Reprodução/Flow PodcastMoro durante entrevista nesta semana: ele vai abrir os valores recebidos como consultor

A CPI que morreu de véspera

Jogada pensada por Lula para tentar emparedar Sergio Moro no ano eleitoral não dá certo e partido recua para não ter que passar vexame no Congresso
28.01.22

Nesta sexta-feira, 28, Sergio Moro irá revelar quanto recebeu da Alvarez & Marsal (leia mais abaixo) durante os dez meses em que trabalhou na empresa americana, depois de deixar o governo de Jair Bolsonaro. A intenção do pré-candidato à Presidência da República pelo Podemos é, segundo suas próprias palavras, conferir “transparência” e colocar uma pedra no assunto que ocupou o noticiário nas últimas semanas, por obra do PT e com o esforço estranhamente diligente de figuras do Tribunal de Contas da União.

O PT é useiro e vezeiro em fazer muita espuma para alcançar seus fins politiqueiros. Faz parte da práxis petista, irrefreável sobretudo em ano eleitoral. Para não perder o hábito, tão logo o procurador junto ao TCU Lucas Furtado viu frustrada sua tentativa de conseguir acesso à remuneração paga pela Alvarez & Marsal a Moro, devido a uma cláusula de confidencialidade que diz que só o ex-juiz poderia decidir sobre sua divulgação, Lula disseminou a ideia de que a instauração de uma CPI no Congresso seria a melhor maneira de constranger o adversário na corrida ao Planalto.

Acionado pelo candidato do PT ao Planalto, o deputado Paulo Teixeira se propôs a colocar o plano em marcha. “Vou pedir uma CPI por conflito de interesse. A Alvarez & Marsal foi contratada para fazer a recuperação judicial das empresas que foram processadas pelo juiz da 13ª Vara de Curitiba. O valor pago foi de 750 milhões de reais. Quem a empresa contratou como consultor? Foi Moro”, justificou o petista.

No final da última semana, a CPI já contava com apoio de próceres do Centrão, como o presidente da Câmara, Arthur Lira, e o ministro da Casa Civil de Bolsonaro, Ciro Nogueira, além de integrantes de PSB, PCdoB, PSOL, PDT e Solidariedade. Nas contas do PT, o pedido de abertura da comissão de inquérito já reunia algo em torno de 150 assinaturas – são necessárias 171 para a instalação da CPI. Parlamentares apanhados pela Lava Jato, entre os quais conhecidos corruptos e aliados declarados de Lula na campanha eleitoral deste ano, não escondiam o desejo de vingança contra o juiz que foi o seu principal algoz.  “Vou assinar o pedido de CPI. Porque ele (Moro) tem que explicar como ganhou tanto dinheiro”, afirmou Paulinho da Força, presidente do Solidariedade.

DivulgaçãoDivulgaçãoCoube a Gleisi a tarefa de anunciar que a ideia da CPI estava suspensa
Ao longo desta semana, porém, Lula percebeu que a tentativa de instaurar a CPI poderia representar um tirambaço no pé do PT. Sobretudo porque o partido havia recebido informações preliminares da consultoria jurídica da Câmara de que havia dúvidas se realmente seria possível instalar uma comissão de inquérito com o objetivo pretendido pelo PT. “O Congresso pode investigar aquilo que ele pode regular, conforme a competência legislativa definida na Constituição, e setores em que pode decidir sobre alocação de verbas. Não é o caso”, endossou Tiago Ivo Odon, consultor legislativo do Senado, ao Antagonista.

Mesmo que a CPI fosse juridicamente viável, Lula passou a entender que, se ela não fosse capaz de aniquilar Moro politicamente, poderia ao fim e ao cabo transformá-lo em vítima, o que jogaria contra seus planos de eliminá-lo tanto da disputa presidencial como do jogo político no pós-eleição, como mostrou a última edição de Crusoé.

A essa constatação, seguiu-se uma frenética troca de telefonemas entre a presidente petista Gleisi Hoffmann e o ex-presidente nos últimos dias. Foi quando Lula deu a ordem para o recuo. Numa das conversas, o ex-presidente indicou que seria melhor “não gastar energia” com algo que poderia não surtir o efeito esperado. Coube a Gleisi anunciar publicamente o cavalo de pau. “Não vejo necessidade de CPI para a gente chegar a essas informações. Estamos fazendo estudos jurídicos. Como esses processos envolvem falências de empresas, precisamos saber se juridicamente a gente poderia instaurar CPI sobre isso”, afirmou a petista.

Wesley Amaral/ Câmara Dos DeputadosWesley Amaral/ Câmara Dos DeputadosPaulo Teixeira: pedido de investigação arquivado pelo MP
Nas redes sociais, Sergio Moro disse que “Lula arregou”, embalando a hashtag que ficaria entre os assuntos mais comentados do Twitter na terça-feira, 25. Durante evento que marcou a entrada do Movimento Brasil Livre, o MBL, na sua pré-campanha, o ex-juiz reforçou a decisão de abrir seus rendimentos. “Quem não deve não teme, meus rendimentos são todos lícitos, normais. Eu não queria ceder ao abuso. Eu não vou apresentar ao TCU, porque está abusando do poder, o processo é ilegal, mas vou apresentar para todas as pessoas nas minhas redes sociais. Eu sempre combati a corrupção e sempre atuei com integridade. Como não tem o que falar do meu trabalho, tem gente que fica fantasiando e mentindo. Porque o pessoal tem medo, está vendo que o projeto está crescendo”, disse.

Como na ficha do ex-juiz não há empreiteiros amigos, pedaladas, pedalinhos ou palestras ao custo de 27 milhões de reais, será mais complicado para o PT voltar a martelar o assunto depois que ele tornar públicos os seus rendimentos. A bancada petista tinha ficado de rediscutir o tema na volta do recesso parlamentar, na próxima semana, mas na tarde desta quinta-feira, 27, recebeu mais uma ducha de água gelada: o Ministério Público Federal arquivou um pedido de investigação feito pelo petista Paulo Teixeira que, antes de colocar em dúvida os salários de Moro na Alvarez & Marsal, havia questionado na PGR a contratação do ex-juiz pela empresa. O pedido foi remetido a Augusto Aras, que o encaminhou para a Procuradoria no Distrito Federal, uma vez que o ex-juiz não dispõe de foro privilegiado. Ao arquivar o caso, o MPF disse ter havido “ausência de elementos mínimos que justificassem a continuidade de atividade persecutória”. Para o procurador Marcus Marcelus Goulart, as acusações de Teixeira configuravam “mera hipótese”, não havendo “elementos mínimos para se presumir corrupção na celebração de um contrato privado após regular desligamento do serviço público”.

Não é de hoje que o PT lança mão do expediente de criar CPIs sem nada ou coisa nenhuma para investigar, mas para servir de palanque eleitoral e político para o partido. No início de 2012, a sigla foi artífice da instauração pelo Congresso da CPI do Cachoeira, destinada a constranger oposicionistas, a imprensa e integrantes do Judiciário que defendiam, àquela altura, o ainda incerto julgamento do mensalão – o PT chegou a confeccionar um manual com o objetivo de instrumentalizar a comissão. Anos depois, em 2015, para jogar uma cortina de fumaça sobre as investigações do petrolão, a legenda tentou levar para a CPI da Petrobras investigações da era tucana, que em nada guardavam relação com o objeto das apurações.

Como o PT adora ressuscitar velhas práticas, a ofensiva para tentar eliminar um concorrente do jogo eleitoral era mais do que previsível neste 2022. Mas, pelo visto, o lance manjado foi implodido no nascedouro.

Atualização — Pré-candidato do Podemos à Presidência, Sergio Moro revelou nesta sexta-feira, 28, que recebia um salário bruto mensal de 45 mil dólares da Alvarez & Marsal, empresa localizada em Washington, nos Estados Unidos, na qual trabalhou como consultor depois de deixar o Ministério da Justiça e Segurança Pública. O valor equivale a 242,5 mil reais por mês, na cotação atual. O ex-juiz informou ainda que uma cláusula em seu contrato impedia que ele atuasse em processos relacionados a empresas comprometidas pela Lava Jato, como a Odebrecht. “Quando eu entrei na Alvarez & Marsal, para evitar qualquer confusão, eu falei: ‘Olha, vamos colocar uma cláusula dizendo, especificamente, que eu não prestarei nenhum serviço de investigação ou de compliance anticorrupção para empresa envolvida na Lava Jato’ “, afirmou. 

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