Ricardo Stuckert/PTAlckmin e Lula:

O PT sem bússola na economia

Lula manda emissários para falar com o mercado, mas não se compromete com a responsabilidade fiscal. Não adianta dizer "la garantia soy yo" a gente que prefere os números ao pensamento mágico
12.05.22

Desde o começo do ano, o PT vem fazendo esforços para derrubar a rejeição a Lula entre o empresariado. O ex-presidente não abriu muito espaço em sua agenda para o “mercado”, mas alguns nomes têm ajudado nessa aproximação. Os petistas Jacques Wagner, senador, e Alexandre Padilha, deputado federal, são dois deles. O ex-governador baiano e o ex-ministro das Relações Institucionais conquistaram bom trânsito em diversos setores produtivos, ao longo de suas trajetórias políticas. O economista Gabriel Galípolo, ex-presidente do Banco Fator, é outro personagem que vem tentando construir pontes entre empreendedores e o PT. Semanas atrás, ele acompanhou a presidente da legenda, Gleisi Hoffmann, em um tenso jantar com empresários reunidos pelo think tank liberal Esfera. Galípolo serviu de algodão entre cristais. Ele também deve tentar auxiliar Geraldo Alckmin, agora sacramentado como vice de Lula, a evangelizar o PT a respeito das virtudes de bons programas de concessões e parcerias público-privadas (PPPs). Quando Alckmin estava no governo de São Paulo, o banqueiro ajudou a formatar os principais projetos desse tipo realizados pelo Estado – alguns deles de interesse social, como a PPP Habitacional da Luz, que combinou a construção de um complexo de mais de 3.500 apartamentos populares com obras de revitalização da região central de São Paulo. Uma frase de Alexandre Padilha resume a mensagem que se tenta transmitir nesses encontros com a iniciativa privada: “Lula têm um histórico de realizações econômicas e não precisa de Posto Ipiranga. Ele mesmo é a garantia de que a gestão da Economia será feita com responsabilidade.” O problema é que esse discurso não casa com aquilo que o próprio candidato vem dizendo. 

Lula tem sido vago ao falar de economia, a ponto de ultrapassar o limite do absurdo. “A gente não discute política econômica antes de ganhar as eleições”, disse ele, na entrevista à revista americana Time. Os momentos assertivos são ainda mais inquietantes. Nesta semana, ele voltou a afirmar que não haverá teto de gastos em seu governo e que isso não vai aumentar ainda mais o rombo fiscal do país. “Não que eu vá ser irresponsável e gastar para endividar o futuro da nação. Não. É porque nós vamos ter que gastar naquilo que for necessário, na produção de  ativos rentáveis. Quem vai derrubar o gasto em relação ao PIB é o crescimento econômico, não é o corte orçamentário.” Esse é um raciocínio que economistas e empresários não engolem. Não porque não gostariam de ver atendidas as muitas necessidades sociais brasileiras, mas porque estão certos de que o plano é furado.

Mesmo quem acha que o teto de gastos tem data para acabar, recomenda que isso seja feita gradualmente e a partir de 2027, desde que o crescimento da economia seja, no mínimo, de 3% ao ano até lá. As previsões de crescimento da economia nacional nos próximos anos são pífias – vão da titica para a titica e meia. Em 2022, o índice deve ficar próximo de zero. Estima-se algo como 1,5%, em 2023, e 2%, em 2024, quando o próximo presidente já estará na metade do mandato. Está longe de ser um espetáculo de crescimento. Lula quer turbinar esses índices adicionando incerteza – ou seja, gastos públicos sem nenhum parâmetro – a um cenário que já está repleto dela, por causa da guerra na Ucrânia e da inflação global em alta. Gastar à vontade e crescer, nesse cenário, equivale a chupar cana e assobiar ao mesmo tempo. São coisas incompatíveis. As chances de fortalecer o PIB viriam, na verdade, de uma inversão de fatores: primeiro o governo põe ordem na questão fiscal, para, aí sim, sonhar com uma economia mais pujante. 

“A desconfiança em relação ao PT se reduziria caso houvesse um compromisso firme com as agendas de estabilidade e modernização da economia”, diz um personagem do mercado financeiro que se diz agnóstico em termos eleitorais. Não há sinal nenhum desse compromisso. E não adianta dizer que a presença de Alckmin na posição de vice equivale a uma nova Carta ao Povo Brasileiro, enquanto Lula continuar tripudiando não exatamente sobre o teto de gastos, que é uma ferramenta, mas sobre a própria ideia de contenção fiscal. Se perguntarem a Alckmin, ele também dirá que não gosta do teto de gastos – porque acredita que ele teria de ser antecedido por um drástico enxugamento do aparelho do Estado, como ele fez quando governou São Paulo. Mas não é Alckmin quem vai governar, caso Lula ganhe. O ex-tucano pode até estimular uma atitude mais favorável do PT às parcerias com a iniciativa privada, além de facilitar contatos com alguns empresários. Mas, sem uma declaração inequívoca de Lula sobre responsabilidade com o dinheiro público, nada disso basta. Não adianta dizer “la garantia soy yo”, como o petista tenta agora, para pessoas que preferem números ao pensamento mágico. 

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