RuyGoiaba

Machado de Assims: só faltava Eça

15.11.19

O gosto por trocadilhos hediondos não chega a ser uma parafilia, como a do sujeito que sai pelado sob a capa de chuva para se exibir a incautos ou a dos apreciadores do que, no interior deste Brasilzão selvagem, chamam de “éguas barranqueiras”. Mas houve um tempo em que não era de bom-tom fazê-los em ambientes sérios, como esta revista — renderia o mesmo tipo de olhar atravessado dirigido a quem arrota à mesa num almoço em família.

Houve um tempo, dizia eu, e esse tempo acabou: hoje vivemos a Era do Tiozão do Pavê (“mas é pavê ou pacomê?”) desenfreado, sem amarras, sem medo de ser feliz, não raro com cargo no governo e séquito de assessores. Até eu, tio do pavê precoce — desde os 15 anos; sou, sem falsa modéstia, uma espécie de Rimbaud do pavezismo — que chegou a cogitar a compra de um Fiat Uno só para chamar o carro de “Átila”, às vezes me constranjo com alguns dos trocadalhos do carilho que grassam por aí nestes nossos tempos permissivos.

A prova mais recente de que os trocadilhos horríveis chegaram ao mainstream é a exposição sobre Machado de Assis que o Farol Santander, em São Paulo, abrirá ao público na semana que vem: o nome da mostra — atentai bem! –, será “Machado de ASSIMS”. O curador explicou ao site PublishNews que a “proposta” (“instigante” e “lúdica” não compareceram desta vez, mas “proposta” não poderia faltar) “passa por explorar aspectos pouco conhecidos da figura de Machado (…), mostrar um personagem gigante por lados inusitados. Daí o título trocar o sobrenome Assis por Assims, ou seja, de outros jeitos ou modos de ver”.

Décio Pignatari e outros gigantes da poesia concretina não fariam melhor (por que não “Machado de Ah, Sim”?). Confesso que fico entre a consternação e aquele sentimento de liberdade plena, no sentido dostoievskiano: se o Machado de ASSIMS existe, tudo é permitido, desde o “só faltava Eça” do título aí em cima até a admissão de que sempre achei a poesia do Ferreira meio irre-Gullar. Ou dizer que o Manuel dava muita bandeira, especialmente naquele trecho do “alcaloide” em “Vou-me Embora pra Pasárgada”. Ou sugerir que já passou da hora de Caetano e Bethânia protagonizarem um filme como “Velosos e Furiosos”.

Na verdade, eu me sinto capaz de escrever um texto inteiro sobre como muita gente fala dos “garantistas” (Gilmar Mendes & cia.), mas ninguém se dá conta do perigo dos arantistas, seres que circulam impunemente por aí ouvindo — ou, pior, cantando junto — “Cheia de Charme” (“um desejo enorme de revolucionaaar, uooou”) e outros hits de Guilherme Arantes sem que o poder público tome providências. Mas acho melhor parar este texto por aqui. Vou Paul McCartney no correio e depois passar no Bach pra tomar um Chopin da Brahms.

***

A GOIABICE DA SEMANA

Nos últimos meses, eu tinha até conseguido me esquecer do quanto petista é chato — mas isso acabou no fim da semana passada, quando Sua Lulidade saiu da colônia de férias forçadas em Curitiba. Dom Sebastião poderia pelo menos ter variado o discurso depois dos 580 dias de cana, mas é o mesmo disco riscado de sempre: Grobo marvada, mãe que nasceu analfabeta e “o Lula não é uma pessoa, é uma ideia”. E, como se não bastasse, ainda vêm os fiéis da seita bater na sua porta para trazer as boas novas do Reino — são as Testelulas de Jeová.

(OK, juro que agora parei mesmo.)

Paulo Guereta/Agência O Dia/Estadão ConteúdoPaulo Guereta/Agência O Dia/Estadão ConteúdoLula fala a seus fiéis na frente do Sindicato dos Metaleiros, ops, Metalúrgicos

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