MarioSabino

Toc toc toc para o TikTok

08.07.22

Concluí que não faço parte deste ordinário mundo novo ao assistir ao filmete de estreia do STF no TikTok. Não sou frequentador do TikTok. Vi a peça do Supremo num site de notícias jurídicas, que divulgou o fato com muito entusiasmo, no ano passado. O motivo de o STF estar no TikTok é, para mim, um daqueles aspectos inexplicáveis da realidade. Parece que seria para aproximar a sociedade do tribunal. Parece que será um dos grandes feitos da gestão de Luiz Fux na presidência do STF, segundo li. A essa minha perplexidade, juntou-se uma segunda. O filmete de estreia mostrava a Monalisa, de Leonardo da Vinci, e a Moça com o Brinco de Pérola, de Vermeer, dando boas-vindas à escultura A Justiça, de Alfredo Ceschiatti, aquela que ajuda a tornar ainda mais desolador o descampado de concreto a que chamamos de Praça dos Três Poderes, em Brasília. Como a Monalisa está no Louvre e a Moça com Brinco de Pérola está na Mauritshuis, em Haia, não entendi o que o sorriso de uma e o adereço de outra têm a ver com a figura vendada que está na capital do Brasil.

Lembrei-me do TikTok do STF ao me deparar nesta semana com mais um filmete veiculado na rede social conhecida por sua respeitabilidade, o do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná. Traz um senhor e uma senhora, ladeados por duas moças, fazendo uma dancinha. A música em inglês tem letra que fala de caça às baleias. No Twitter, o procurador Vladimir Aras informa ser uma canção de marujos neozelandeses que trabalhavam no simpático ramo de extermínio de grandes cetáceos. Espero não ter sido homenagem dos produtores à silhueta do senhor e da senhora que fazem a dancinha. Ao que parece, são dois desembargadores do tribunal e a homenagem poderia ser interpretada como ato antidemocrático. Consta que o filmete teve 16 milhões de visualizações no TikTok. Espero que não sejamos obrigados a votar pelo TikTok em futuro próximo. Já quanto ao distante, não há garantia de nada. (Observação lateral: no Twitter, o perfil do TRE do Paraná é o sugestivo @treparana.)

Sou a favor de que magistrados possam ter contas pessoais em redes sociais, como o Twitter. Aprendo muito com algumas e me divirto bastante com as de humor involuntário. Mas quanto às contas das instituições das quais os magistrados fazem parte, não creio ser útil ou apropriado exagerar na dose. Não é útil porque a única coisa que pode aproximar os tribunais da sociedade são decisões judiciais que vão ao encontro dos valores que deveriam nortear o conjunto dos cidadãos. Se é para dar informação, convenhamos, a imprensa é bem mais eficaz (basta ver o nível de engajamento da conta do STF no Twitter, em relação ao total de seguidores). Quanto a não ser apropriado, é porque tribunais também precisam contrariar certas expectativas sociais, a fim de fazer valer a lei. Como conciliar esse papel com a ansiedade por visualizações e likes que acomete os responsáveis pela comunicação social das cortes? Fazendo gracinhas e perdendo a compostura, cujo resultado é a perda de credibilidade. Esse tipo de exposição midiática do Poder Judiciário precisaria, assim, ser evitado.

Eu, que era a favor da transmissão de julgamentos do STF e demais tribunais superiores pela TV Justiça, agora sou contra, sem que isso me coloque do mesmo lado de todos que sempre se opuseram a tal divulgação. Acho que a “redessocialização” dos tribunais, embora não restrita ao Brasil, apresenta excessos no país justamente por causa desse fenômeno televisivo que, em certos momentos, serviu para dar visibilidade necessária a determinados processos. O que temos hoje, contudo, é mais narcisismo individual do que propriamente transparência institucional, à diferença do que ocorre em latitudes diferentes das nossas tropicais. E, como alguns atores são mais exibidos do que outros, a Justiça adentra também o campo do histrionismo e com ele acaba se confundindo. Menos dancinhas, por favor, inclusive retóricas. Toc toc toc para o TikTok e adjacências.

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  1. Hoje falar de vergonha é sem dúvida falar de tribunais e do judiciário, em geral! Supremo Em primeiro lugar no vexame e caos institucionais!

  2. Excelente texto. Instituições não precisam ser simpáticas; precisam ser corretas nas suas atribuições . Mais uma vergonha .

  3. Voc\ê abordou um temos que tenho notado há algum tempo.O STF através de seus membros,que nos envergonham todos os dias, adotou esta modinha de ser moderninho,conectado, jogando para a galera.... Se for para jogar para a galera, leia-se população brasileira, teriamos pena de morte, bolsas diversas para sempre, afinal de contas o brasileiro é um coitado e precisa do Estado para lhe dar tudo o que tem direito apenas por ter nascido. E esquecem a única razão para qual existem.Fazer cunprir a Lei.

  4. Histrionismo e narcisismo à parte, essa turma da justiça que tanto se oferece aos jurisdicionados, é um elenco de magistral canastrice e de profundo mau gosto na forma e no conteúdo…

    1. Êpa!!!!! Meu maltês Lucky é um cão honesto e só late para anunciar a chegada do elevador ao terceiro piso do nosso prédio. Afora isso, é dócil....

  5. Gostaria de sugerir uma forma de aproximar os magistrados da sociedade. Passem a trabalhar 5 dias por semana, com direito a apenas 30 dias anuais de férias, e recebam seus salário sem nenhum tipo de adicional.

  6. A adesão ao TikTok explica muito bem a péssima atuação do STF e demais tribunais. São rasteiros, medíocres, gente que está muito aquém dos compromissos e atribuições das altas cortes! Compare-os aos grandes Celio Borja, Evaristo de Moraes, Adauto Lucio Costa, Eros Grau e tantos outros.

  7. Mario do Céu, por mais que se escandalize num dia, no próximo a criatividade dessa gentinha ainda mais nos surpreende! putz, tá pior que os piores sudoestes que peguei!

  8. O STF perdeu a credibilidade com o combate à Lava Jato, com o fim da prisão após condenação em segunda instância, soltando criminosos de colarinho branco etc. Participar do Tik Tok é apenas um detalhe perto das monstruosidades que o STF tem produzido

  9. Perfeito! O Judiciário precisa explicar melhir o seu trabalho para a sociedade, começando com o uso de menos juridiquês e mostrando claramente, por ex os passos de um procesdo judicial

  10. Devemos fazer a inevitável sugestão de revestir com espelhos todas as paredes das Cortes Superiores. São todos pessoas "sem noção".

  11. O STF se transformou num circo. São tantas as críticas contra aquela corte que consagra piadas de todos os tipos. Não duvido que muito próximo será uma atração do TikTok. A discrição tão essencial no STF foi substituída pelo deslumbramento pela mídia. Seus ministros se portam como deuses no olimpo. O STF do passado, já era!

  12. Comentários dessa magnitude mostram que Crusoé é imprescindível como mídia de informação. Apesar que a neutralidade seja uma utopia.

  13. Os ministros do STF deveriam se ocupar, exclusivamente, dos casos que chegam até eles. Nada de tantas entrevistas, cursos e muito menos as redes sociais.

  14. Decisivamente, este País é uma doideira: não é um país (a ser levado a) sério (e De Gaulle não teve nada a ver com isso). Também já fui a Istambul!

  15. Esse mundo novo em que juntar se à manada de infantilóides que buscar aparecer e se destacar tornou se uma necessidade, vai tornando a espécie humana cada vez mais parecida com aqueles pássaros que executam dancinhas para conquistar a fêmea. Cérebro? Para quê?

  16. Justiça existe para aplicação da lei, isso é coisa séria. Mas a seriedade pode ser leve, não precisa ser ridícula. São tentativas de melhorar a imagem de um poder que perdeu sua credibilidade.

  17. Sinceramente, ñ vejo problema em nada, acho q "td bem" q as instituições tenham contas no Twitter, tic toc, Instagram, canal de tv... o problema é q, por aqui, ñ demora nd pegar o caminho do ridículo, do tosco... Enquanto ñ conheço é indiferente, mas qdo fico, por ex., sabendo de dancinhas do sr e da sra do TRE dá uma vergonha, uma vontade de parar de ver, por a kbça embaixo do travesseiro p ñ vê-los seguir no ridículo! Mas as instituições independem das redes sociais pra causar essa sensação...

    1. A justiça está desmoralizada como a maioria das instituições deste país. Não existe etica, nem vergonha na cara para este pessoal. Cada dia pior....

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