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Jucá não põe a mão no fogo por Temer

Líder de todos os governos, inclusive o atual, o senador rateia ao falar sobre suspeitas de corrupção envolvendo o presidente. Ele critica a Lava Jato, diz que o Supremo é refém da opinião pública e tenta, sem sucesso, reescrever a célebre frase em que disse ser preciso “estancar a sangria” das investigações
18.05.18

Os políticos de Brasília andam encabulados. Na última terça-feira, o presidente Michel Temer fez uma cerimônia para marcar os dois anos de seu governo e os presidentes da Câmara e do Senado não apareceram. Outros aliados também ignoraram o convite para o convescote no Planalto. Não são apenas sintomas da debilidade de um governo perto do fim, comandado pelo presidente mais impopular da história. Há um clima de desconfiança no ar. Até parceiros mais próximos já farejam que Temer, alvo de dois inquéritos em curso no Supremo, poderá em breve ser colhido por novas descobertas da Lava Jato. É uma aposta. Mas, na dúvida, os mais ariscos preferem o cuidado de se manter à distância. É o jogo da sobrevivência na política. Nesse cenário, ninguém poderia supor, por exemplo, que o senador emedebista Romero Jucá, líder de todos os governos desde Fernando Henrique e atual líder do governo Temer no Senado, não seria capaz de se atirar na frente do presidente para defendê-lo.

Na entrevista que Crusoé apresenta a seguir, Jucá foi perguntado se poria a mão no fogo por Temer. A hesitação dá a medida da resposta e do ambiente reinante: não. “Eu não conheço a Operação Scala”, diz, referindo-se à investigação sobre corrupção no Porto de Santos, de que o presidente é alvo. Jucá demonstra baixa confiança também na capacidade de Temer de escapar de uma eventual nova denúncia. Arqui-investigado na Lava-Jato e a caminho de mais uma campanha à reeleição por Roraima, o senador de 63 anos critica a operação e tenta reescrever a célebre frase, gravada, na qual defendeu a necessidade de “estancar a sangria” das investigações e costurar um “acordo nacional”. Repete, com outras palavras, o que disse recentemente a um banqueiro, sobre a possibilidade de um aventureiro se eleger presidente este ano. “Se der problema, a gente tira”, afirmou na ocasião, rabiscando um papel sobre a mesa. “Qualquer um que ganhe a eleição com discursos contra a política e contra o Congresso vai ter muita dificuldade de governar”, diz agora. Jucá jura que não é corrupto. Eis a entrevista:

O que os políticos aprenderam com a Lava Jato?
O processo ficou mais transparente. Tínhamos muita doação de empresa. As campanhas tinham uma crescente de despesas que estava ficando insustentável. A Lava Jato teve o condão de cortar essas despesas. A gente aprovou uma lei com tempo mais curto de campanha e gastos menores. Acho que os partidos e políticos que souberam ler a realidade brasileira aprenderam com essa questão. Se você me perguntar se todos os políticos aprenderam, eu respondo que não. Mas quem sobreviver tem que ter aprendido essa lição dura.

O senhor aprendeu?
Para mim, não altera em nada os meus procedimentos. Continuo líder do governo, continuo discutindo textos de medida provisória e de projeto de lei, continuo recebendo todos os setores que me procuram. Trabalhadores, empresários, instituições públicas, sindicatos. A minha postura não mudou. Doação oficial recebida é doação oficial. O que mudou? Não pode mais ter doação de empresa. Nós não vamos receber, então, doação de empresa. Vamos receber através de pessoa física ou recursos públicos.

Assustou-se com a prisão de Lula?
Pessoalmente, lamento muito. É algo que ninguém gostaria de ter visto. O processo mostrou em tese que a Justiça está funcionando para todo mundo, mesmo com os excessos que eu vejo. E é um dado que a partir de agora faz parte da história brasileira e tem que ser levado em conta. Mas é uma surpresa? Não, porque em outros países ex-presidentes foram presos. Na Coréia e no Peru tem ex-presidentes presos.

Para quem é investigado, como o senhor, qual é o sentimento de ver políticos proeminentes, como Lula, e colegas de partido, como Geddel Vieira Lima e Eduardo Cunha, serem presos?
Quem é investigado quer que a investigação siga logo para poder provar que não tem culpa.

Não dá medo de ser preso também?
Não. No meu caso eu quero rapidez na investigação. Três inquéritos já foram arquivados. São oito, porque o (Rodrigo) Janot abria investigação por qualquer coisa. Era aquele negócio de atirar antes e perguntar depois. Podia questionar, podia pedir explicação, não? Mas a prática dele era essa. Fazer volume.

Com a nova procuradora-geral, Raquel Dodge, as coisas mudaram?
Acho que ela herdou uma herança de abuso do Janot. Ela é a promotora chefe. Então tem que conduzir isso tudo, e conduzir com cuidado. Não pode simplesmente arquivar tudo porque tem que investigar e, no final, dizer o que foi abuso do Janot e o que é verdade. Ela está tendo uma postura equilibrada. Não cria factoide. As coisas não vazam, diferentemente do que acontecia com o Janot.

A PGR tem levado adiante as investigações sobre o presidente Temer. Na Operação Scala, por exemplo, amigos do presidente chegaram a ser presos.
O Ministério Público tem o estilo dele de trabalhar. Aí não é a Raquel, são os investigadores embaixo que têm autonomia para fazer investigação. Ela não está tutelando a investigação. A atuação do Ministério Público está mais firme e mais justa.

Com Temer: amigos e correligionários, é verdade, mas tudo tem limite (Beto Barata/PR)
O senhor poria a mão no fogo pelo presidente Michel Temer?
Olha, eu não conheço a operação Scala. Pelo que a gente sabe, na questão dos portos, a Rodrimar não foi beneficiada e portanto não teria cabimento esse tipo de acusação. As outras coisas (investigações contra Temer), eu não conheço.

A base governista já espera uma terceira denúncia contra o presidente?
Não sei se virá. Uma terceira denúncia a esta altura do campeonato seria um desserviço ao país. Porque estamos próximos de uma eleição. O Michel daqui a oito meses pode ser investigado pelo que quiserem. Acho que o país não merece mais o tumulto que pode acontecer com a terceira denúncia.

Mas Temer sobreviveria a uma terceira denúncia?
Tem que esperar. Não adianta fazer conjectura. Vai depender da Câmara dos Deputados.

Seria uma situação diferente das primeiras denúncias?
Tem que esperar para ver o que é a terceira denúncia. É sobre o quê? Tem que aguardar.

Depois da prisão de Lula, é esperado que a Lava Jato avance sobre outros partidos. Isso preocupa?
A prisão do Lula se deu após condenação em segunda instância e foi sustentada legalmente pelo STF. É diferente de quem não está nem na primeira instância ainda. Não vejo essa preocupação de prender (políticos de) outros partidos para ter uma salada de frutas na cadeia. Acho que não é por aí que vai se fazer justiça. Se começam a escolher e verificar como vão equilibrar (politicamente), perdem a noção.

Causou surpresa o Supremo ter tornado o senador Aécio Neves réu?
Acho que ia receber (a denúncia) mesmo. A Primeira Turma está recebendo (as denúncias) de todo mundo. Já a Segunda Turma está olhando o mérito.

O senhor, como outros políticos, considera a Segunda Turma melhor, então?
Fiz um comentário técnico. A Primeira Turma olha a questão formal e não entra no mérito. (Não examina) Se a denúncia tem prova, se tem o mínimo de indícios comprováveis. Portanto já define que (o investigado) tem que responder à denúncia. Já a Segunda Turma está analisando os indícios de provas e entrando mais no mérito. Entrou, por exemplo, na questão de mérito quando o (ministro Edson) Fachin pediu para arquivar aquela minha questão com a Gerdau (refere-se à denúncia promovida contra ele e o empresário Jorge Gerdau pelo Ministério Público em 2017. A acusação era de que o senador vendeu medidas provisórias em troca de propina). É uma palhaçada aquilo. Nunca vendi uma medida provisória aqui. Sou líder do governo. Tenho que receber todo mundo. Esse é meu trabalho.

Com Dilma: de líder a articulador do impeachment (Divulgação)
Naquela famosa gravação feita por Sérgio Machado, o senhor falou que era chegada a hora do grande acordo nacional, “com o Supremo, com tudo”. Não deu certo?
Essa frase foi deturpada. Eu estava falando sobre o impeachment da Dilma e estava dizendo que tinha que estancar a sangria porque ela estava acabando com o país, com a economia. Estava um desastre. E disse que para fazer o impeachment tinha que haver um entendimento nacional e que esse entendimento tinha que ser do Legislativo e do Judiciário, que o Supremo tinha que participar desse entendimento porque, se não, o Supremo barraria o impeachment. Era essa a frase “Com o Supremo, com tudo’. Não era questão de investigação, mesmo porque não estava no Supremo ainda. Era uma coisa muito prematura.

Não tem acordão com o Supremo?
O STF deixou prender Lula. Então não tem acordo com o Supremo sobre a Lava Jato. Jamais teria. O ministro na época dessa frase era o ministro Teori (Zavascki). Era um ministro firme, focado.

E a “sangria” que o senhor disse que precisava ser estancada?
Sangria era o governo da Dilma que precisava ser estancado. E não era só eu que usava esse termo. Outros senadores também usavam. Diziam que o governo estava sangrando, que era uma sangria desatada. Virou um bordão errado.

O senhor foi líder de todos os presidentes desde 1995.
Eu trabalho muito. Tenho uma visão operacional muito grande. Me dou bem com todos os colegas e não mudei meu jeito de pensar. Quando vi que estava sendo violentado, no governo da Dilma, saí da liderança, fui para a oposição e anunciei a crise econômica que viria. Eu disse que apoiava o Aécio porque a Dilma estava errando na economia e tudo o mais.

Quem vai ser o próximo presidente?
Vai ser o (Henrique) Meirelles. É a opção equilibrada para levar o Brasil adiante. A população vai ver isso durante a campanha. Espero que até julho Meirelles esteja bem nas pesquisas, indicando um crescimento sustentável.

Em conversa recente com representantes do mercado financeiro, o senhor disse que, se Bolsonaro for eleito, provavelmente não concluirá o mandato. É uma premonição?
O que eu disse é que qualquer um que ganhe a eleição com discursos contra a política e contra o Congresso vai ter muita dificuldade de governar. O presidente que assumir tem dois desafios imensos logo no começo. Primeiro, aprovar a reforma da Previdência, para não comprometer a questão fiscal. Segundo, aprovar o crédito especial para resolver o problema da regra de ouro (regra constitucional que determina que as operações de crédito da União não podem ser maiores que as despesas de capital). Se o novo presidente não resolver isso, ficará dando pedalada e não terá recurso para governar. Então, se alguém se elege xingando o Congresso, não vai ter ambiente aqui para aprovar nada. Não adianta querer entrar nessa onda de parte da imprensa de criminalizar a política porque é a política que vai dar condição de o próximo presidente governar.

Bolsonaro seria uma aventura, em sua opinião?
Qualquer nome que quebre a estrutura política é uma aventura. Veja que não digo que modifica a estrutura política. Digo que um nome que quebra a estrutura política é passível de ser uma aventura porque não vai ter condição de governar depois. Quem fizer campanha contra o Congresso, contra os partidos, contra a política, depois vai ter que conviver com o Congresso, com os partidos e com a política para governar. Se não levar tudo isso em conta é um aventureiro e vai estar criando um processo de alto risco. E isso faz o país regredir.

Com Lula e outros protagonistas do petrolão: a lealdade depende das circunstâncias (Marcos Oliveira/Agência Senado)
Na condição de ex-aliado, como enxerga a insistência de setores do PT em torno da candidatura de Lula, que está preso?
A candidatura de Lula está inviabilizada pela Lei da Ficha Limpa. Por mais que o PT queira insistir, por uma questão de marketing eleitoral, a candidatura do Lula não será viável no final das contas.

O senhor é acusado de ser corrupto. O que diz disso?
Eu não sou corrupto. Até agora não foi provado nada contra mim. Pelo contrário, três processos já foram arquivados. Continuo tranquilo.

O Ministério Público diz que o senhor é corrupto.
Isso foi coisa do Janot, que é um irresponsável. Primeiro, acusou que estávamos querendo obstruir a Justiça e parar a Lava Jato. Ele mesmo teve que engolir a poeira dessa acusação leviana. Antes de sair, para não ficar feio e ser desmoralizado pela Procuradoria-Geral, pediu para arquivar (refere-se ao pedido de arquivamento de Janot da investigação por obstrução de Justiça que ele abriu contra Jucá, o senador Renan Calheiros e o ex-presidente José Sarney). Para você ver o nível do cara. Ele pede para prender e depois pede para arquivar. Se eu tivesse sido preso, quem é que ia pagar? Esse tipo de ato irresponsável tem que ser coibido. Não é agora. Tem que se aprovar a lei de abuso de autoridade e tem que colocar limite. Mas não é agora porque vão dizer que quer parar a Lava Jato. Quando terminar a Lava Jato vamos ter que analisar os prós e os contras e criar um procedimento.

O senhor enriqueceu na política?
Não enriqueci na política.

Embora seu patrimônio declarado em 2010 seja de 607 mil reais, recentemente o senhor gastou meio milhão só em móveis para um closet e uma cozinha gourmet. Não é estranho?
Aquilo foi meu filho que comprou.

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