LeandroNarloch

O preço do Acordo de Paris

30.11.18

A França está vivendo sua versão da greve dos caminhoneiros. Os “coletes amarelos” sentem que abandonar o petróleo tem seu preço – e não estão dispostos a pagar. O protesto dos últimos dias é contra Macron, contra o ambientalismo – e 73% dos franceses o apoiam.

O presidente francês criou uma taxa sobre os combustíveis para financiar a substituição do petróleo por energias limpas. Sonha em fazer da França o país que mais cumpre as metas do Acordo de Paris, o compromisso internacional de reduzir as emissões de carbono para evitar que a Terra esquente mais de 2 graus Celsius.

Estou com os “coletes amarelos”. Há muitos motivos para discordar do bom-mocismo ambientalista de Macron – o preço dos combustíveis é só o mais óbvio deles. Não dá para ter certeza de que o Acordo de Paris é necessário nem se será eficaz, na remota possibilidade de todos os países cumprirem as metas que se propuseram.

Não faz sentido se sacrificar hoje para evitar um apocalipse que ninguém tem certeza que vai acontecer. O Acordo de Paris se baseia na previsão do IPCC de que, se a concentração de carbono na atmosfera dobrar, a temperatura da Terra subirá de 1,5 a 4,5 graus. Um estudo publicado na revista Nature em janeiro dá uma estimativa mais estreita para essa sensibilidade climática. Prevê que a Terra esquentaria entre 2,2 e 3,4 graus – provavelmente 2,8 graus. Ou seja: no pior cenário, o aquecimento não será tão intenso quanto se imaginava.

Mas digamos que os países que assinaram o Acordo de Paris atinjam as metas e cortem o carbono da dieta. Só o Brasil prometeu reduzir as emissões em 37% até 2025 (pura piada; difícil acreditar que o país poluirá menos se sair da crise e enriquecer). Mesmo nesse caso improvável, não há garantia de que o esforço terá algum efeito contra o aquecimento global. Outro estudo, este do MIT, publicado em 2015, concluiu o seguinte: se os países cumprirem suas promessas e as mantiverem até o ano 2100, cortariam só 0,2 graus do aquecimento do planeta. Em vez, por exemplo, de esquentar 3 graus, a Terra esquentaria 2,8 graus – que diferença!

De um lado, o acordo de Paris talvez não seja necessário; de outro, está longe de ser suficiente.

Há questões demais a se debater antes de impor os sacrifícios que Macron defende. Mesmo a ideia de trocar o petróleo por biocombustíveis é questionável. Antes da popularização do petróleo, há pouco mais de um século, produzir combustível significava queimar lenha e gordura de animais. Para cozinhar ou iluminar era preciso avançar sobre florestas ou baleias – cujo óleo alimentou lampiões de São Paulo e do Rio de Janeiro. O petróleo salvou baleias da extinção e liberou campos para o cultivo de comida, e não para matéria-prima de combustíveis, como soja ou palma.

Usar campos agrícolas para a produção de biodiesel é uma volta ao passado. “Nem Jonathan Swift”, diz Matt Ridley em O Otimista Racional, “teria coragem de escrever uma sátira em que políticos argumentavam – num mundo em que espécies estão desaparecendo e mais de 1 bilhão de pessoas mal conseguem comer – que seria bom para o planeta derrubar florestas para plantar palma ou trocar plantações de comida para produzir biodiesel simplesmente para as pessoas poderem queimar carboidratos em vez de hidrocarbonetos no carro.”

Macron ainda prometeu esta semana cortar pela metade o uso de energia nuclear na França – atitude que, segundo o New York Times, causou indiferença nos manifestantes. A França é o país que mais depende de energia nuclear, justamente o tipo de energia que menos contribui para o aquecimento global, pois não emite carbono na atmosfera. Vai entender a cabeça do presidente francês.

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