RuyGoiaba

Todo mundo quer ser fofucho

20.12.19

“Coletivo Girassol”. Sem pesquisar no Google: o que esse nome sugere para vocês? Um espaço de ioga e/ou dança contemporânea na Vila Madalena? Uma associação de poetas que promove saraus com acompanhamento de percussão? Uma cooperativa dona de escolinha infantil que segue o método Waldorf? Só pode ser uma dessas reuniões de gente abraçadora de árvores que você tem vontade de surrar com um gato morto até o gato miar, certo?

Errado: Coletivo Girassol era o nome de um esquema de cobrança de propina na Paraíba. Segundo o ex-secretário do Turismo Ivan Burity, ele atuava em paralelo ao que — de acordo com o MPF — era chefiado por Ricardo Coutinho no governo do estado; o “coletivo” foi montado para que seus integrantes pudessem receber comissões sem ter de repartir o dinheiro com o resto do grupo. Vejam como são as coisas: antes, a propina se disfarçava de tecnocracia, como no Departamento de Operações Estruturadas da Odebrecht. Hoje, a corrupção quer ser fofucha.

E não apenas ela: como já escrevi aqui, os partidos brasileiros não querem mais ser partidos, pelo menos no nome. Além de Rede, aquela coisa acolhedora em que você se deita, e Cidadania, palavra bonita que só existe em discurso de político, agora temos a Aliança pelo Brasil, para aproveitar a única metáfora que Jair Bolsonaro sabe fazer (casamento — o presidente já se disse casado com Mourão, Paulo Guedes e Rodrigo Maia. Ai, que loucura esse poliamor!) e dar aquela ideia de compromisso, fidelidade, divórcio litigioso com troca de sopapos, sei lá. Tudo menos “partido” — mas a grana do fundão eleitoral ninguém tasca.

Meu palpite, baseado nos mais rigorosos princípios da chutometria, é que esse marketing da fofura foi impulsionado pelos bancos. Naturalmente, gente como os Moreira Salles e os Setubal não quer ser os crápulas que sentam em cima do seu dinheiro, remuneram pessimamente suas aplicações e cobram taxas extorsivas. Aí, um belo dia, os bancos resolvem virar nossos amiguinhos (“nem parece banco”): alugam bikes para nós, levam a gente para festivais de música, “proporcionam experiências”. E ainda querem fazer um mundo melhor! Como disse um amigo, se os bancos estão nessa de salvar o planeta, espero que a Filosofia da USP esteja cuidando de emprestar dinheiro a juros abusivos.

No fundo, é tudo storytelling, como o daquela marca que contava a historinha do nonno Fulano fazendo sorvete à base de neve lá na Itália e depois fugindo da guerra — e tão mentiroso quanto. Todos esses fofinhos profissionais (desde partidos e bancos até aqueles lugares artesanais/orgânicos que vendem “comida caseirinha feita com amor”, com atendentes que dizem “gratiluz”) só querem explorar as nossas carências para meter a mão nos nossos bolsos. Morte à fofura marqueteira, portanto, e um viva para a rabugice — todo dia é um bom dia para mandar o mundo e os seres humanos à PQP. Feliz Natal para todos.

***

A GOIABICE DA SEMANA

Eu pretendia escrever sobre Uri Geller, aquele picareta-raiz que entortava talheres com o “poder da mente”, atribuindo a vitória de Boris Johnson no Reino Unido à “colher energizada” de Golda Meir que ele deu de presente ao primeiro-ministro britânico. Mas apareceu coisa ainda melhor, que é o Departamento de Agricultura americano registrando suas transações comerciais com Wakanda — sim, o país do Pantera Negra, que, assim como o super-herói, non ecziste. Espero que um dia Clark Kent nos revele os números da balança comercial dos EUA com a Terra do Nunca e o total de turistas que vão visitar Gotham City.

Reprodução/Marvel StudiosReprodução/Marvel StudiosWakanda não existe, mas nem por isso deixa de fazer comércio com os EUA
 

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