos e corruptores na cadeia.

Tenham sucesso ou não, Moro e Dallagnol foram corajosos em enfrentar novamente esse mecanismo e a hipocrisia daqueles que acreditam que essa atual é a única forma de fazer política. A terceira via só tem a ganhar com suas candidaturas, pois ela vai além da Presidência da República, passando também por todas as demais eleições de 2022 e 2024. O que todos os candidatos responsáveis devem repetir, como um mantra a partir de agora é: chega de mensalão, chega de petrolão, chega de rachadinha, chega de orçamento secreto, mas também, chega de desigualdade, chega da falta de educação, saúde e segurança. O caminho do centro, para o Brasil, parodiando Aristóteles, é o da virtude.

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