MarioSabino

Eu amo Alice

24.12.21

Este é o meu último artigo para a Crusoé em 2021, visto que a próxima edição da revista será a que reúne artigos sobre as perspectivas para o ano que vem, em diversas áreas. Espero que os autores que gentilmente aceitaram o convite do Rodrigo Rangel, diretor da Crusoé, tenham uma visão mais otimista sobre o país do que a minha. Espero que eles contrariem aquela máxima tcheca, da época do comunismo, segundo a qual o pessimista é apenas um otimista bem informado.

Pela minha lente pessimista, tudo piorou bastante no Brasil, em 2021, e não vejo motivos para acreditar que sairemos do atoleiro em 2022, a julgar pelos ineptos que nos governarão até o final do próximo ano e pelos nomes que encabeçam as pesquisas de intenção de voto. O favorito é Lula e o segundo colocado, até o momento, é Jair Bolsonaro. O cenário que ambos deixaram, como presidentes, é de devastação.

Aboletado no Palácio do Planalto, Lula apoiou-se no assistencialismo e no endividamento dos mais pobres, para criar a ilusão de que estava criando uma “nova classe C”. Depois, elegeu Dilma Rousseff, que fez o Brasil pedalar econômica e fiscalmente para trás — uma herança maldita que o chefão petista tenta varrer para o esquecimento. Tudo emoldurado por esquemas de corrupção jamais vistos na história nacional, que o STF cancelou por meio de manobras jurídicas que agora servem para que a facção jurídica do PT, o tal Grupo Prerrogativas, tente reescrever a história revelada pela Lava Jato, tarefa que conta com a participação de platelmintos morais instalados na imprensa.

O presidente da República do qual padecemos desde 2019 serviu de pretexto para que corruptos voltassem a ficar impunes e para que a nação fosse espoliada em bilhões de reais, por esse maldito Centrão, em troca de apoio político a um inquilino do Planalto sociopata, golpista, incompetente e também corrupto, como provam as rachadinhas. Ele também tem servido para escambos no Judiciário, que o mantém acuado tanto devida como indevidamente. Jair Bolsonaro é um culpado útil para todos.

Nesse quadro, quem tenta se colocar como real Terceira Via na próxima eleição presidencial é vilipendiado dia sim, outro também, e não está dito que os eleitores abrirão os olhos para escolher um candidato que tente quebrar o círculo vicioso a que fomos condenados nas instâncias superiores. A esperança de boa parte dos brasileiros limita-se a poder fazer churrasco na laje, beber cerveja barata e ter um Chevette a ser ainda mais usado nos fins de semana. O Brasil não é apenas o cemitério das ideias. É também onde as utopias vestem calças apertadas.

Nada do que escrevi é original, porque não há nada de original na imoralidade brasileira. Mas a nossa falta de originalidade, em 2021, chegou às raias do ficcional. Da má ficção. Alice no País não das Maravilhas, mas no País dos Horrores, num eterno julgamento em que as sentenças vêm antes dos veredictos e sem a possibilidade de acordarmos de um sonho que se tornou pesadelo.

O que desejo a vocês, em 2022, num esforço para ultrapassar o meu pessimismo essencial, é que esse pesadelo termine. Que as rainhas de Copas voltem a ser apenas cartas de baralhos descartáveis de um sonho curioso e finito, tal como no clássico de Lewis Carroll. Que, assim como Alice, possamos conservar, em nossos anos maduros, o coração simples e amoroso de nossa infância.

Eu quero ser Alice. Eu amo Alice. Eu tenho Alice no meu coração arrítmico.

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