DiogoMainardina ilha do desespero

Vinte e dois

20.05.22

Sabe quantos eleitores se recusam a votar tanto em Lula quanto em Jair Bolsonaro? Como eu desconhecia a resposta, perguntei para Felipe Nunes, da Quaest. E ele, gentilmente, calculou para mim (e para os leitores desta coluna), cruzando os dados de sua pesquisa mais recente, realizada alguns dias atrás.

O resultado é espantoso: 22%. Esse é o percentual do eleitorado brasileiro que rejeita ambos os candidatos. Ou 436 entrevistados de um total de dois mil. Os analistas costumam se concentrar nos 59% de eleitores que jamais votariam em Jair Bolsonaro ou nos 43% que jamais votariam em Lula. Mas há também esse imenso contingente transversal de 22% de eleitores que se recusam a votar em qualquer um dos dois – e que nem aparecem nas pesquisas.

É claro que, no mano a mano, uma parte desse eleitorado pode acabar escolhendo um dos lados, porque a ojeriza por um candidato é mais insuportável do que a por outro. Cito o exemplo de Antonio Tabet, do Porta dos Fundos. Ele disse nesta semana, numa entrevista para a TV:

“Eu nunca votei no Bolsonaro e nunca votei no PT. Eu já votei em gente muito ruim, mas no PT e no Bolsonaro eu nunca votei.”

Em 30 de outubro, porém, ele vai votar:

“Eu tenho minha opção no primeiro turno. Não é o Bolsonaro e não é o PT. Eu vou me dar o direito de escolher o candidato que eu acho que é o melhor no primeiro turno, mas se o segundo turno for entre Bolsonaro e Lula, eu não só vou votar no PT pela primeira vez na minha vida, como vou digitar 13 e ‘confirma’ com a língua. Se fosse Bolsonaro e Lúcifer, era 666 e ‘confirma’.”

Assim como ele, eu também nunca votei em Jair Bolsonaro ou Lula. Só que vou continuar desse jeito. Em vez de lamber a urna e me penitenciar pelos próximos quatro anos, prefiro comemorar a derrota de um dos dois. Esse é o meu plano. Sabe como é: sou um tipinho panglossiano, capaz de enxergar o lado positivo de todas as tragédias. Se Jair Bolsonaro for eleito, vou debochar da derrota de Lula. Se Lula for eleito, vou debochar da derrota de Jair Bolsonaro. O Brasil perde com ambos, mas nunca vou admitir a derrota.

Panglossianamente, digo também que essa parcela de 22% de eleitores, por mais desorganizados que eles sejam, constitui uma base sobre a qual construir uma espécie de sociedade paralela, semiclandestina, em que cada um resiste à barbárie cultivando o próprio jardim. Claro que isso é insuficiente para resgatar o resto do bananal, ou para fertilizá-lo. Ao mesmo tempo, é gente para danar – uma massa poderosa o bastante para impedir qualquer tentativa lulista ou bolsonarista de calar ou erradicar o dissenso.

Esses 22% representam a única saída para o Brasil, a verdadeira Terceira Via. Voto neles e, depois de votar, confirmo com a língua.

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