FelipeMoura Brasil

O abandono do amadorismo

23.05.19

A declaração mais sensata de Jair Bolsonaro dias antes da manifestação do dia 26 foi no café da manhã com jornalistas desta quinta-feira, 23:

“Quem defende o fechamento do Supremo Tribunal Federal e do Congresso Nacional está na manifestação errada. Essa pauta está mais para Maduro.”

Não importa se setores da imprensa e grupos que se recusaram a aderir aos atos de domingo inventaram ou acreditaram em postagens de infiltrados, se há mesmo radicais pregando o fechamento de outros Poderes, ou se esta defesa é apenas força de expressão por parte de manifestantes revoltados com a sujeira e a lentidão das instituições, ou seja: tudo que foi matéria de embates, inclusive de aliados, nas redes sociais nesta semana.

Cabe ao presidente, como a qualquer analista sério, repudiar possíveis extremismos, para evitar o nascimento ou crescimento de uma onda contrária à ordem democrática.

Deste modo, sem deslegitimar a manifestação em defesa da reforma da Previdência de Paulo Guedes e do projeto anticrime de Sergio Moro, Bolsonaro filtra o estímulo que ele próprio deu à revolta geral contra o STF e o Congresso quando compartilhou o texto do servidor público Paulo Portinho, segundo o qual o presidente “provou que o Brasil, fora desses conchavos, é ingovernável” e ele “não é culpado pela disfuncionalidade”.

Em vez de eximir-se de novo, Bolsonaro ainda se incluiu entre os culpados, ao explicar, no café, sua declaração recente de que o problema do país é a classe política: “Foi um comentário geral. Estamos, nós, políticos, no poder desde que saiu o Figueiredo. Um deputado não aguenta ouvir isso daí? Tá chateado? Eu me incluo no bolo.”

Agora cabe ao presidente incluir-se no bolo de Guedes, em vez de enfraquecer o apoio parlamentar e popular à reforma com declarações como a de que “brevemente” será apresentado um projeto que trará mais recursos ao país do que ela: “Com todo respeito ao Paulo Guedes, a previsão de nós termos dinheiro em caixa é maior do que a Previdência em 10 anos e ninguém vai reclamar desse projeto, com toda certeza.”

Após o governo dar margem a que o contingenciamento de 3,4% do orçamento de instituições federais de ensino superior soasse e repercutisse como um corte de 30% na Educação – percentual referente às despesas discricionárias (não obrigatórias), que representam menos de 12% do total –, Bolsonaro já devia ter se dado conta dos cuidados necessários para anunciar medidas sobre pontos sensíveis do debate público.

A prontidão da esquerda acadêmica e jornalística em disseminar narrativas falseadas, de parlamentares como Paulinho da Força em desidratar a reforma para não garantir a reeleição de Bolsonaro, e de partidos da oposição e do suposto Centro (incluindo Aécio Neves) em enfraquecer Sergio Moro (que perdeu o Coaf por 228 votos a 210 no plenário da Câmara) são motivos não para a insolência de um presidente que joga para a galera e ainda divulga o vídeo de um pastor congolês apresentando-o como escolhido por Deus, mas para o abandono do amadorismo nos atos de seu governo.

Insistir nos erros, e ter sempre de amenizá-los, também torna o Brasil ingovernável.

Felipe Moura Brasil é diretor de Jornalismo da Jovem Pan.

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