SergioMoro

Segurança pública tem jeito

10.09.20

O grande desafio de nosso tempo é a pandemia de Covid-19. É necessário buscar o controle definitivo da doença, mediante vacinação e outras medidas sanitárias, e a retomada da economia, o que envolve a complexa equação de equilibrar estímulo com controle da dívida pública.  

Os demais desafios que preexistiam não nos deixaram, porém, com a pandemia.  Tendem talvez a se agravar.

Falarei aqui de alguns desafios da segurança pública. 

Segundo dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública, em 2017, atingimos o recorde do número de homicídios no Brasil, com 56.792 vítimas fatais.

Em 2018, houve uma melhora, com 48.943 vítimas, uma redução de cerca de 13,5%. Já em 2019, houve 39.509 vítimas, uma redução ainda mais expressiva, de 19%, esta sem precedentes históricos.  

Ainda assim, 39 mil é um número muito elevado. Outros indicadores criminais não ficam atrás e são também elevados, como os 188.806 roubos de veículos e os 53.883 estupros.

Este ano de 2020 é atípico. Há dúvidas se ele poderá ser considerado na linha histórica de maneira apropriada, tendo em vista os efeitos ainda incertos da pandemia na segurança pública. 

Eu, pessoalmente, imaginava que os crimes iriam cair por conta das medidas de distanciamento social. As primeiras informações colhidas sobre os indicadores criminais não confirmaram tal expectativa. Embora não oficiais, dados colhidos pelo monitor da violência do G1 apontaram elevação do número de assassinatos em março e abril de 2020, na comparação com os mesmos meses de 2019. Foram 4.151 em março de 2020, contra 3.729 em março de 2019, e 3.950 em abril de 2020, contra 3.656 em abril de 2019. É certo que, em fevereiro de 2020, já havia ocorrido um aumento do número de homicídios, mas esse acréscimo pelo menos em parte encontra explicação provável nos movimentos de paralisação das polícias estaduais naquele mês, especialmente no Ceará.

Os impactos econômicos da pandemia ainda serão sentidos por longo período, especialmente após o término do auxílio financeiro concedido pelo governo federal. Talvez o fim dele e o agravamento da condição social e econômica leve a novo aumento do número de crimes, embora ressalve-se que não há uma correlação necessária entre pobreza e crime — aliás, não haveria crime de colarinho branco, se existisse. 

De todo modo, as reduções havidas em 2018 e 2019 confirmam que a violência não é um dado da natureza em relação a qual os brasileiros precisam se resignar. Sim, é possível com políticas públicas consistentes reduzir a criminalidade.

A melhor política consiste na integração das forças de segurança pública em trabalhos conjuntos, criando centros comuns de inteligência e de operações. Perdeu-se muito tempo no Brasil discutindo-se a fusão da polícia civil com a militar. Não me parece algo viável, mas aprofundar e profissionalizar a coordenação entre elas e mesmo com as forças federais é algo bastante factível. Locais como o Centro Integrado de Operações de Fronteira (Ciofi), que criamos em Foz do Iguaçu, podem fazer a diferença nessa integração, assim como a Secretaria de Operações Integradas (Seopi), que constituímos para coordenar ações das forças de segurança. 

Políticas sociais, econômicas ou urbanas dirigidas a focos de violência nas cidades podem fazer a diferença. Por exemplo, é conhecida a expressão de que o melhor guarda é um poste de luz. Restaurar áreas urbanas degradadas podem fazer a diferença. Se escolas de tempo integral não são uma realidade ainda possível em todo o país, nada impede a sua implementação em áreas com elevada violência urbana, de modo a retirar crianças e adolescentes das ruas pelo maior período de tempo possível.

É preciso, no entanto, focalizar políticas sociais com prevenção e repressão policial coordenada e qualificada. Políticas sociais são relevantes, mas insuficientes. Criminosos devem ser presos, mediante devido processo, e assim terem o seu poder disruptivo no tecido social neutralizado. A reunião e focalização de políticas sociais com ação policial foi o que tentamos fazer com o Em Frente Brasil.

Especial atenção deve ser dada ao desmantelamento de grupos criminais organizados, com a prisão e o isolamento de líderes em presídios federais e o confisco do patrimônio dessas gangues. A investigação e o processo devem ter por objetivo destruir a organização e não apenas fazer prisões.

Os meios de investigação devem ser aprimorados, com operações policiais disfarçadas e escutas ambientais. O Banco Nacional de Perfis Genéticos, que impulsionei na minha gestão, é igualmente um instrumento valioso na elucidação de crimes, ao permitir comparar o DNA localizado no local do crime com os registros já mantidos no banco.

Fizemos tudo isso durante minha gestão no MJSP, com atenção especial ao crime organizado e à criminalidade violenta. Conseguimos até alguns avanços legislativos no combate a eles. Já quanto ao enfrentamento da corrupção, os avanços pretendidos, especialmente legislativos, encontraram maior dificuldade. 

Enfim, segurança pública tem jeito. Tão importante quanto à reforma tributária e a administrativa, é a segurança pública, que envolve o direito de ter a tranquilidade de sair à rua, sem o receio de tornar-se mais uma vítima. Planejamento, investimento, focalização e integração são os movimentos necessários.

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