Wilton Junior/Estadão ConteúdoOrlando Silva, do PCdoB, é um dos idealizadores da lei que instituiu a novidade

O ‘jeitinho’ das federações

A ideia das federações partidárias é um exemplo ilustrativo da esperteza dos políticos para driblar as limitações legais que poderiam eliminar do mapa legendas nanicas e irrelevantes
04.02.22

Parlamentares são pródigos em mudar as regras eleitorais ao sabor de suas conveniências. A cada dois anos, o Congresso costuma alterar a legislação para ampliar as chances de reeleição dos políticos e, se possível, ainda inflar os recursos públicos à disposição das legendas. Já as inovações capazes de moralizar o sistema eleitoral brasileiro, como leis que dificultam a sobrevivência de partidos de aluguel, encontram obstáculos. Quando a pressão da sociedade surte efeito e gera mudanças efetivas, as novidades duram pouco – rapidamente os políticos se articulam para retomar as regras que os beneficiavam. Foi o que aconteceu às portas das eleições deste ano.

Em 2017, o Congresso aprovou uma emenda constitucional que acabou com as coligações nas eleições proporcionais e criou cláusulas de desempenho para o acesso a recursos públicos. O objetivo era dificultar a vida de legendas pequenas, com baixa representação, que usam tempo de TV e dinheiro do fundo partidário como moedas de troca. O modelo foi adotado nas eleições de 2020 e ajudou a reduzir o número de partidos nas Câmaras de Vereadores. O pleito deste ano seria a primeira disputa nacional com a vigência dessas regras, mas o sistema, como sempre ocorre, passou a se articular para tentar se proteger.

No fim do ano passado, o Congresso aprovou a criação das federações partidárias, associações de legendas que precisam ter afinidade ideológica, pautas em comum no Legislativo e, principalmente, seguir juntas por no mínimo quatro anos, o que inclui as eleições municipais de 2024. O modelo poupa siglas pequenas da extinção e garante benesses como o aumento de tempo de TV dos candidatos a cargos majoritários. É, portanto, um jogo de ganha-ganha para o mundo político.

As negociações para a união de partidos estão aceleradas tanto em legendas de direita como de esquerda. O PCdoB, um histórico satélite do PT, negocia uma federação com os petistas, que envolveria também o PSB e o PV. A Rede, que tem apenas uma deputada federal e corre grave risco de cair na cláusula de barreira, negocia a união com o PSOL, outra sigla sob ameaça de ficar sem acesso ao fundo partidário e às propagandas de TV. O Cidadania comporá uma federação com outro partido para se salvar, mas os dirigentes estão em litígio e ainda não decidiram se a união será com o PSDB, o Podemos ou o PDT.

Pablo Valadares/Câmara dos DeputadosPablo Valadares/Câmara dos DeputadosO Congresso definiu que as federações devem ficar unidas por quatro anos
Não será tão simples amarrar todas as pontas das alianças. Durante as tentativas de acordo, os chefes dos partidos perceberam que a regra que prevê a união até 2024 pode ser um obstáculo, até por envolver duas eleições de naturezas distintas. Se já é complexo costurar palanques para uma eleição em um país de diversidades regionais como o Brasil, que dirá para duas. A diferença para as coligações é que agora é obrigatório que os acertos sejam nacionais. Até então, o partido podia fazer acertos regionais para a disputa das vagas de deputados estaduais e governadores, por exemplo, e fechar alianças diferentes no âmbito nacional. Também não havia a obrigação da atuação conjunta por um tempo determinado.

“A vantagem é que a federação diminui o clientelismo regional. Ela tem potencial de criar barreiras para esse tipo de comportamento, porque as decisões têm que ser nacionalizadas. Se o PT federar com o PCdoB e com o PSB, por exemplo, isso tem que valer no Brasil inteiro. O grande incentivo da federação é impedir as idiossincrasias regionais e o paroquialismo estadual que sempre houve com as coligações”, afirma o cientista político Bruno Bolognesi, do Laboratório de Partidos e Sistemas Partidários da Universidade Federal do Paraná.

A legenda que descumprir o estabelecido vai pagar caro. O partido que deixar a federação antes do prazo mínimo fica sem dinheiro do fundo partidário até a data em que a associação completaria quatro anos – há exceção para o caso de a federação ser extinta por fusão ou incorporação de siglas.

As negociações para a federação de esquerda, articuladas entre PT, PSB, PCdoB e PV, avançaram nas últimas semanas, com a discussão dos primeiros rascunhos do estatuto. Dirigentes, porém, evitam tratar o acordo como fato consumado. Pesam como entraves a disputa entre PT e PSB pelo direito de indicar os candidatos a governador em estados-chave do Sul e do Sudeste, além da dificuldade em selar acertos para as eleições. O pomo da discórdia é São Paulo, maior colégio eleitoral do país. Enquanto Márcio França, do PSB, insiste em concorrer ao Palácio dos Bandeirantes, o PT não abre mão de Fernando Haddad. “Haddad foi candidato a presidente em 2018 e quase ganhou a eleição. Não podemos esquecer dos mais de 47 milhões de votos no segundo turno. É muito razoável pleitearmos essa vaga”, argumenta o líder da bancada petista na Câmara, Bohn Gass.

Lula Marques/Agencia PTLula Marques/Agencia PTA insistência do PT na candidatura de Haddad atrapalha a união com o PSB
Dirigentes do PSB, no entanto, reclamam nos bastidores do velho estilo petista de querer impor suas vontades na marra. A mais recente cartada do PT em favor da candidatura do senador Humberto Costa ao governo de Pernambuco foi considerada uma jogada ardilosa pelos socialistas – o estado é considerado a joia da coroa do PSB. “Negociar com o PT é pior do que negociar com ex-mulher. Eles foram para cima do PSB de Pernambuco cientes de que, mais à frente, poderiam dizer ‘abro mão de Pernambuco em troca de São Paulo’ e os dois partidos sairiam com suas verdadeiras prioridades respeitadas”, comentou um dirigente, sob reserva.

Para 2024, as negociações estão ainda mais emboladas. Em princípio, a proposta é para que partidos que tenham conseguido, em 2020, eleger prefeitos em capitais e cidades com mais de 200 mil habitantes ganhem prioridade na indicação dos candidatos ao mesmo cargo nas eleições de 2024. Com a regra, o PT sairia atrás, porque não emplacou prefeitos em nenhuma das capitais do Brasil pela primeira vez desde a redemocratização. O PSB, por sua vez, elegeu dois nomes – João Henrique Caldas venceu em Maceió e João Campos, no Recife. Para os demais municípios, ainda não há critério fixado. O próximo encontro dos partidos está agendado para 10 de fevereiro. A ideia é que, nessa reunião, os dirigentes se debrucem sobre as questões políticas do acordo.

Na direita e no centro, as tentativas de acertos são igualmente penosas. Em 2022, a exigência da cláusula de barreira será de 2% dos votos válidos ou onze deputados federais em pelo menos um terço dos estados. O Cidadania tem hoje uma bancada de sete parlamentares e corre o risco de ficar sem acesso aos recursos. Por isso, na terça-feira, 1º, a Executiva da sigla aprovou por maioria de votos a proposta de formar uma federação. Não houve acordo, entretanto, quanto ao parceiro preferencial. O presidente da sigla, Roberto Freire, defende uma união com o PSDB do governador e pré-candidato ao Planalto João Doria. O senador Alessandro Vieira, de Sergipe, atualmente o nome de maior destaque no Cidadania, prefere uma associação ao Podemos, do pré-candidato à Presidência Sergio Moro.

Geraldo Magela/Agência SenadoGeraldo Magela/Agência SenadoA proposta de Roberto Freire para associar o Cidadania ao PSDB rachou a sigla
O último encontro foi tenso. Os integrantes da Executiva do Cidadania rejeitaram por maioria a formação de federação com o PDT ou o MDB. Na votação do acordo com os tucanos, houve empate. O diretório nacional vai debater o assunto no dia 15 de fevereiro e pode, inclusive, aprovar alianças rejeitadas pela Executiva. Vieira acusa Doria e Roberto Freire de tentar forçar um acordo. “Isso não passa necessariamente pela decisão pessoal do Roberto Freire, que é um presidente em final de mandato, depois de longos 30 anos. É preciso ter critérios claros e justos para que todos se sintam estimulados a participar”, afirma Vieira.

O PSDB aprovou a ideia de formar uma federação com o Cidadania e aguarda agora o posicionamento da sigla. O presidente tucano, Bruno Araújo, também tenta avançar um acordo com Baleia Rossi, que comanda o MDB. Uma associação entre as duas siglas, entretanto, é de difícil operacionalização em razão da realidade nos estados.

Como a federação obrigaria o PSDB e o MDB a estarem juntos em todos os palanques estaduais e nas eleições de 2024, a ideia é rechaçada por boa parte dos diretórios regionais, principalmente no Nordeste. O senador Renan Calheiros e seu filho homônimo que governa Alagoas  divulgaram nesta semana fotos ao lado de Lula. No Piauí e no Rio Grande do Norte, o MDB também está fechado com os petistas. As especulações no MDB sobre uma federação com o PSDB estão relacionadas a um último esforço de João Doria de salvar a própria candidatura ao Planalto. Se o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, se filiar ao PSD de Gilberto Kassab, como sugerem os últimos movimentos, o PSDB corre o risco de perder mais de uma dezena de deputados, o que aceleraria o naufrágio de Doria e tornaria a necessidade de formar uma federação ainda mais premente.

DivulgaçãoDivulgaçãoO MDB é cortejado pelo PSDB, mas caciques como Renan preferem Lula
O projeto de lei que criou as federações teve forte resistência do Centrão e de deputados aliados do Planalto, apenas porque não veem vantagens na associação formal de médio prazo com outras siglas. Se ajudasse nos negócios, certamente apoiariam. Além da bancada do PT, o deputado Orlando Silva, do PCdoB, que tem bom trânsito com Arthur Lira, articulou pela aprovação da proposta capaz de salvar sua sigla. As dificuldades práticas para viabilizar as federações têm sido tantas que, no Congresso, já há lideranças que falam sobre a possibilidade de novas mudanças para facilitar as tratativas. Alterações para as eleições municipais de 2024, porém, são vistas como pouco prováveis, em razão do alto risco de judicialização – partidos que não se federaram pelos empecilhos impostos pela lei poderiam questionar as alterações antes do prazo de quatro anos. Em 2026, entretanto, pode haver uma nova reforma eleitoral para a retomada das coligações, mais simples, sem prazo de duração e sem imposição de acordos nacionais.

“A gente nunca sabe quais vão ser as regras de funcionamento da democracia e isso é péssimo. O Congresso faz mudanças constantes na legislação eleitoral para atender partidos fisiológicos”, critica o especialista em direito eleitoral André Ramos Tavares, professor da Universidade de São Paulo. O casuísmo segue reinando firme e forte em Brasília.

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  1. Certamente que a dureza das exigências da lei experimentada pelos partidos esse ano (e é correto que seja duro) vai fazer com que a lei seja flexibilizada em 2026. A auto preservação é, foi e sempre será a prioridade do congresso. PS: essa foto dos Calheiros com o Lula deveria ser censurada. Que asco!

  2. Helena e Ana, obrigada pela reportagem! Os brasileiros precisavam buscar esclarecimentos; esbarramos na baixa escolaridade e falta de interesse de grande parte da população! O Antagonista é uma luz com seus grandes jornalistas !

  3. Assim como dizem que nunca se deve apostar contra os EUA, raciocínio semelhante vale para a Banânia, nunca se deve apostar no seu sucesso, e eis aí um dos motivos. Por mais contraditório que parece, está na hora de pensarmos seria no parlamentarismo. Assim paramos de gastar tempo com presidentes reféns e damos mais atenção ao congresso, que vai ser obrigado a formar uma coalizão pra governar. Sem coalizão, sem governo.

  4. Baseado em ideologias, quatro ou cinco Partidos é o máximo que a lógica pode aceitar. O que acontece em nosso País é de provocar náusea, sobretudo quando se considera a atitude dos políticos, em sua maioria preocupados em salvar a própria pele. Honrosa exceção ao Partido Novo e seus parlamentares ...

  5. Mexeram tanto pra manter esses partidecos, que só atendem aos donos e servem pra receber verbas públicas sem dar retorno algum, que acabaram dando tiro do pé...mas os otários contribuintes continuam pagando a conta.

  6. E gosto muito desse deputado Orlando Estoupagandotapiocacomcartãocorporativo Silva. Um comunista convicto e sincero

    1. É um pilantra de primeira linha, da escola do R Jefferson

  7. O ideal seria termos no maximo 5 partidos. Extrema Direita, Direita, Centro, Esquerda, e Extrema Esquerda. Só! E valores divididos igualmente por 5. Sou pela Extrema Reforma politica, para acabar com essa, desculpe o termo: p u t a r i a!!!

  8. Uma ótima reportagem para conhecermos o tamanho do “elefante branco” que são esses inúmeros partidos e seus parlamentares que não sabem honrar os eleitores que os elegeram. Enquanto não houver uma reforma política (com redução significativa do número dos partidos) e uma reforma administrativa de verdade nesse país, esse cenário apresentado vai se perpetuar.

    1. Concordo! E isso tem que vir de uma uniao do executivo com o judiciário para que o legislativo nao tenha força de barrar. porque vcs acham que algum dos deputados votará a favor dessa reducao???

    1. Sim, desde qur ele coloque essa briga como meta de seu governo e seja inteligente o suficiente para realiza-lo. de gogó a gente ja esta bem servido.

  9. NÃO REELEJA ESSES POLÍTICOS BANDIDOS QUE VIVEM, SOBREVIVEM E ROUBAM NOSSO DINHEIRO PÚBLICO ATRAVÉS DE LEIS IMORAIS EM SEU PRÓPRIO BENEFÍCIO…

    1. os políticos que estao ai e os que virão so usam as regras a seu favor. nao adianta mudar as pessoas se o sistema é o MESMO

  10. Onde esta a clausula de barreira que impedia o aumento destes partidos de aluguel e que como beneficiava a sociedade impedindo o crescimento do numero de partidos sem que tivessem um minimo de pre requisitos para suas existencias, os politicos bandidos deram um jeito e ja nao funciona. O negocio desses canalhas e que vivem de sugar o nosso dinheiro a troco de nada. So indo pra rua lutar democraticamente pelos nossos direitos, ou entao a festa dos politicos lesa povo continua pra sempre sem fim.

    1. acho que a cláusula de barreira nao foi suficiente. tem que ter barreira mesmo. ou vc tem projeção nacional com pelo menos 1 representante de cada região do Brasil, por exemplo. ou vc nao pode fundar um partido.

  11. MEU LIVRO “O INROTULÁVEL”. Link de acesso: https://www.amazon.com.br/dp/B09HP2F1QS/ref=cm_sw_r_wa_awdo_PQSA5Z6AXXH2SX16NH87 ..............................................……… os EXEMPLOS EXECRÁVEIS que uma SOCIEDADE tão CORRUPTA é capaz de produzir! São DEGENERADOS MORAIS que IMPEDEM o BRASIL de AVANÇAR! Em 2022 SÉRGIO MORO “PRESIDENTE LAVA JATO PURO SANGUE!” Triunfaremos! Sir Claiton

  12. Este Orlando Silva, dono de um nanico e que recebe milhoes sem nada fazer, vive nababescamente com os milhoes que ajuda roubar do povo, nem esta preocupado em se eleger pra nada, quer a exemplo de outros, manter-se como dono de partido e continuar nas tetas do povo pro resto da vida e ainda se morrer, transfere pra viuva e filhos viverem ricos sem fazer nada. Quero meu Brasil de volta. MORO PR e povo na rua resolve ja esta roubalheira.

  13. Tao somente mais uma estrategia das mais descaradas das quais estes politicos sao prodigos pra quererem justificar o injustificavel, qual seja a existencia de tantos partidos so pra nos roubarem. Bandidos fdp, tudo pelo roubo ao povo. Safados lesa Patria. NEM PASSADO, NEM PRESENTE, MORO PRESIDENTE. JAIR caindo fora.

  14. Ate quando vamos aceitar esta vagabundagem dos donos de partidos na maioria nanicos, recebendo milhoes sem acrescentar nada ao sistema politico, nas eleicoes vendem o tempo por milhoes para outro partido que tambem tem os milhoes pra pagar, tirados do povo, da saude, educacao e seguranca, e o povo de boca aberta aceitando tudo passivamente. So indo pra rua meu povo, resolver esta sacanagem e roubalheira. Queremos nosso Brasil de volta. NEM PASSADO, NEM PRESENTE, MORO PRESIDENTE.

  15. Ate quando os 210 milhoes de brasileiros continuaremos refens de politicos na maioria vagabundos cerca de 600 deputados e senadores que se apropriaram do poder e so se reunem pra nos roubarem pra continuarem cada vez mais nos humilhando a todos que pagamos impostos carissimos pra bancar estes vagabundos. Isto parece nao ter fim, ou o povo se rebela e vai pra rua gritar ou esta casta de poderosos vao continuar dando as cartas e impondo a sociedade humilhacao e desgraca. Quero meu Brasil de volta

    1. Desculpe Jo el mas que Brasil? desde a republica estamos lascados e na mão de gente inescrupulosa. Os ideais do Dom Pedro segundo nem chegam a fazer cócegas. O parlamentarismo ajudaria a amenizar o problema, mas ai o problema é o brasileiro que sem saber o que é e seus beneficios, rejeita o parlamentarismo

    2. Até que consigamos um estouro das manadas alopradas de Mortadelas X Bolsominos, orquestradas pelo Centrao e o PT, escudos de empresários gananciosos e irresponsáveis e

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