MarioSabino

A chance de Bolsonaro é a nossa chance

12.10.18

Jair Bolsonaro é um símbolo a quem a maioria dos brasileiros está disposta a dar a chance de ser presidente da República, na crença de que não existe propriamente história; apenas biografia (a frase é do americano Ralph Waldo Emerson). É símbolo do antipetismo e de oposição a um sistema político apodrecido. Ponto. A sua história não importa para grande parte do seu eleitorado, à exceção do fato de ele ter passado incólume pela Lava Jato. O que importa é a biografia que pode ser construída a partir do momento em que Bolsonaro vier a ocupar o terceiro andar do Palácio do Planalto. É por isso que não adianta bater nele nesta campanha, assim como não adiantava bater em Lula na de 2002. Símbolo. Crença.

É essencial ajudar o símbolo Bolsonaro a ter boa biografia. E já se começa, felizmente, a entender a necessidade. Desesperado com o massacre eleitoral que Fernando Haddad sofreu no domingo passado, o PT hipócrita e malandramente procura em vão criar uma “frente democrática” contra o capitão da reserva. Mas algo parecido com uma frente democrática começou mesmo a se formar foi em torno da candidatura de Bolsonaro. Afinal de contas, ao contrário do que trombeteavam os petistas e assemelhados, ele conseguiu eleger, além de quatro senadores, 52 deputados do PSL, a segunda bancada da Câmara, e candidatos do seu partido obtiveram votações impressionantes país afora — dado tão relevante quanto a própria vitória do presidenciável no primeiro turno e a que se avizinha no derradeiro. Ou seja, vai conseguir governar, sim, desde que não tropece nas próprias pernas e evite ao máximo as caneladas de Hamilton Mourão e companhia.

A frente que não ousa dizer o seu nome é composta por políticos que, tal como Petrarca em relação a Laura, são atraídos como borboletas para a luz solar (não se queimem, borboletas) e por personalidades respeitáveis das áreas jurídica, econômica, militar e de movimentos cívicos que superaram a desconfiança das intenções de Bolsonaro. O antipetismo não é a única razão de ser dessa frente, embora permaneça amálgama. Quem está se juntando ao capitão para erguer um plano de governo, acha que ele não representa ameaça à democracia, apesar do discurso truculento (do qual, aliás, já tenta afastar-se). Pode-se, ora veja só, fortalecê-la por meio de Bolsonaro, desde que se tenha êxito na tarefa de descriminalizar a política, com o fim do toma lá da cá. O fortalecimento da democracia passa também pela descriminalização do cotidiano, com a libertação dos cidadãos do jugo dos bandidos, e a descriminalização do capitalismo criador de riquezas e oportunidades, por meio da diminuição de um Estado gigante, ineficiente e clientelista.

É o que espera a maior parte dos brasileiros que votarão em Bolsonaro. Eles não são “bolsonaristas”. Somente olharam para os lados e não viram mais ninguém capaz de impedir um presidiário corrupto e lavador de dinheiro de assumir o poder. Não confiaram em outro nome capaz de represar a podridão geral e criar uma ponte para o presente. Não viram outro símbolo anti-establishment, que é coisa diferente de “Mito”. Se os cidadãos responsáveis ajudarem Bolsonaro a “governar pelo exemplo”, para usar uma expressão do candidato, talvez tenhamos nomes palatáveis em quem votar daqui a quatro anos. Ajudar não significa aprovar todas as ações do seu governo, concordar integralmente com as suas opiniões, achar graça na sua vulgaridade, chancelar os seus preconceitos ou ser complacente com a fauna radical, oportunista e folclórica que surgiu no vácuo do símbolo. Significa contribuir para alguns consensos em nome do bem geral. E vigiar. Como acontece com qualquer governante democrático, Bolsonaro precisa de oposição e de imprensa independente no seu cangote – ou no seu Twitter. Nos limites do jornalismo, vou ajudar fiscalizando e criticando posições ou atitudes que julgar impróprias. Mas sem agenda oculta. “A utilidade da história está em dar valor à hora presente e à sua tarefa”. Emerson, de novo. A chance dada a Bolsonaro pode ser a nossa chance como país.

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