RuyGoiaba

Feliz napalm pra todos

08.11.19

Olá. Tem alguém aí? Tudo bem com vocês?

Passei uns dias — não, detratores, infelizmente não foram os dois meses de férias defendidos por Augusto Aras para a turma do MP; quem me dera — zanzando pela Europa e sendo mais um brasileirinho deslumbrado com aquela coisa curiosa que, segundo o Eça de Queiroz, fica-nos curta nas mangas: a civilização. Talvez os italianos nem sejam tão civilizados assim, mas disfarçam melhor desde a época em que Ferdinando de’ Medici tocou os açougueiros pra fora da Ponte Vecchio e pôs umas joalherias no lugar. E têm Berninis de montão — embora, admito, o mestre do barroco não chegue aos pés do gênio que nos legou uma obra como o Cocozão de Ponta Grossa.

Fugi do Bananão o máximo que pude, mas os brasileiros somos uma praga que dá em todo lugar e viceja nas condições mais adversas. Desde meninas tentando decifrar o alfabeto grego numa estação de metrô de Atenas até o sujeito que, da loggia do Mercato Nuovo — o “camelódromo chique” de Florença –, deu uma bronca em português no colega do outro lado da rua (“ô, Fulano! Vai ficar passeando pela cidade em vez de trabalhar, porra?”), foi impossível não esbarrar em meus semelhantes. Brasileiro gritando com outro no meio da rua e dizendo “porra”: Deus do céu, como não se sentir em casa?

Um belo dia, reentro na atmosfera do Brasil e tenho a péssima ideia de dar uma olhadinha nas redes sociais, essa ágora dos tempos modernos, esse celeiro de craques que chutam com as quatro. Encontro um grupo comentando a proposta de Paulo Guedes de extinguir cerca de um quarto dos municípios brasileiros — é mais fácil Jair Bolsonaro mudar de sexo durante o mandato e passar a atender por Odete que isso ser aprovado no Congresso em véspera de eleição municipal, mas OK. Os gênios do Twitter pareciam achar que extinção dos municípios implica extinção dos habitantes — afinal, “desse governo pode-se esperar tudo”.

Pensando bem, por que não? Talvez o programa Napalm para Todos seja mesmo a salvação deste país — ou qualquer coisa que preserve as belas paisagens e elimine o principal problema, que são as pessoas: nenhuma piada nos exprime melhor que aquela dos anjos perguntando a Deus por que tanta beleza no Brasil e tão pouca em outras paragens e Deus respondendo “cês vão ver o povinho que eu vou colocar lá”. Sei lá, terraplanar tudo, deixar um espaço pros índios de short Adidas (legítimos representantes do país) e estacionamento pra argentino ir à praia naquilo que sobrar. E trocar “ordem e progresso” por “7 a 1 foi pouco”.

Um século atrás, o poeta francês Guillaume Apollinaire já queria saber onde estava o Cristóvão Colombo a quem deveremos o esquecimento de um continente. É verdade que hoje muito menos gente morre como o próprio Apollinaire, vítima do surto de gripe espanhola em 1918. Ou seja, como dizia Paulo Mendes Campos, antigamente as coisas eram piores — depois foram piorando. E nada de o tal Colombo aparecer. Feliz napalm pra todos.

***

A GOIABICE DA SEMANA

Não dá para competir com a troca de carícias entre Augusto Nunes e Glenn Greenwald na Jovem Pan: foi a exata expressão daquilo que os narradores de futebol chamam de “cenas lamentáveis”. Enquanto o governo não encampar o meu projeto do napalm ou reforçar com césio-137 a dieta de todos os brasileiros, acho que o jeito vai ser legalizar a rinha de jornalistas.

Greenwald e Nunes em pleno debate de ideias na Pan, nesta quinta-feira

Os comentários não representam a opinião do site. A responsabilidade é do autor da mensagem. Em respeito a todos os leitores, não são publicados comentários que contenham palavras ou conteúdos ofensivos.

500
Mais notícias
Assine agora
TOPO