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O sensacionalismo “do bem”
prepara o bote

28.12.18
Leandro Narloch

Sensacionalismo costuma ser coisa da direita. Sua aparência é a dos apresentadores de programas policiais metidos em colarinhos apertados que se esforçam para parecer severos e intolerantes com a bandidagem. Mas há um sensacionalismo de esquerda que ainda não foi bem caracterizado – e que será uma arma politicamente correta em 2019.

É o sensacionalismo “do bem”. Se a versão da direita tenta nos assustar com os crimes urbanos, tomando o ladrão de galinhas como assassino sem escrúpulos, o sensacionalismo verde ou de esquerda tenta nos fazer acreditar que iniciativas honestas de ganhar dinheiro ou de modernizar as leis são atentados de psicopatas contra os trabalhadores ou contra a “mãe natureza” em geral.

Para os sensacionalistas politicamente corretos, reforma da lei trabalhista é “extinção dos direitos dos brasileiros”. Trabalho ruim (mas feito por escolha livre e voluntária) é “situação análoga à escravidão”. Qualquer tentativa de mineração na Amazônia desperta a suspeita de uma trama perversa de grandes empresas prontas para tratorar a floresta.

Contra Temer, a estratégia deu certo. Em setembro de 2017, o presidente extinguiu a Renca (Reserva Nacional de Cobre e seus Associados), entre o Pará e o Amapá. A ideia era liberar a mineração (que precisa seguir normas de sustentabilidade e impacto ambiental) sem mudar o status legal das reservas florestais daquele território. Mas a atitude provocou uma histeria politicamente correta que contou até com a modelo Gisele Bündchen. E Temer acabou voltando atrás.

Em 2019, se fizer o que promete, Jair Bolsonaro dará muitos motivos para bons mocinhos exalarem indignação no Facebook. Quando tentar reformar a Previdência, privatizar, mudar regras ambientais e de mineração, seus opositores apelarão ao sensacionalismo politicamente correto para combatê-lo.

Será o caso do projeto de lei 6.299, apelidado pelos sensacionalistas verdes de “PL do Veneno”, que prevê agilizar a análise de riscos (não é exatamente a aprovação) de defensivos agrícolas. Há hoje pesticidas mais modernos e menos nocivos que os do mercado – mas não podem ser utilizados porque esperam há quase uma década pela aprovação do governo. O projeto deve voltar à pauta do Congresso nos próximos meses – e, mais uma vez, os ambientalistas dirão que “os deputados querem colocar mais agrotóxico no prato dos brasileiros”.

Repare a potência dramática dessa imagem: mais veneno no prato dos brasileiros. Essa nem o Datena teria coragem de sustentar na TV.

Esse sensacionalismo politicamente correto será eficaz contra Bolsonaro como foi contra Temer? A sinalização de virtude no Facebook vai alcançar as ruas, provocando um novo Junho de 2013?

Prefiro acreditar que não. Pelo menos no primeiro ano de mandato, Bolsonaro terá a benevolência dos seguidores e eleitores – benevolência que pode durar mais se a economia desatolar e o dinheiro voltar ao bolso das famílias. E Bolsonaro é um caso curioso: sua força não vem exatamente de suas qualidades, mas de sua capacidade de incomodar a esquerda rica, urbana e de nariz empinado.

O sensacionalismo politicamente correto não deve alcançar as ruas, mas influenciará a opinião pública e as decisões dos ministros do STF. Por isso não convém desdenhá-lo ou deixar de combater suas narrativas.

Leandro Narloch é jornalista. Escreveu, entre outros livros, o Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil.

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