Adriano Machado/Crusoé

Ele vai voltar?

Renan Calheiros se movimenta para assumir pela quarta vez a cadeira de presidente do Senado e aposta no voto secreto para driblar as resistências dos colegas que temem a reação dos eleitores que querem a renovação
18.01.19

Há tempos não se via uma eleição tão imprevisível no Senado. O número recorde de partidos representados na Casa (21) somado à maior renovação de sua história (haverá 47 novos senadores na nova legislatura) e ao pesado jogo de Renan Calheiros para presidi-la novamente faz com que qualquer previsão feita hoje tenha uma enorme possibilidade de erro. Há, porém, algumas poucas certezas que deverão ser determinantes para o resultado da votação, marcada para as 18 horas do dia 1º de fevereiro.

Uma dessas certezas é que Renan, hoje, está na frente, mas seu favoritismo vem sendo colocado em xeque pelo aumento da pressão contra ele nas redes sociais e também pela intensificação das articulações internas contra seu nome.

A estratégia de Renan, um dos poucos remanescentes entre os grandes caciques que dominaram Brasília nas últimas décadas, é dúbia. Ele se coloca como garantidor da independência da Casa, mas na verdade tenta, cada vez mais, atrair a confiança do governo Bolsonaro. Mais especificamente do ministro da Economia, Paulo Guedes, e dos entusiastas de sua agenda liberal.

Nesta semana, por exemplo, Renan postou em sua conta no Twitter: “O ministro Paulo Guedes tem razão: o controle e a transparência do gasto público tem que haver sempre. Eis a nossa convergência”. Também vende a ideia de que conversa frequentemente com Guedes. No privado, porém, apresenta-se aos colegas como o único capaz de barrar a agenda do outro homem forte de Jair Bolsonaro, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro.

Para se viabilizar, contudo, a primeira disputa de Renan será dentro da bancada de 12 senadores do MDB. Dali sairá o nome do candidato da legenda que, por ter a maior bancada da próxima legislatura, pode reivindicar, pela tradição, o direito de indicar o presidente. Ocorre que Renan, por todo o seu histórico de suspeitas de corrupção (contra ele há 12 inquéritos e duas denúncias tramitando no Supremo Tribunal Federal) e alianças com todos os governos, sejam eles quem forem, está longe de ser uma unanimidade. Inclusive dentro de seu próprio partido, que deve fazer uma consulta interna em sua bancada para definir quem sairá candidato.

A atual líder do MDB no Senado, Simone Tebet, tenta convencer os correligionários de que ela é o melhor nome na disputa e que, se o partido optar por Renan, pode perder e ficar sem o único espaço de poder que lhe resta hoje na Esplanada. A bancada está dividida. Quem é mais próximo ao petismo está com Renan. Quem é mais próximo a Jair Bolsonaro está com Simone. As bolsas de apostas ora apontam empate, ora um 7 a 5 para Renan, ora um 7 a 5 para Simone.

Se Simone Tebet sair vitoriosa, suas chances de crescer no plenário são grandes porque ela pode aglutinar as outras candidaturas que estão colocadas para enfrentar Renan. Há, por exemplo, um acordo tácito entre ela e o senador Tasso Jereissati, do PSDB. Ele prometeu desistir da disputa caso Simone consiga bater Renan no duelo interno no MDB.

André Dusek / EstadãoAndré Dusek / EstadãoSimone Tebet quer derrubar o correligionário antes, na bancada do MDB
Também há a avaliação de que o candidato preferido do governo, Davi Alcolumbre, do DEM, se enfraqueceria contra a senadora porque o Senado não entregaria as duas casas do Congresso ao partido (Rodrigo Maia é favorito para se reeleger no mesmo dia presidente da Câmara). A oposição também preferiria ficar com Simone em vez de apoiar um nome do DEM.

Por outro lado, se Renan vencer Simone na bancada, a previsão é de uma guerra sem precedentes no plenário. Para começar, a chance de judicialização é alta. Pelo regimento, Davi Alcolumbre preside a sessão por ser o integrante que restará da mesa diretora da atual legislatura. Mas surge a dúvida: ele poderá presidir a sessão sendo candidato? Renan certamente se insurgirá contra isso, uma vez que pretende levar adiante uma batalha regimental que só dará certo se tiver um aliado seu no comando da sessão — no caso, José Maranhão, o mais velho dos 81 senadores que estarão presentes.

Maranhão conduzir a sessão no dia da eleição é determinante para Renan porque, com ele, ficam reduzidas as chances de a eleição ocorrer por voto aberto. Explica-se: muito embora o presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, tenha decidido neste mês que o voto será secreto nesta eleição, a oposição a Renan pretende apresentar um questionamento a quem estiver conduzindo os trabalhos sobre a possibilidade de a votação ser aberta.

Se o presidente da Mesa for pró-Renan (no caso, José Maranhão), a tendência de ele arquivar o questionamento é alta. Se for anti-Renan (como Alcolumbre), ele deve jogar a decisão para que o plenário decida. E a avaliação é a de que o plenário, exposto ao vivo em rede nacional, não vai optar por votar secretamente. Sem voto secreto, as chances de Renan se eleger diminuem. A estimativa é de que a votação aberta tire mais de dez votos dele.

Outros questionamentos podem ser colocados em debate, como a possibilidade de a votação ser resolvida por maioria simples. O regimento é claro em muitos desses pontos (por exemplo, vence quem tiver maioria absoluta, ou seja, 41 votos), mas há uma regra tácita no Senado segundo a qual “o plenário é soberano” — ou seja, regras escritas podem ser subvertidas a partir de um acordo de líderes ou da escolha da maioria. Por isso, ter um aliado comandando os trabalhos é uma vantagem relevante para os competidores.

No cenário com Renan candidato, há três candidatos colocados para enfrentá-lo. Um é o próprio Davi Alcolumbre. Joga a seu favor o apoio do ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni. No entanto, muitos consideram que o cargo de presidente do Senado é muito maior do que ele (leia mais).

Adriano Machado/CrusoéAdriano Machado/CrusoéTasso Jereissati conta com apoiadores de peso, mas ainda não deflagrou campanha
Outro que tem chances é o tucano Tasso Jereissati, opção vista com bons olhos pelos setores mais relevantes do governo (militares e a equipe econômica). Entre os “anti-Renan”, Tasso é considerado aquele que tem mais peso político e experiência para derrotar o emedebista e, depois, comandar o Senado. A campanha do tucano, porém, é a mais tímida até agora. Enquanto Renan, Alcolumbre e Simone estão há semanas em articulações, Tasso tem sido mais comedido. Entrou em recesso no final do ano e volta a Brasília só no início da semana que vem. Para muitos, será tarde demais.

Um nome que corre por fora é o do senador Esperidião Amin, do PP, político experiente que volta ao Senado depois de 20 anos. Major Olímpio, do PSL, o partido de Bolsonaro, lançou candidatura, mas ela não é levada a sério nem mesmo entre seus correligionários.

É provável que até o dia da eleição o cenário continue incerto, mas os nomes que se apresentam para derrotar Renan contam com as mesmas redes sociais que ajudaram a eleger Jair Bolsonaro presidente, para tirar do alagoano a quarta vitória para a presidência do Senado. Ativistas pró-Bolsonaro têm lotado as caixas de mensagens dos senadores para convencê-los a não eleger Renan. Há expectativa de que os 47 novatos tragam das ruas (e das redes) o desejo de renovação.

Um elemento que poderia desequilibrar a corrida seria o apoio explícito de Jair Bolsonaro a um nome, mas o presidente teme deixar sua digital em uma campanha derrotada e debilitar sua situação no Senado, onde seu filho Flávio já murchou politicamente após seu ex-motorista aparecer envolvido em transações financeiras suspeitas. O jogo está aberto.

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