Geraldo Magela/Agência SenadoLira e Pacheco na posse de Lula: poder de barganha

O jogo começou

As vitórias de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco no Congresso são um alívio para o STF e obrigarão Lula a entregar os terrenos na Lua que prometeu
03.02.23

No primeiro dia de trabalho oficial do novo Congresso, o deputado alagoano Arthur Lira (PP) foi reeleito presidente da Câmara dos Deputados com uma votação nunca vista desde que a Casa passou a ter o atual número de parlamentares, 513. Lira obteve 464 votos, distribuídos entre 21 partidos. No mesmo dia, no senado, o mineiro Rodrigo Pacheco (PSD) também garantiu a reeleição, mas com um placar mais apertado. Ele teve 49 dos 81 votos. Os dois resultados foram favoráveis para o governo, mas isso não significa que Lula conseguirá aprovar sem percalços todos os seus projetos e emendas à Constituição.

A estrondosa votação de Lira na Câmara indica que, qualquer que seja a pauta, o governo terá de negociar muito com o Centrão. O alagoano, que há dois anos teve 302 votos na disputa da liderança da casa, agora teve 464, o que lhe dará um poder de barganha muito maior nas conversas com o Executivo. No seu grupo de apoiadores estão desde petistas a bolsonaristas do PL, na outra ponta do espectro político. O poderio ampliado de Lira foi o resultado de intensas negociações, que começaram ainda em novembro e envolveram a distribuição de cargos e benefícios diversos, além do desejo dos deputados de dar proeminência à Casa onde legislam.

A dimensão da votação obtida por Lira só pode ser explicada no contexto de manter a relevância da Câmara tanto na construção do Orçamento quanto na participação da formulação das principais políticas públicas”, escreve o cientista político Leonardo Barreto, em um artigo para esta Crusoé. “Trata-se de um recado e tanto para Lula, de que é necessário reconhecer o presidente da Câmara como o coabitante do centro decisório e de que o retorno do presidencialismo de coalizão será um pouco mais desfavorável do que era na primeira passagem do PT pela Presidência, isto é, além de ceder espaços, terá que dividir a mesa grande das decisões com interlocutores do Legislativo.”

No discurso após a vitória, o deputado, líder inconteste do Centrão e um dos arquitetos do orçamento secreto, chamou a democracia brasileira de “madura” e afirmou que o resultado “é a demonstração concreta de que, na boa política, é possível divergir, debater, mas ao final, construir consensos, decidir e atuar, sempre em prol do Brasil.”

Com Lira e a Câmara empoderados, Lula terá de negociar a cada nova agenda a ser enviada para a Câmara, seja para passar a reforma tributária ou a criação de uma âncora fiscal para substituir o teto de gastos. O presidente, assim, ficará refém do Centrão, que terá um enorme poder de barganha para pedir cargos e emendas. Uma demonstração desse poder foi dada nesta semana, quando Lira emplacou um de seus apadrinhados políticos, Jhonatan de Jesus (Republicanos-RR), como ministro no Tribunal de Contas da União. Com 39 anos, o afilhado de Lira deverá ficar no cargo, pelas regras atuais, até 2059.

No Senado, a vitória de Pacheco foi mais apertada. Dois dias antes, bolsonaristas começaram a fazer campanha ativa nas redes sociais e a anunciar que contavam os votos necessários para virar o placar, elegendo Roberto Marinho (PL-RN) para a presidência da Casa. Na quarta, a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro circulou pelo salão azul para pedir votos ao candidato apoiado por seu marido, Jair Bolsonaro. Antes da votação, o terceiro candidato à presidência do Senado, o cearense Eduardo Girão (Podemos), fez um discurso de 15 minutos para, ao fim, abrir mão de sua candidatura e apoiar Marinho. Do lado oposto, Pacheco confessou que estava “queimando gordura” para vencer.

A apuração foi tensa. Os 81 votos escritos e secretos, lidos um a um em voz alta, mostraram uma disputa mais apertada que o esperado. Nos primeiros 10 votos, a parcial mostrava 5×5. O resultado final (49 para Pacheco, 32 para Marinho) ficou abaixo do que o Planalto esperava para seu candidato (entre 51 e 55 votos) e abaixo também do que os bolsonaristas esperavam de Marinho (um site montado por apoiadores contabilizou 38 votos).

O senador do PL não levou, mas cacifou-se como um dos nomes mais fortes da oposição, já que tem um largo histórico de embates com o PT. “Tenho certeza de que saímos mais fortes deste processo e que conseguimos fazer com que o presidente do Senado saísse da inércia, prometendo ações de defesa do Parlamento”, escreveu Marinho nas redes sociais depois de ter perdido. O esforço do poder Executivo em garantir o apoio a Pacheco será cobrado em forma de cargos e espaço na Esplanada — são terrenos na Lua que Lula, o corretor, agora terá de garantir.

No Supremo Tribunal Federal, a situação é de duplo alívio. A Suprema Corte nunca se alinhou com Arthur Lira (para isso, basta lembrar as dificuldades do STF em acabar com as emendas de relator), mas o clima ficou mais calmo depois que o presidente da Câmara na abertura do ano do Congresso chamou os Atos de 8 de janeiro de “agressões covardes à democracia”.

A vitória de Pacheco no Senado teve um significado ainda mais potente. Uma hipotética presidência de Marinho traria, pela primeira vez, a ameaça de pedidos de impeachment de ministros do STF. “Não há Parlamento livre e representativo quando existe — e, claramente, isso existe — desequilíbrio entre os Poderes”, disse Marinho em seu discurso na quarta (1).

Ao final de tanta emoção, o resultado permanece o mesmo — Lira e Pacheco não saem de suas cadeiras, assim como Davi Alcolumbre (União-AP), que deve se manter na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. O governo e o STF comemoraram o resultado, e os brasileiros assistirão a muito toma lá dá cá nos próximos dois anos.

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  1. Sem meios termos o Nero que toca LIRA e o CAPAcheco da nova Roma incendiada em lixo putrefato pela pior politicalha de nossa triste estória de fábulas esopanas são o real e fiel retrato de um povo insano a nadar em ódio, ignorância e estupidez e afirmo sem receio que felizes nós os idosos que podemos morrer sofrendo menos pois esta escória ladravaz genocida destruirá rapidamente o país rico onde tem tudo.

  2. Nunca houve neste país um congresso tão omisso e irresponsável Brasília se tornou uma casta de indivíduos que só lutam pelo seu bem estar e de sua “família” Os interesses do povo não existem Só advogam para seus bolsos Corrupção ( ativa ou passiva) e o combustível desta cidade Sempre seremos subdesenvolvidos, infelizmente. Vejam o CV destes indivíduos que nos comandam

  3. O centrão venceu. O executivo sabe muito bem lidar com esse tipo de parlamento, vide Mensalão e petrolão. O Brasil perdeu, como hábito.

  4. Esses movimentos políticos escancararam a necessidade de ações cívicas independentes para conscientizar os eleitores. Nota-se claramente que a maioria não se preocupa com a qualidade do nosso parlamento. Basta dar uma olhada nos parlamentares mais votados nesse último pleito. O povo precisa ser melhor instruído e conscientizado acerca da importância de seu voto. Tem muita gente passando procuração em branco sem saber o real alcance desse ato. Votam em qualquer um. Votam mal, esperando coisa boa.

    1. Faz parte da educacao do povo. Nao é mera coincidencia o analfabetis mo reinante.

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