Professor Levitsky e os seus
conselhos fantásticos

26.10.18

Não tive tempo — ou paciência — de aprofundar-me no pontificado do cientista político namericano Steven Levitsky sobre a causa mortis das democracias.

A mídia jornalística tem dado bastante trela ao professor e suas ideias. Fica quase impossível não deparar com entrevista ou resenha de livro seu — em especial “Como as Democracias Morrem”, escrito juntamente com Daniel Ziblatt e publicado neste ano.

Da familiaridade (confesso, superficial) que adquiri de tais fontes, ficou-me a percepção de que o argumento central de Levitsky é que regimes democráticos não são necessariamente desmanchados por golpes militares ou revoluções sangrentas. Podem também erodir-se mediante os próprios instrumentos da democracia.

Não me parece hipótese particularmente nova. O século XX dela nos oferece muitos e lamentáveis exemplos.

Mas o que me tem chamado a atenção em especial é a maneira com que Levitsky busca aterrisar algumas dessas teses no presente cenário político-eleitoral brasileiro.

Boa amostra de tal tentativa é um texto veiculado pela Folha de S.Paulo, na semana passada, sob o titulo “A hora e a vez dos democratas do Brasil”.

Levitsky assina o artigo com um pesquisador chamado Fernando Bizzarro. O sobrenome do coautor grafa-se com dois “Z”. Já o teor da peça opinativa, com um só.

Ao consultar a sua bola de cristal, Levitsky profetiza que se o PT for derrotado no segundo turno da eleição presidencial, “o Brasil vai ficar mais parecido com a Venezuela”. Sim, você leu direito. Para o professor, é na derrota do petismo que o Brasil pode trilhar a vereda maduro-chavista.

Adiante em seu artigo, Levitsky pede ao PT que “faça concessões”, e “reconheça erros”, além de “abandonar suas propostas para regular a mídia”

Levitsky aconselha a agremiação a “demonstrar seu comprometimento com o império da lei”. Ao contrário do que pregam abertamente tanto a presidenta do PT quanto a candidata a vice-presidenta da República, admoesta a legenda a “assegurar que não haverá indulto para Lula”.

O professor recomenda também que o candidato do PT “nomeie imediatamente um Ministro da Justiça independente e respeitado, e apresente uma lista de figuras com qualidades similares para ocupar os assentos que vão vagar no STF durante o próximo governo.”

Bem vai aqui uma dica: o juiz Sergio Moro. Aliás, gestos nesse sentido foram dados. O candidato do PT reconhece em entrevista na TV que Moro e a Lava Jato fizeram “um bom trabalho” e “ajudaram o país”. Pouco importa que o padrinho do candidato (“Lula é Haddad, Haddad é Lula”) ache que o potencial titular da pasta da Justiça tenha uma “mente doentia”.

O professor conclama o candidato do partido a mostrar “seu compromisso com a economia”. Aponta que, para tanto, “Haddad terá que deixar de lado o programa econômico do PT”. Deve assim “nomear imediatamente alguém respeitado à direita e à esquerda para seu Ministério da Fazenda”. Ou seja, quer “chamar o Meirelles” ou reconvocar o Joaquim Levy. Em uma palavra: incrível!

Outra sugestão de Levitsky e Bizzarro para Haddad: “É fundamental que Lula e os outros líderes do PT se comprometam publicamente com essas medidas”. Assevera que “o compromisso de todos, incluído o de Lula, deve ser público, no papel, e acompanhado das assinaturas de todos os líderes do PT. E, grand finale: “esses ‘sacrifícios’ são especialmente vitais para o PT”.

Ao terminar de ler o artigo, restou-me uma certeza. Caso as democracias morram ou gozem de vida eterna, Levitsky tem futuro garantido na ficção. Ele dispõe de credenciais para a fundação mesmo de uma nova escola literária — o “irrealismo fantástico”.

Já no campo da consultoria em estratégia político-eleitoral, uma carreira para Levitsky está descartada. O professor deve convite formal a Cid Gomes e Mano Brown para que profiram aulas-magnas em Harvard. Tema sugerido: “a importância de um sentido mínimo de realidade”.

É mais fácil uma hiena tornar-se vegetariana do que o PT acolher as sugestões de Levitsky.

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