Uma nova tentativa de recomeço

Neste mesmo espaço, em nossa edição especial que fechou 2020, escrevi que este 2021 seria o ano do recomeço. Tentamos que fosse. Mas não foi, infelizmente. Continuamos sufocados pela pandemia e ainda choramos muitas vidas perdidas para o vírus. Vivenciamos o prolongamento da tragédia, no mesmíssimo contexto de um país perdido, comandado por gente obscurantista, insensível, de ideias torpes e sem compromisso com o presente e com o futuro. Em paralelo, assistimos à derrocada do que ainda restava dos ventos anticorrupção que até há pouco assustavam o velho establishment político. Sim, a cultura da impunidade voltou a reinar com força, com o beneplácito dos mesmos tribunais que, ali atrás, chancelaram a caçada aos ladrões de dinheiro público. Sejamos sinceros: a bem da verdade, neste ano não apenas deixamos de viver o recomeço como retrocedemos algumas décadas na difícil jornada para transformar o Brasil em um país decente.

Aqui na Crusoé, fizemos a nossa parte. Lançamos luz, a todo tempo, sobre cada um dos movimentos que nos empurraram para trás: o jogo do Congresso para garantir a proteção da classe política, as decisões das cortes superiores em favor de investigados, réus e condenados, os arroubos autoritários do presidente da República, o sufocamento das instituições que antes lideravam o processo de higienização da esfera pública. Você que é nosso leitor pôde acompanhar, em tempo real, a sucessão de jogadas tramadas e executadas a partir de Brasília que devolveram aos poderosos enrolados a gostosa sensação de conforto. Também seguimos em nossa missão de descobrir malfeitos. Para além das apurações e análises que anteciparam as cenas do quadro político, nossos repórteres, sempre vigilantes, publicaram furos relevantes de grande repercussão. Quase sempre, nosso cardápio de notícias traz um mosaico pessimista e um tanto desanimador. Mas, em se tratando de Brasil, não poderíamos oferecer algo diferente a você que espera receber o desenho mais aproximado possível do picadeiro do poder, sem meias palavras. Chamar as coisas pelo que elas são é um princípio do qual não abrimos mão.

Nesta edição especial, oferecemos uma seleção de artigos exclusivos escritos por convidados que traçam as perspectivas para 2022 em diferentes frentes – política, economia, cultura, saúde, educação, democracia. Esperamos que você aprecie. Alguma dose de pessimismo é inevitável também nesta ocasião, uma vez que estamos a caminho de um ano complexo, com eleições que se prenunciam turbulentas e com a marca da extrema polarização. Mas, como escrevi algumas linhas acima, não há muito para onde correr. É nosso dever continuar fazendo o que nos cabe, ainda que os empecilhos se avolumem no caminho. Em 2022, mais uma vez tentaremos recomeçar. Em nome do time que faz a Crusoé, desejo a você e a sua família um excelente ano. Que a realidade nos seja mais leve do que esperamos.

Rodrigo Rangel
Diretor de redação