O ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, foi um dos que teve o WhatsApp clonado pelos bandidos (Marcos Corrêa/PR)

A prova contra Bicuíra

Documentos apreendidos pela Polícia Federal reforçam testemunho de delatores da Odebrecht segundo os quais o ministro Eliseu Padilha, chefe da Casa Civil de Michel Temer, recebeu propina milionária por obra no Rio Grande do Sul
11.05.18

Em 17 de janeiro de 2011, Valter Lana, executivo da Odebrecht na região Sul, recebeu um e-mail curto do Departamento de Operações Estruturadas, o núcleo de nome tecnocrático que escondia a central de propinas da empreiteira. A remetente era Maria Lúcia Tavares, funcionária de Marcelo Odebrecht responsável por distribuir as ordens de entrega de dinheiro sujo. A mensagem trazia uma série de nomes, com senhas e valores. Bicuíra encabeçava a lista, com 270 mil reais. O apelido já havia aparecido nos depoimentos de alguns delatores da Odebrecht. Segundo eles, era a maneira como se referiam a Eliseu Padilha, hoje todo-poderoso ministro da Casa Civil de Michel Temer. Com o tempo, os investigadores foram cruzando os testemunhos dos delatores com os milhares de documentos coletados durante as operações de busca e apreensão feitas pela Lava-Jato. Há poucos meses, eles acharam o e-mail que, hoje, consideram uma peça importante para corroborar aquilo que os executivos contaram em seus acordos de delação premiada em relação a Padilha.

O e-mail apreendido pela Polícia Federal faz menção a uma entrega de 270 mil reais a Bicuíra, codinome atribuído ao ministro Padilha
Na mensagem, reproduzida acima, Maria Lúcia diz a Lana ter acionado um certo Tonico para realizar alguns pagamentos. Tonico é o doleiro Antonio Cordeiro, que admitiu aos investigadores que ajudava a empreiteira a providenciar dinheiro vivo. POA é Porto Alegre, a cidade de Padilha, onde ele morava à época e onde mantém escritório. “Violão” era uma das senhas usadas pela Odebrecht para garantir que os valores chegariam em segurança aos destinatários. Valter Lana, o homem que recebeu o e-mail com a ordem de entrega, é um dos delatores. Ele também relacionou o codinome a Padilha.

A mensagem enviada por Maria Lúcia Tavares está entre as novas provas reunidas pela Polícia Federal no inquérito que investiga a suspeita de propina para o ministro durante a construção da linha 1 do trem urbano da Trensurb, destinada ligar as cidades gaúchas de Novo Hamburgo e São Leopoldo. A obra, tocada pela Odebrecht, teve um custo estimado em 323 milhões de reais. De acordo com os delatores, Padilha, ou Bicuíra, recebeu 1,5 milhão de reais porque ajudou a construtora a vencer a licitação quando era ministro dos Transportes no governo Fernando Henrique Cardoso.

Nesta fase da investigação, o objetivo dos policiais é obter indícios que extrapolem os depoimentos dos delatores e os dados do sistema Drousys, uma espécie de controle interno usado pela Odebrecht para administrar as propinas. É a própria lei das delações que determina que depoimentos dos colaboradores devem ser acompanhados pelas chamadas “provas de corroboração”.

Os documentos indicam que os valores da propina a Bicuíra podem ser até maiores. Isso porque o Drousys indica que em 2010 ele já havia recebido 1,5 milhão de reais. Como a entrega dos 270 mil se deu em 2011, a suspeita é que os pagamentos continuaram a ocorrer.

A mensagem estava na casa de Nilton Coelho, o “NC” a que se refere a assessora de Marcelo Odebrecht. Diretor do contrato da Odebrecht com a Trensurb, ele foi alvo de busca e apreensão em 2016. Desde então, o documento estava esquecido entre tantos coletados pelos policiais. Com a delação da empreiteira, peritos começaram a buscar, no material arrecadado, conexões com o teor dos depoimentos.

Como os documentos foram recolhidos pela PF quando ainda nem havia delação, numa época em que a Odebrecht negava peremptoriamente o esquema de corrupção, as provas contra Bicuíra ganham mais força – e fica mais longe, por óbvio, a possibilidade de se tratar de mera invencionice dos delatores.

O relatório em que os agentes analisam os papéis, obtido por Crusoé, foi produzido no começo deste ano. Para além das mensagens eletrônicas, nas anotações também havia menções ao codinome Bicuíra, sempre ao lado de números. Com esses elementos, a PF diz que já é possível “entender que os pagamentos eram recorrentes e frutos de negociações passadas”.

As anotações do operador: a PF entende que os pagamentos a Padilha eram recorrentes
Entre as tantas anotações, há uma que intriga os investigadores: “EP/MT 2% ao longo”. Assim como as outras, ela estava no computador de Nilton Coelho. Segundo Valter Lana, o executivo da Odebrecht no Sul, seria mais uma prova contra Padilha. “‘EP/MT’ provavelmente se refere a Eliseu Padilha e Ministério dos Transportes”, disse ele.

Nos vários depoimentos que prestou, um deles em fevereiro passado, Valter Lana deu aos investigadores várias informações relevantes. Além de dizer que Bicuíra é Eliseu Padilha, ele contou que tratou pessoalmente de propina com o atual ministro da Casa Civil. Ele também indicou quem seria o responsável por receber os pagamentos.

Disse ele, conforme registraram os policiais: “Para tratar do assunto da propina deve ter tido pelo menos dois encontros com Padilha; que esses encontros ocorreram ou no escritório político que ele possuía na Travessa Leonardo Truda ou no escritório da Odebrecht em Porto Alegre; Eliseu Padilha indicou a pessoa de Ibanez para tratar dos assuntos do pagamento dos valores”.

De novo, os relatos contidos na delação batem com as anotações apreendidas pela PF. Em uma delas, se lê: “ver dgi-ibanes/k/mm”. DGI, no dicionário da Odebrecht, é um código para propina. Significa “despesa geral indireta”. Ao vasculhar o celular de Nilton Coelho, o representante gaúcho da empreiteira, os investigadores acharam outra pista. Lá havia, de fato, o registro de um certo Ibanez – e ele estava relacionado a Eliseu Padilha. Era mais um elo que se fechava.

Os agentes, então, concluíram: “Podemos associar o nome Ibanes à pessoa de lbanez Ferreira Filter, assessor de Eliseu Padilha e chefe de longa data de seu escritório em Porto Alegre. Assim, também é lícito abrir a possibilidade de associar as ocorrências de Ibanes, constantes no espelhamento das buscas, a Eliseu Padilha, ou Bicuíra”.

O inquérito da Trensurb é o segundo envolvendo Eliseu Padilha e a Odebrecht. O outro é uma pedra no sapato do presidente Michel Temer. Trata-se do rumoroso caso de caixa dois durante a campanha 2014, que envolveu até uma reunião no Palácio do Jaburu entre Marcelo Odebrecht e Michel Temer. Nesse inquérito, Padilha também aparece em situação delicada. José Yunes, amigo pessoal de Temer e investigado como um dos operadores do presidente, já admitiu que recebeu uma entrega em seu escritório deixada por Lúcio Funaro, que cuidava das transações ocultas do PMDB. Yunes disse que partiu de Padilha o pedido para que recebesse o pacote das mãos de Funaro.

A Crusoé, a assessoria de Padilha afirmou em nota que ele não tem nada a declarar nem sobre pagamentos da Odebrecht nem sobre o tal apelido – Bicuíra, vale dizer, é uma gíria gaúcha usada para designar quem gosta de praia . “Por meio do seu advogado, Daniel Gerber, o ministro Eliseu Padilha afirma que desconhece qualquer apelido que possa estar vinculado a sua pessoa nas aludidas delações. Portanto, nada tem a declarar. Irá se pronunciar, se for o caso, diante do Poder Judiciário.”

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  1. Não tem saída para o Padilha vulgo Bicuíra : mais um adepto do mecanismo que foi pilhado e que tem que ser eliminado do nosso convívio social. Precisamos acelerar a destruição do mecanismo e de seus adeptos que infestam ainda a máquina pública brasileira

  2. Uma provocação: "EP/MT" não seria "Eliseu Padilha / Michel Temer" ao invés de "Eliseu Padilha / Ministro dos Transportes"?

  3. Fui engenheiro do Trensurb Ajudei Padilha a sua reeleição a deputado federal , o atual prefeito de Gravataí era o chefe de gabinete de Padilha na ocasião , Marcus Alba !! Depois conheci Ibanez , que foi assessor de Osmar Terra , quando deputado , que cedeu Ibanez , para chefiar escritório de Poa de Padilha Com a saída de Marcus Alba ! Que até hoje , chefia o escritório de Padilha em Poa !! Quanto à reportagem , investigativa está no início da trajetória , do político Eliseu Padilha !!👏

  4. Tema conhecido e explorado pela mídia geral, mas não se chega a conclusão definitiva. Aqui também não vejo novidades. O que falta para?

  5. Bicuíra como "alguém que gosta de praia" tem tudo a ver com Padilha, ele começou sua carreira política e empresarial em Tramandaí, litoral do RGS. Onde até hoje possui casa e diversos negócios, incluindo Parques Eólicos, ops.......

  6. Gostaria de saber qual o político é honesto. Apenas uma retificação, faltou a crase, antes da palavra CRUSOÉ, no último parágrafo.

    1. http://www.nilc.icmc.usp.br/nilc/minigramatica/mini/acraseeosnomesproprios.htm

  7. Até hoje não entendo porque o povo não fez estardalhaço com a nomeação de Moreira Franco para ministro. O povo imediatamente escolheu seu corrupto de estimação que se arrasta até hoje com popularidade "zero". Pior, não tirou o poder da ORCRIM PMDB nas eleições de 2016. Affff.... quando iremos "acertar"???

  8. É .... Quem é do Sul do Sul, como eu, e Porto Alegrense (POA), sabem bem do que se trata, e de quem se trata. Mais não é preciso dizer ...

  9. Tudo bate. Eliseu Padilha despontou na política como Prefeito de Tramandaí, maior cidade do litoral gaúcho, a 100 Km a leste de Porto Alegre. Foi processado já naquela época por corrupção. Mostrava que ia longe, como foi. No RS, Eliseu Padilha sempre foi conhecido como Eliseu Quadrilha.

  10. Enquanto existir esse STF a Justiça, a Constituição Federal ( sim é o produto de um ranço comuno socialista recém saído do estado de exceção, mas é a que temos) continuarão a ser vilipendiados, estuprados e arrombados. Padilha, comparsas e toda essa casta mafiosa podem ficar tranquilas. É só jogar vez ou outra algum boi de piranha para amansar a turba "esclarecida"! Malsinação ajuda, desde que instituições punitivas sejam retas e ágeis.

  11. Basta não ser reeleito novamente , fica sem foro , e vai acertar suss contas ; com o Temer a mesma coisa. Não se salva ninguem..um absurdo !!

  12. o ponto positivo de tudo isso, é que finalmente começamos a arrumar a casa. Não se conserta uma bagunça dessa da noite para o dia. Que o povo fique esperto e não eleja mais essa cambada de safados.

  13. Passou aqui pela terra e o que deixou, só corrupção e crimes contra o sofrido povo brasileiro. Gostaria de saber o que pensa a família dele.

  14. Será que é mas um inocente?...achou que não, tomara a "justiça faça justiça" com todos aqueles que não amam este pais e que só amam seus bolsos.

  15. São tantos casos, tanta corrupção, em várias instâncuas de orgãis e instituições de tantos estados brasileiros, como conseguiremos acompanhar tudo? Se fôssemos um país sério com juristas sérios eu não estaria perguntando. :(

  16. É muito recorrente, todo e qualquer acusado de receber propina e ou de ser um corrupto contumaz, sempre vem com as mesmas desculpas, parece até um MANTRA acordado entre eles para parece um cara sério e acima de qualquer suspeita. Só acredita quem tem político de estimação.

  17. Sempre o mesmo roteiro na OLJ: Eles negam e repelem "peremptoriamente" as acusações. As acusações estão lastreadas e baseadas em inúmeras evidências e provas em diversas modalidades. Depois tudo é comprovado, viram réus e colaboram para não mofar na cadeia. E o ciclo se repete. Viva a OLJ!!!!!

  18. Temer ! Grande time você arrumou. Defenestrou-se uma "roliça trapalhona" em compensação no seu plantel só tem bandidos. Diz o ditado "para amigos procuramos sempre os assemelhados"

  19. Recentemente um dos ex-diretores da Tresnurb envolvido neste inquérito vendeu seus imóveis a preço de banana para não ter seus bens penhorados. Se a revista Crusoé quiser mais informações entre em contato comigo.

    1. Ótimo, uma corrente de informações onde cada um contribui com o que sabe.

  20. A obra da Trensurb não custou R$ 323 milhões e sim R$ 1 bilhão. Alem das propinas Nilton Coelho patrocinava churrascadas, happy hour, presentes no fim de ano aos diretores e empregados responsáveis pela obra da Trensurb. A relação entre a Odebrecht (Nilton Coelho) e o pessoal da empresa sempre foi promíscuo. Havia até dificuldade de fiscalizar as atividades do consórcio tal era as relações promíscuas entre as partes.

    1. Acho que você, Maurício, matou a charada! Que "carma" , hein?

    2. Olha, se assim for, deve ter uma longa fila de espera porque o "pateo" está lotado. hahahaha

  21. Affff.Que pais é este?!Não ha um dia em que não se descubra uma falcatrua desses homens!!!!Estávamos realmente nas mãos de bandidos...e como nos livrarmos disso de vez?

  22. Esse Eliseu Padilha é outro que vai acabar sendo recolhido a um xadrez. Questão de tempo. Parabéns, Filipe Coutinho, parabéns, CRUSOÉ, pelo inestimável serviço prestado à este pobre país.

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