FelipeMoura Brasil

Os ataques travestidos de críticas

15.03.19

Porta-vozes informais da família Bolsonaro espalharam nas redes sociais que fui “promovido” a diretor de Jornalismo da Jovem Pan por “apoiar” Gustavo Bebianno.

Um deles, já reconhecido por mentir sobre jornalistas que não trabalham em gabinetes de parlamentares do PSL, atribuiu covardemente sua própria tese a Flávio Ricco, colunista do UOL que apenas noticiou as mudanças na direção da Pan.

Fantasiar motivações ocultas e disparar acusações baseadas nessas fantasias, emulando um jornalismo investigativo, tornaram-se expedientes comuns na internet, onde grupos de pressão disseminam narrativas alheias aos fatos, sobretudo se estes os incomodam.

A acusação contra mim é apenas um exemplo ilustrativo dessa patrulha mentirosa que a militância petista também fazia (acusando-me, por exemplo, de “racista” quando considerei que, pelo filme Moonlight, o ator Mahershala Ali, que eu havia elogiado por atuações anteriores, não merecia tanto um Oscar, que aliás considero ter merecido neste ano por Green Book, embora seja assunto para outro artigo).

Eis as premissas factuais:

  1. Em 19 de fevereiro, uma terça-feira, entrevistamos o ministro exonerado em Os Pingos Nos Is, programa do qual sou âncora;
  2. A notícia de que passei a ser Diretor de Jornalismo foi publicada quatro horas e cinco minutos após o término do programa, à meia-noite e cinco de 20 de fevereiro.
Fantasias de motivações ocultas necessárias para a acusação:

  1. A Jovem Pan seria editorialmente antibolsonarista (mesmo que alguns comentaristas de sua equipe plural, inclusive eu, tenhamos refutado dezenas de mentiras contra Bolsonaro durante a campanha e o governo, e que defendamos a reforma da Previdência e o pacote anticrime);
  2. Logo, o veículo teria recompensado com “promoção” imediata um dos jornalistas que entrevistaram o ministro exonerado pelo presidente (mesmo que os áudios da conversa do então ministro com Bolsonaro tenham sido obtidos e publicados pelo colega Augusto Nunes, que assumiu no programa a responsabilidade pela decisão).
Pronto. Foi o bastante para chover nas minhas redes o rótulo de “vendido”, lamúrias sobre “dinheiro e poder”, e psicologismos sobre “ego”, “vaidade” e “arrogância”.

Se houvesse, porém, o mínimo de preocupação jornalística por parte dos acusadores – para além da compreensão de que não se dá a ninguém o mais alto cargo de uma área de qualquer empresa em razão de um ato isolado –, teriam perguntado ao presidente da Jovem Pan quando foi que me fez a proposta; e aos sócios de O Antagonista, onde eu também trabalhava, quando foi que informei tê-la recebido e a disposição de aceitá-la.

Se estes se dessem ao trabalho de conferir as datas em suas caixas de mensagens, confirmariam que recebi a proposta em reunião de 5 de fevereiro e depois a comuniquei em 11 de fevereiro – respectivamente, oito e dois dias antes de estourar a polêmica sobre o então ministro, com um tuíte de 13 de fevereiro do filho do presidente, Carlos.

Com isso, talvez, aqueles que parecem nunca ter trabalhado na vida – posto que confundem a data da notícia sobre um novo diretor com a da proposta feita para o cargo – atinariam que existe um tempo necessário a profissionais situados (no meu caso, duas semanas) para refletir sobre uma nova oportunidade, avaliar os efeitos para sua carreira e vida familiar ou pessoal, negociar bases e diretrizes do acerto, costurar acordos com outros empregadores com os quais tinha contrato assinado e projeto estabelecido, e só então, garantida a disponibilidade, definir as cláusulas contratuais.

Mas não é de espantar que o repúdio ao jornalismo independente (que dá espaço ao contraditório, em vez de boicotá-lo por interesses políticos e ideológicos, como fazem há décadas os setores esquerdistas da imprensa e do mercado editorial) venha justamente daquelas pessoas que, avessas a qualquer esforço de trabalho jornalístico e argumentativo, tentam destruir a reputação alheia com ataques travestidos de críticas. Embora elas posem de vítimas quando são descritas ou bloqueadas nas redes, não conseguiram destruir a minha, claro.

Há dois motivos básicos:

  1. O leitor (incluindo o eleitor antipetista, lavajatista e/ou liberal em economia que votou em Bolsonaro sem fanatismo) não é idiota para se deixar persuadir por mentiras de porta-vozes informais e “jornalismo” de gabinete, nem por “opiniões” decorrentes delas, como “você errou”, “pisou na bola”, “achei muito ruim” e “ain, que decepção” – frases vazias que indicam nada mais que o incômodo de seus autores com a independência alheia. (Aqueles que expressam com todas as letras que jornalistas críticos da esquerda não deveriam dar voz a quem possa contradizer ou falar algo de negativo sobre direitistas ligados ao poder pelo menos são mais sinceros em seu reacionarismo autoritário; em sua vontade declarada de privar o público de ouvir alegações e declarações com as quais poderá concordar ou não.)
  2. Enquanto eles falseiam o debate, eu, Felipe, sem jamais garantir a honestidade de político nenhum e sempre interessado em entrevistar ministros – estejam eles no cargo ou exonerados; sejam Paulo Guedes e Sergio Moro, seja o suspeito de laranjal Marcelo Álvaro Antônio –, continuo fazendo hoje o mesmo que sempre fiz: expor e analisar os fatos disponíveis até o momento e os limites do que se pode concluir a partir deles, independentemente de quais forem os envolvidos.
Quando o PT saiu do poder, identificamos na imprensa quem criticava petistas não por repúdio moral a seus crimes, mas apenas para defender interesses tucanos ou emedebistas.

Com Bolsonaro no poder, estamos vendo na internet quem criticava petistas, tucanos e emedebistas apenas para defender interesses bolsonaristas, ou garantir credenciais ou boquinhas durante seu governo.

Felipe Moura Brasil é diretor de Jornalismo da Jovem Pan.

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